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terça-feira, 19 de abril de 2022

QUEM CONTROLA QUEM?



Quem costuma prestar atenção aos discursos políticos, ideológicos e mediáticos dominantes, sabe que nestas esferas se manufaturou - desde há longa data - um consenso: A democracia é um sistema que está inerentemente associado com a «liberdade» dos mercados, sendo uma heresia, sob o ponto de vista económico, mas político também, querer «regular» os mercados. Isso (regular os mercados) seria a marca das ideologias mais ou menos autoritárias, pondo dentro do mesmo saco os fascismos, incluindo o nazismo, as regulações social-democráticas ocorridas  após IIª Guerra Mundial no Ocidente e todos os socialismos autoritários, desde a União Soviética, os diversos regimes «comunistas», em vários continentes, até à China contemporânea, um híbrido de capitalismo/comunismo.
Esta visão do mundo, propriamente ideológica, é reafirmada por um montão de discursos, que confluem para afirmar essa tal inevitabilidade: ir contra a «liberdade» dos mercados, é estar a fragilizar - também - a liberdade política e a ordem social liberal.
Note-se que este discurso é apenas uma atualização dos ataques no século XIX, contra as correntes sociais e socialistas (o que incluía marxistas e fortes correntes anarquistas). Nesta fase, o capitalismo industrial triunfante parecia efetivamente ser um modo de produção cuja maior eficácia e produtividade eram inegáveis. Eram comuns os argumentos de que o capitalismo «não se dá bem» com ditaduras, que uma economia capitalista não se concebe sem concorrência e que a concorrência implica liberdade dos indivíduos, uma imprensa livre, etc., etc.
De facto, nas suas linhas fundamentais, os argumentos permanecem os mesmos. Porém, o próprio capitalismo não só envelheceu, como também se transformou, de tal modo que se pode legitimamente perguntar se algo do «livre mercado», ou se algo dum genuíno liberalismo, tanto económico como político, permanece nos países tidos como guardiães dos mercados livres e da democracia liberal. Estes, são os países «ocidentais», um conceito político, pois inclui países como o Japão, a Coreia do Sul, ou a Austrália, que não são geograficamente «ocidentais».
Curiosamente, as esquerdas liberais ou libertárias,  parlamentares ou extra- parlamentares, têm feito a mesma apologia dos mesmos «valores», apenas desejando a «limitação» dos grupos económicos muito grandes, apenas porque são muito grandes, deixando o resto na mesma. Quanto à sua formal e retórica aversão aos monopólios, tem origem em slogans dos anos 60 e 70, onde ainda havia um segmento significativo das esquerdas «ocidentais» que eram realmente anti- capitalistas, que punham em lugar central a luta de classes e a luta anti-imperialista. O que se vê, hoje, na «esquerda» é que as pessoas bem podem conservar uma auto- imagem «anti- capitalista», mas (infelizmente), a meu ver, ela não corresponde à realidade.
De resto, a «liberdade dos mercados» carece de qualquer razão profunda para se lutar por ela, não pode ser considerada um valor em si mesmo, a não ser que se ache justificado que a Grã-Bretanha tenha, em nome da liberdade de comércio, imposto o ópio e as guerras do ópio ao império da China, como se fosse direito inalienável do império Britânico, vender as mercadorias que quisesse, aonde quisesse e a quem quisesse. 
Pessoas que se dizem liberais hoje acham  frequentemente, que o capitalismo está a ser plenamente falseado pela existência dum ordenado mínimo, o qual impediria o mercado laboral de funcionar «em plena liberdade» e que os trabalhadores aceitem voluntariamente (sic!) trabalhar por salário abaixo do tal mínimo. O salário mínimo é acusado de falsear a concorrência, devido aos «pobres capitalistas ocidentais» serem confrontados com a produção a menor custo, noutras paragens, com salários mais baixos. Tudo isto são falácias, fáceis de desmontar!
Podia-se escrever um longo capítulo de exemplos, desses tais «valores neoliberais» contemporâneos. Penso que o leitor poderá facilmente perceber aonde quero chegar, mesmo sem multiplicar os exemplos: Trata-se de um exercício de hipocrisia, que mascara um racismo classista, vindo diretamente do setor capitalista mais reacionário e anti-humanista.
