Porque razão os bancos centrais asiáticos estão a comprar toneladas de ouro? - Não é ouro em si mesmo que lhes importa neste momento, mas é a forma mais expedita de se livrarem de US dollars!!
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terça-feira, 12 de setembro de 2017

A LUTA PELA AUTONOMIA NO CURDISTÃO SÍRIO

                         
Em 2014, quando os exércitos do Iraque e da Síria foram derrotados por uma repentina ofensiva do ISIS, algo muito particular surgiu no território Sírio, perto da fronteira com a Turquia, na região de Kobane. 
Milícias curdas de auto-defesa (YPG) ergueram-se para defender Kobane, a cidade onde predominava esta etnia, para que ela não caísse nas mãos dos djihadistas salafistas financiados pelas monarquias do Golfo, em especial pela Arábia Saudita, com a bênção e apoio logístico, em segredo, dos americanos. Nesta ocasião formou-se um movimento de solidariedade com os defensores de Kobane, tidos como próximos do partido curdo irmão do PKK.
O PKK, por sua vez, depois da prisão do seu líder Oçalan, numa ilha turca,  tinha sofrido uma mutação tanto estratégica quanto ideológica. O seu líder prisioneiro, tinha estudado com muito interesse Murray Bookchin e tinha chegado à conclusão de que o seu movimento se deveria inspirar pelo Municipalismo Libertário para construir a nova entidade, nas zonas libertadas. Assim, Kobane foi o primeiro laboratório em «escala real» de um movimento de guerrilha, que adotou princípios de horizontalismo, assembleísmo e de total igualdade entre homens e mulheres. Se tal postura já era por si só revolucionária em qualquer parte do mundo, em especial o seria frente a uma ofensiva dos ultra-conservadores, inspirados na interpretação mais obscurantista e fundamentalista do Corão: o Waabismo.
Porém, não devemos embandeirar em arco, pois as forças nas quais se integram os contingentes curdos sírios, as SDF (Sirian Democratic Forces) são largamente controladas, financiadas e equipadas pelos EUA. Estes, não querem perder o controlo estratégico do leste da Síria, onde se situa o petróleo e onde podem exercer vigilância sobre o Irão, sobretudo pretendem manter as bases ilegalmente aí implantadas, sob o pretexto de combater o Estado Islâmico (uma criação deles, da Mossad, dos sauditas, dos quataris, da Al Quaida, etc.) . 
Agora, com Dar-el-Zor prestes a ser libertada do cerco de anos pelas forças do Estado Islâmico, desenvolve-se uma corrida de velocidade para controlar esta região, rica em petróleo, entre as forças governamentais sírias, apoiadas pela Rússia, e as forças de SDF, apoiadas pelos EUA. 
O que deveria prevalecer seria um acordo para que não houvesse incidentes entre forças que, nominalmente, combatem o mesmo inimigo... mas sabemos que tem havido uma constante sabotagem disso, pelo Estado Profundo dos EUA, que já vem do tempo da presidência Obama. Não esqueçamos que um acordo de troca de informações entre forças dos EUA e Russas foi sabotado horas depois de concluído, pelo bombardeamento «por engano» de uma coluna do  exército sírio, causando mais de 60 mortes do lado sírio, na altura em que estes estavam a repelir o Estado Islâmico na zona de fronteira sírio-iraquiana.   
Vamos ver o que traz a queda da província de Dar-el-Zor

                             
                              
O que os EUA tentam cozinhar é claramente a construção de um mini-estado tampão, usando os curdos (tal como o fizeram, várias vezes, com os curdos iraquianos) para depois poderem se implantar permanentemente nessa zona do mundo, onde estritamente não têm absolutamente lugar nenhum, mas onde eles pretendem estar presentes, para controlo das rotas do petróleo, do gás e mantendo e acirrando rivalidades e conflitos entre povos, única coisa na qual eles são exímios! 

No meio disto, os militantes revolucionários vão ser - mais uma vez - «deitados para debaixo do autocarro», caso continuem a fazer a escolha errada e «apanhem o isco» de criar um mini estado Curdo, sem viabilidade e apenas baseado no apoio americano.

domingo, 3 de setembro de 2017

MUNICIPALISMO LIBERTÁRIO

Com a aproximação de uma campanha eleitoral para as autarquias (Municípios e Juntas de Freguesia) em Portugal, achei oportuno recordar algumas formas alternativas de se fazer política municipal. Não no sentido vago de algo que se mantém nas margens do sistema, sem no entanto o pôr em causa, mas justamente, aquelas experiências ricas de saber e prática. Aquelas experiências onde um sentido agudo dos objetivos estratégicos se alia com a noção realista e pragmática de quem intervém no seio das sociedades. 

