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quarta-feira, 14 de agosto de 2024

O SENTIDO DO SAGRADO E A TRAGÉDIA DA HUMANIDADE

 Sinto-me, por vezes, completamente fora de tudo o que se passa, nestes dias, não por me desinteressar, ou por «desligar» das notícias, mas antes por estar em profunda contradição com a modernidade ou a pós-modernidade e com as atitudes levianas das pessoas de poder e dos que fazem quotidianamente comentários e tecem considerações sobre o que vai no mundo. Mas não é minha intenção falar aqui sobre o jornalismo de sargeta, nem a escumalha parasita dos estados e das sociedades. 

Quero dizer-vos em como a mente humana tem  capacidade única de interrogar-se sobre a natureza das coisas, quer seja uma mente alojada num «civilizado», numa das nossas cidades-formigueiros, quer seja de um «primitivo», vivendo num local inóspito, debatendo-se para conseguir a sua subsistência.  Todos os humanos são eminentemente questionadores. São capazes de abordagens do real,  tanto mais argutas, quanto significam um ganho de bens materiais, ou melhor capacidade de subsistência. Mas também, uma melhoria de estatuto, ganhar ou guardar a admiração dos outros e inclusive na sedução para satisfazerem seus desejos amorosos. Mas, para além destes aspetos - chamemos utilitários - existe um fundo de curiosidade não motivado por qualquer espécie de ganho (material ou simbólico). É essa curiosidade que levou muitos, já muito antes dos séculos «científicos» (o séc. XVII e seguintes), a descobrirem, inovarem. Foi o homem de há mais de dez mil anos a iniciar empiricamente a seleção das espécies vegetais e animais assim como tratamentos para várias doenças, administrados juntamente com encantamentos, porém com eficácia prática. 

Foi preciso a arrogância de «novos-ricos» de alguns intelectuais do Séc. XVIII, os enciclopedistas, os «sábios» das luzes, para enterrar tudo o que fosse ou soasse a «gótico», tendo sido este termo usado com conotação pejorativa, como sinónimo de Idade das Trevas. Por outro lado, a Antiguidade Greco-Romana, o berço civilizacional  da Europa, era guindado a modelo inultrapassável de civilização. Por exemplo, as conceções políticas dos primeiros republicanos eram fortemente influenciadas pelas suas leituras das instituições da Grécia antiga e de Roma. 

Não foi o advento das teorias marxistas ou anarquistas, no século XIX, que diminuiu  a adoração dos intelectuais pelo passado, mas um passado peneirado de forma a só serem evocados os pedaços que serviam «a causa». Evidentemente, a utilização ideológica de dados objetivos, científicos, sempre existiu. Porém, neste século XIX, a arrogância dos «iluminados», que se consideravam herdeiros da «filosofia das luzes», tornou-se mais pesada, não só diziam estar de acordo com a ciência; iam ao ponto de substituir-se à ciência. Não irei aqui dissertar sobre as monstruosidades resultantes, das «ciências» que vigoraram nos regimes nazistas ou leninistas. Ficará para outra ocasião. 

O que me angustia é que as pessoas continuam a ser crédulas e a tomar como verdadeiras as construções mais falsas, que lhes são servidas pelos aparelhos de media, que veiculam as formas atuais da propaganda. A propaganda que atinge melhor o seu objetivo  e que, portanto, é mais insidiosa, é a que combina a falsa informação, com informação truncada ou distorcida, misturada com elementos reais, mas descontextualizados. A maioria dos que recebe essa informação, dificilmente terá acesso a outra, devido à censura que entretanto se instalou por todo lado: primeiro, a pretexto de «desinformação» sobre o COVID, logo seguida sobre a guerra Russo-Ucraniana. Portanto, pode-se dizer que tanto nos media convencionais, como nos vários canais de Internet,  a moldagem das mentes de milhões de pessoas tem sido feita, impunemente, pelos detentores do poder do Estado e do Capital. 



Se uns ideólogos vêm opor as «democracias ocidentais» aos «autoritários regimes da China ou Rússia», eles sabem que isso é completamente falso, pois os cidadãos de uma ou outra parte, são «regados» com uma chuva de falsa informação e de propaganda disfarçada, sem terem jamais a possibilidade de confrontar uma dada visão (a do poder), com outras narrativas, com vozes críticas. Estou convencido que não há diferença notável, em relação ao grau em que as pessoas estão a ser condicionadas. O conteúdo das informações viciadas e a designação dos «maus» muda, obviamente. Porém, o objetivo é fazer as pessoas comuns aceitarem uma guerra mundial. Um «truque» muito usado é apresentá-la como se ela estivesse para vir. Ora, ela tem estado aqui, sem tréguas, desde 1999, pelo menos e sua preparação vem do ano de 1991. A meu ver, passámos de uma Guerra Fria Nº1 (1945-1990), para a preparação (1991-1999) da IIIª Guerra Mundial. Esta foi iniciada com a guerra criminosa e ilegal contra a Sérvia, sob pretexto falacioso e usando a máquina de guerra da OTAN, para esmagar qualquer oposição socialista ao projeto globalista e afirmar seu domínio na Europa, face ao poder em declínio da Rússia.