Esta corrente, tem hoje em dia um renovo: O neomalthusianismo é a ideologia que subjaz um complexo ideológico. Ouvem-se nomes diferentes como o transumanismo, o keynesianismo, o militarismo, mas eles são somente, afinal, «parágrafos diferentes do mesmo credo». Esta corrente floresce graças aos muito ricos e poderosos bilionários, que se colocam como patronos ou benfeitores «humanitários» e «aconselham» governos e outros, servindo-se de «fórums», como o de Davos, controlando quer a «media de massas» tradicional, quer os novos instrumentos mediáticos da Internet (Twitter, Facebook, Google, etc...) .
O nível extremo deste poder de controlo revela-se nas instâncias internacionais. Elas não deveriam estar submetidas à pressão de financiadores privados, como acontece no caso da OMS. É conhecido que o financiamento maior da OMS provém da Fundação Bill Gates, sendo também muito grande a contribuição das grandes farmacêuticas. A OMS deveria escapar a tal sujeição, funcionar apenas como agência da ONU, tendo só contribuições dos diversos países membros.
Quando interesses privados, de um modo insidioso, com a colaboração de Estados, se imiscuem na gestão de aspetos da vida que deveriam ser públicos, obtém-se uma rede de interesses muito fortes, as chamadas «parcerias público-privadas». Estas, nada mais são do que estruturas para impor um regime de monopólio em setores inteiros da economia, portanto, a negação total da «livre concorrência». Pense-se em Portugal: No setor energético (EDP, GALP, GDP etc.), no setor das autoestradas (BRISA), no setor das comunicações e media (NÓS, MEO, jornais de grande tiragem e grupos de imprensa, além de copropriedade com o Estado, vivem de subsídios estatais), nas empresas de transportes (a TAP e muitas outras). Na educação, as universidades «privadas» são, na verdade, parcerias com o Estado, tal como os colégios (da primeira infância, ao fim do secundário), viáveis somente devido aos constantes subsídios e ajudas diversas do Estado.
As parcerias público- privadas, tão do agrado da classe capitalista, como da corrompida classe política, são - nada mais, nada menos - que monopólios de renda, para os interesses capitalistas privados. O Estado fica - de facto - como garante da viabilidade económica destas estruturas. O apoio que ele (Estado) presta, pode ser direto: Como foi o caso, para salvar bancos privados, como o BES e outros. Em Portugal, os contribuintes, defraudados pelo Estado que governa «em nome deles», são quem desembolsa os milhões para cobrir as perdas dum banco americano («Lone Star»), que adquiriu, em condições de privilégio inéditas, o «Novo Banco» resultante do falido BES (Banco Espírito Santo).
Aquilo que se observa em Portugal é igual, em mais grotesco, ao que ocorre em países mais fortes, como os EUA, a Alemanha, a França, etc...
Estas relações são de tipo ternário:
- O Estado faz reféns os cidadãos, obrigando-os a contribuir com seus rendimentos (o imposto sobre rendimentos), com contribuições obrigatórias (para segurança social, etc.) e com os impostos diretos (IVA, etc.).
- As grandes empresas conseguem dominar o mercado, um domínio em monopólio ou oligopólio (duas ou três empresas num setor, «ditas concorrentes»). Isto é obtido mediante toda a panóplia de instrumentos e táticas, que incluem a absorção de concorrentes mais fracos, a exclusão dos potenciais concorrentes, incluindo a sua sabotagem, a utilização de conivências instaladas no aparelho de Estado, etc.
- As empresas monopólios ou oligopólios, estabelecem com o Estado, diretamente ou através de empresas e instituições estatais, acordos de parceria. Estes, além de reforçarem as suas posições de mercado, dão-lhes acesso a fonte de financiamento seguro, à garantia de salvamento, mesmo perante erros da gestão empresarial, etc.
Pode-se dizer que estas parcerias reúnem todas as vantagens dos sistemas privados e todas as dos públicos mas, para maior vantagem dos privados, sobre as estruturas públicas. Com efeito:
Podem exercer a sua atividade, seguindo apenas as regras do mercado; podem ser cotadas em bolsa; podem negociar acordos salariais e outros dentro da empresa; não estão sujeitas a seguir critérios definidos pelo governo, seja para promoções ou concursos externos de pessoal, como nas empresas públicas; podem sobretudo distribuir os lucros obtidos pela empresa, entre os acionistas e membros de topo da gestão.
Mas, têm as vantagens dum investimento público, como: A possibilidade do Estado investir diretamente com dinheiro público, ou com dívida pública (que os contribuintes terão de pagar futuramente); têm a garantia do Estado para qualquer empréstimo que façam; têm acesso às redes de influência e de poder, sobretudo. Esta simbiose permite-lhes estar por dentro do poder político qualquer que ele seja, sem parecer.

