domingo, 15 de maio de 2022

HOMENAGEM A UM HOMEM, POETA DE CORPO INTEIRO

 


O livro de Poesia de Maximiano Gonçalves, intitulado «Ouvir a Palavra», motivou-me a escrever o texto seguinte. Não atribuo nenhuma responsabilidade ao Autor pelo que eu escrevi. Somente, desejo indicar que este livro é dos poucos (seja de poesia, ou de outro género) que me tem estimulado a pensar. Tentei verter por escrito todo um emaranhado de sentimentos e pensamentos, que me assomam lendo os versos inspirados do seu Autor.      



Como eu amo a música! Como eu amo a poesia! 

Poesia é música, disso não tenho dúvida. Estar à escuta da palavra é somente a primeira e maior virtude do poeta. Estar dentro da palavra significa estar para lá do que explicitamente ela nos transmite: a palavra segundo a «definição do dicionário» é uma coisa, mas a palavra enquanto Verbo é outra. Esta segue até ao infinito, até aos confins que o criador do discurso (poético ou outro) se abalança encontrar-lhe. Por tal motivo, «em busca da palavra perdida», se desfiam horas e dias inteiros. Mas essa vã procura, essa obsessão esquisita, também tem um lado prático. É que a palavra é como o barro; pode ser esculpida com maior ou menor esmero, arte e técnica. Um indivíduo pode esculpir a palavra, como um escultor pode moldar no barro uma obra, que - eventualmente - será transposta para o bronze. Mas, também, encontramos, quase em bruto, pequenas esculturas que são «arte popular», que nos transmitem a vibração genuína duma emoção; aquela que passa misteriosamente das mãos do seu criador, ao indivíduo que dá com tal obra-prima de «arte popular».

É assim que eu vejo a arte em geral, como representação do universo interno do criador, mas em diálogo com a realidade do mundo. Esta noção da realidade, que nos concita a atenção e, mais do que isso, a consciência do que vai pelo mundo, pode ser perdida temporariamente ou permanentemente, mesmo pelos mais talentosos espíritos científicos, artísticos, literários ou filosóficos. Porém, é para mim uma questão muito central da minha produção literária, tanto em poesia, como noutros textos (filosóficos, de análise política, social, etc.). A questão que me parece importante é de estar conectado com o real, com a vida tal como ela é, tal como se pode vislumbrar na aparência, ou apreendê-la nas profundidades. Confundir realismo com materialismo, é um erro crasso; pode-se ser muito realista e ter um fundo de espiritualidade, pode-se ser materialista e estar completamente fora do real!

De tudo podemos discorrer, mas somente ficam as palavras que se vêm inserir na nossa vivência profunda. Só consigo decorar poemas, não apenas que esteticamente me satisfazem como, sobretudo, que me dizem muito, que se adequam aos sentimentos, aos acontecimentos, às vivências da minha vida. 

O poema «É bom inventar rios…». É curto, tem a forma dum epigrama; é daqueles que eu gosto de decorar, de tal maneira exprime na forma sintética da poesia, um humanismo que não necessita de extensas explicações intelectuais, porque é genuíno.


É bom inventar rios

E barcos que os atravessam

Lentos e esguios…


E pontes que levem gente

E não apenas fios

Tecidos por desafios

De material que não sente.


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