Penso que o trágico disto é que o poder dado pela tecnologia e pela ciência, foi colocado nas mãos dos muito poderosos. Foi com estes conhecimentos que construíram toda a maquinaria de morte que é usada no planeta. Foi com o capital acumulado a partir do trabalho de inúmeras pessoas e em várias gerações, que estes instrumentos de morte têm sido contruídos. Foi com a ciência do comportamento humano, a sociologia, a psicologia, as neurociências, que afinaram as máquinas de destruição massiva das inteligências, que são os media corporativos.

A humanidade pode muito bem ser reduzida - de forma drástica - por uma nuclearização da guerra em curso (a Terceira Guerra Mundial). Mas, se tal acontecer e se não houver o desaparecimento total da espécie humana, os que subsistirem, vão herdar um planeta severamente «doente», empobrecido no plano das realizações técnicas e científicas, assim como artísticas, mas sobretudo no plano dos recursos naturais, das espécies, aos vários ecossistemas; dos oceanos, aos rios... Os sobreviventes serão mais infelizes do que os que morreram pulverizados, pela explosão dos engenhos nucleares. Porque, os sobreviventes não terão assistência médica, não terão comida suficiente, não subsistirá qualquer resto de «civilização», haverá criminalidade à solta, será um inferno na Terra. Isto é a promessa real da escalada de agressividade entre potências, até ser alcançado o apocalipse nuclear.

Os gregos consideravam que a húbris (a embriaguez da vitória) era causadora dos piores desastres quando se apossava dos soberanos ou generais. Agora vemos certos líderes a falar, todos inchados, quando os vemos rejeitar, com soberba, quaisquer iniciativas diplomáticas que poderiam conduzir à paz. Estarão, eles mais os seus conselheiros, tomados por húbris e são muito piores para os seus respetivos povos, do que se imagina.

Mesmo que - no imediato - haja uma paz, será uma trégua, mais do que uma paz. Porque a arrogância e húbris dos poderosos permanece. A ambição não satisfeita de uns e a cobardia de outros, farão com que, passado pouco tempo, se reiniciem as ações bélicas. O cenário de uma guerra permanente, ora incendiando certos continentes, ora outros, também é possível e mesmo, provável.

A subjugação da cidadania, sua redução a servos modernos, em mais de 90% dos casos, é o que tem permitido isso. Tem sido através do condicionamento mental em massa, das campanhas de medo e desinformação, da repressão selvática de quaisquer resistências, mesmo as mais pacíficas. Mas, por sua vez, a posse do poder de Estado e do poder de empórios privados em pouquíssimas mãos, veio permitir que uma ínfima minoria continue a fazer o jogo sujo e triste de oprimir muitos milhões, sem quaisquer rebates de consciência. Esta classe oligárquica é formada por psicopatas e sociopatas: Julgam-se «realmente uma raça superior» ao vulgar e, como não têm moral nenhuma, fabricam - à medida dos seus intentos - as «justificações» que mais lhes convêm. Os motins, causados pela exacerbação do ódio entre comunidades justapostas, mas não convivendo pacificamente umas com as outras, é-lhes favorável: Permite manter uns contra os outros (dividir para reinar) e faz com que a maioria das pessoas não veja os desvios de dinheiro público, que são os seus impostos, para consolidar o poder dos novos senhores feudais sobre a plebe através da privatização dos bens públicos e do desvio constante de colossais somas para o complexo militar-industrial.

A tragédia grega punha em cena uma série de personagens, que eram arrastadas pelas suas paixões até à destruição inexorável: Este era, afinal, um castigo dos deuses.

O simbolismo da tragédia grega deve estar presente nas nossas consciências pois se aplica aos nossos tempos, para caraterizar a deriva da humanidade para a autoaniquilação: Como se chegou a este ponto?

O despertar da letargia tarda em se verificar: O caso do genocídio que é infligido ao povo de Gaza e da Palestina, em geral, está perante todos. Não pode ser esquecido, nem minimizado. Sobretudo, porque nos países ditos de democracia liberal, tudo tem sido feito para não incomodar os sionistas que têm levado a cabo esta brutal «limpeza étnica». Os cúmplices do enorme crime que se desmultiplica em milhões de crimes, são aqueles que, sabendo a verdade, não a dizem, não fazem nada, como se nada fosse com eles. A humanidade toda, sem exceção, está condenada, porque caminha para um destino terrível. Mas as pessoas ainda têm o potencial de inverter o caminho para o abismo. Porém, para isso, têm de tomar consciência e assumir as suas responsabilidades nas suas vidas. Se algumas pessoas com inteligência e sageza se associarem, podem alavancar suas qualidades respetivas e ajudar a solucionar alguns problemas concretos nas suas sociedades. Elas têm, para conseguir algo, que perceber a natureza perversa do poder instaurado e organizarem-se de forma tal, que aquele poder não consiga desbaratar os seus esforços. É uma longa e difícil tarefa, mas não vejo outra saída.