Geralmente, os media estão cheios de notícias que desencadeiam um reflexo «visceral» nos seus leitores/auditores: esta gestão das emoções é monitorizada cientificamente, por cientistas comportamentais, psicólogos, sociólogos, antropólogos, etc. «que venderam a alma ao diabo».
Não são os únicos, pois nas universidades, em particular, abunda esta espécie, que se reveste dos louros académicos para viver como parasita da democracia. Estas pessoas são compradas, ou melhor, são apropriadas. Estamos a falar do funcionamento de instituições com potencial para influir na opinião pública, tais como a media de massas, o ensino superior, os corpos de elite do Estado, as instituições de investigação (estatais ou privadas).
É impossível alguém não-conforme com a ortodoxia permanecer nestas instituições durante muito tempo, pois seria marginalizado e finalmente expulso, se levantasse frequentemente a voz para afirmar algo desagradável aos seus patrões. Também, não há grandes hipóteses de tal vir a ocorrer, pois os candidatos são sujeitos a uma seleção que privilegia a conformidade, em detrimento da criatividade e originalidade. No processo de seleção, uma pessoa que sai fora dos cânones aceites e desejados, até  poderá ser dotada de inteligência e  capacidade criativa acima dos outros concorrentes. Mas, os que selecionam os candidatos não vão selecionar essa tal pessoa, porque têm de escolher alguém que «encaixe» no perfil traçado.

No conjunto, as sociedades ditas de «democracia ocidental» vivem numa espécie de teatro ou de simulação permanente. Ai de quem se atreva a dizer «o rei vai nu!»
As circunstâncias delineadas nos parágrafos acima, não são as únicas em que ocorre uma ficção de «concorrência». Todo o conjunto da sociedade é atravessado pela mesma corrução intrínseca, pela mesma hipocrisia institucionalizada, pela supressão dos mecanismos de controlo popular. É preciso compreender que o poder sobre os indivíduos, implica um controlo, mandar nas pessoas, forçá-las a conformarem-se com as normas (sobretudo, as não escritas) e, por estes meios, manter as hierarquias de poder em todo o tecido social, sem as quais (segundo eles) a sociedade dita «civilizada» não poderia subsistir. Sem hierarquia, tudo cairia no caos, na anarquia. 
De facto, a «civilização» deles, é realmente sinónimo de violência e de caos, sobre os pobres, os destituídos, os excluídos. O «socialismo para a elite e escravatura do capital para os servos», é o verdadeiro mote da sociedade que eles querem implantar (Great Reset), conservando apenas a retórica da «democracia liberal». Mas, isto nunca é patente, antes é sempre ocultado pelo poder!

domingo, 19 de setembro de 2021

PORTUGAL: MONO- E OLIGOPÓLIOS PARASITAS / ESTADO DOMINADO POR MÁFIAS

 É muito comum, no meu país, as pessoas queixarem-se «do Estado», que seria, segundo elas, responsável por muitas coisas funcionarem mal. A um nível superficial, esta acusação parece ter pleno cabimento, mas... «O diabo está nos pormenores».

Em primeiro lugar, desde há muito tempo, o Estado tem sido capturado por interesses privados

O que significa isso, no concreto? Significa que serviços públicos são levados a um estado lamentável por corruptos, desde os gestores públicos, até aos ministros, que estão - na verdade - a fazer aquilo que convém ao sector privado. Fazem-no, para tornar possível uma intervenção do sector privado, por falha óbvia das estruturas públicas em satisfazerem, com um mínimo de qualidade e dignidade, as tarefas que lhes competem. 

São inúmeros os casos de desleixe criminoso nos sectores públicos de saúde, de educação, de transportes e outros. Estes fracassos são vistos, pelo público, como justificando que tais serviços sejam privatizados. 