Irei expor, em artigos seguintes, algumas experiências de auto-gestão generalizada, de participação democrática genuína da população, que estão em curso. 
Podem ser consideradas utopias realizadas, na medida em que as suas premissas teóricas estão próximas dum comunalismo/comunismo autêntico, ou seja, do comunismo anárquico que se desenvolveu ao longo dos séculos 19 e 20, tendo tido expressão em várias experiências históricas: 
- As grandes e trágicas experiências da Comuna de Paris, de 1871, dos sovietes russos, que foram domesticados e esvaziados pelo poder Bolchevique, da Revolução Espanhola de 1936-1939. Mas também a gesta menos conhecida e estudada da Revolução da Macnovichina, em distritos rurais da Ucrânia, entre 1917 e 1923, que fez frente sucessivamente a exércitos Czaristas, Alemães, Nacionalistas Ucranianos e Bolcheviques e a gesta ainda menos conhecida dos anarquistas do extremo-oriente, sobretudo Coreanos exilados na Manchúria entre 1929-31, que constituíram comunas libertárias e lutaram contra exércitos inimigos (do Japão imperial, mas também do partido «comunista» Chinês) em território muito vasto, superior à superfície total da Bélgica e Holanda reunidas.

Nos finais do século XX, Murray Bookchin dava corpo teórico a uma forma de intervenção não burocrática, mas de democracia participativa, numa altura em que ainda não abundavam escritos e muito menos práticas de gestão territorial, seguindo os princípios libertários, em tempo «normal» e em grande  escala. 

Felizmente, a situação mudou, desde os anos noventa do século vinte: não têm faltado experiências às quais nos podemos referir, como inspiração, mais do que como modelo. Com efeito, os modelos são sempre coisas fossilizadas e tomando como idênticas as circunstâncias, as quais nunca são possíveis de transplantar, de um dado local geográfico e de um particular contexto sócio-histórico.

Irei escrever...
- sobre a rebelião Zapatista, no sul do México, em Chiapas, que trouxe formas vivas de auto-organização associadas com a resistência armada de um povo indígena, que não se quer deixar dominar pelo poder do dinheiro; 
- sobre a Rojava, no Curdistão Sírio, onde uma forma anti-autoritária de vida comunitária se constrói, ao mesmo tempo que as forças de auto-defesa combatem (desde há quase 4 anos, por vezes, praticamente sozinhas) a investida brutal e obscurantista do ISIS ou Estado Islâmico. 
- Também irei debruçar-me sobre experiências numa escala, não de regiões, mas de autarquias, de municípios e aldeias, como Marinaleda, na Andaluzia ou de comunidades autónomas no Sul Alentejano. 

«... A recuperação e desenvolvimento da política deve, afirmo, tomar como ponto de partida o cidadão/cidadã, no seu entorno imediato, para além das áreas familiares e privadas de sua vida. Não pode haver política sem comunidade. E por comunidade quero dizer uma associação municipal de pessoas reforçada pelo seu próprio poder económico, a sua própria institucionalização da democracia de base, com o apoio confederal de outras comunidades vizinhas, organizadas numa rede territorial à escala local e regional. Os partidos que não participem nesta forma de organização popular não são políticos, no sentido clássico do termo. De facto, são burocráticos e opostos às políticas participativas e à participação dos cidadãos. A autêntica unidade de participação na vida política é o município, quer seja na sua totalidade, se ele for à escala humana, ou nas suas diversas subdivisões, nomeadamente, na vizinhança, no bairro...»

. . . The recovery and development of politics must, I submit, take its point of departure from the citizen and his or her immediate environment beyond the familial and private arenas of life. There can be no politics without community. And by community I mean a municipal association of people reinforced by its own economic power, its own institutionalization of the grass roots, and the confederal support of nearby communities organized into a territorial network on a local and regional scale. Parties that do not intertwine with these grassroots forms of popular organization are not political in the classical sense of the term. In fact, they are bureaucratic and antithetical to the development of a participatory politics and participating citizens. The authentic unit of political life, in effect, is the municipality, whether as a whole, if it is humanly scaled, or in its various subdivisions, notably the neighborhood. . . .

Retirado de «Libertarian Municipalism: The New Municipal Agenda» por Murray Bookchin»