Os sectores privados envolvidos são persistentes na procura do lucro e têm capacidade para subornar diversos agentes públicos, incluindo deputados, partidos e suas burocracias. Portanto, um sector, um grupo de empresas ou uma instituição, que estejam na mira desses senhores, acabam por cair-lhes no bolso.

Mas, o fenómeno não envolve meramente simples perda de património e perda do efeito de alavancagem, por parte do Estado. A operação, bastas vezes, é uma cedência do Estado aos privados, por tuta e meia, ou mesmo, por nada, ou menos que nada.

Não é raro o processo de privatização envolver pesados encargos, para o referido Estado, que vão muito além do que o bom-senso ditaria, como é o caso de cobrir os prejuízos futuros da estrutura privatizada, no pressuposto de que a entidade privada tenha «aceite» o encargo de ficar com a estrutura, na condição desta gerar um determinado lucro. 

Foi o caso do acordo desastroso com a «Lone Star», que se tornou proprietária do Novo Banco (Ex- BES), mas sem ter o risco de suportar prejuízos. O Estado é que tem obrigação contratual de o fazer! 

O mesmo se passa com número considerável de empresas, pequenas, médias e grandes. Temos um efeito gigantesco de extração de renda. Ou seja, os prejuízos são para o erário público (todos nós, contribuintes), mas os lucros são privados, são para os acionistas.

Se virem como foram feitos os contratos de privatização no sector dos transportes de camionagem interurbana, foi exatamente assim. O nº de passageiros que utilizam a empresa de camionagem, é base de cálculo para o Estado «indemnizar» a empresa pelo serviço.

O valor das ajudas oficiais e das isenções de impostos, de que os colégios privados beneficiam, daria para equipar e modernizar as escolas públicas e, ainda por cima, para recrutar pessoal docente e auxiliar, de forma que a escola pública fosse de qualidade. 

O mesmo em relação ao sector empresarial da medicina, que tem invadido o serviço público de saúde, visto que os empresários do ramo conseguiram ter muita da clientela do SNS, da ADSE, etc., além dos acordos com as seguradoras. 

O incauto não compreende que a má qualidade e ineficiência das estruturas públicas se devem, não a «laxismo» do pessoal ou a «controlo» dos sindicatos, ou de outras atoardas que lançam, para denegrir tudo o que seja serviço público. 

Muitas coisas são feitas com a conivência no topo, de ministros, secretários, diretores-gerais, gestores, que deveriam zelar pelo bom funcionamento dos serviços públicos, pela eficaz administração e pela criteriosa atribuição dos dinheiros públicos, mas que - ao falharem nisso  - são «remunerados», por caírem nas boas graças dos patrões dos sectores privados respetivos. 

É a máfia que se infiltra nos altos cargos do Estado e assume o papel de sabotadora do mesmo. Assim, o negócio da privatização passa muito bem, com figurões políticos como seus defensores, não desinteressados, visto que satisfazem as clientelas dos sectores privados, com apetite por tragar os bocados rentáveis, ou facilmente rentabilizáveis dos sectores públicos. 

Primeiro, as coisas são degradadas, a rentabilidade diminui ou desaparece, os prejuízos acumulam-se, agravados pelas más gestões sucessivas, pelo que - no final - é colocada em cima da mesa a proposta de privatização.

 Uma vez concretizada a privatização, o objetivo passa a ser o lucro e a entidade privada que detém a empresa vai fazer tudo para obter máxima rentabilidade, incluindo através de acordos leoninos com o Estado. 

Fica assim o utente a pagar duas vezes, pelo menos: Uma, diretamente pelo serviço privatizado; outra, de modo diferido pelo financiamento do Estado à empresa. Assim se explicam os preços de monopólio ou de oligopólio, que a entidade privada costuma cobrar. 

Não se esqueça que, se o utente tiver um reembolso (total ou parcial) do serviço, através da Segurança Social, ou doutra entidade pública, esse reembolso é feito com dinheiro público, para o qual o utente contribuiu.

Por estas razões, não me custa compreender por que razão Portugal é um país com tão baixo índice de bem estar e desenvolvimento humano, apesar destes quase 50 anos de «democracia» estável, ao fim e ao cabo: 

É que as máfias tomaram conta do poder político, exercendo enorme extração de renda, encapotada mas inegável, ao povo e ao Estado, como eu expliquei.