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sábado, 10 de setembro de 2022

ILUSIONISMOS , POR ANTÓNIO BARATA


https://bandeiravermelhablog1.wordpress.com/2022/09/09/ilusionismos/#more-3176

Por António Barata, 

publicado em «Bandeira Vermelha»

O recente pacote de medidas do governo PS destinado a minorar os efeitos da carestia, agravada primeiro com a pandemia e depois a guerra na Ucrânia, e que está a lançar na pobreza cada vez mais trabalhadores, foi recebido com o aplauso e a simpatia da maioria dos comentadores. Mas não foram precisas muitas horas para que o tom começasse a mudar, à medida que se começaram a fazer contas.

E da esquerda à direita, incluindo sectores do próprio partido do governo, começaram a chover as críticas, em crescendo, partindo da simples observação de que:
1) dar 150 euros a cada trabalhador, a que se podem juntar mais 50 por cada filho, no próximo mês de Outubro, deixa tudo na mesma;
2) os reformados e pensionistas são espoliados e duplamente descriminados – não só não têm direito à esmola dos tais 150 euros (vá-se lá saber porquê), como vão ver as suas reformas reduzidas em cerca de 4%, já a partir do próximo ano, dado que de acordo com a lei estas deveriam ser aumentadas em 8 a 9%, em linha com a inflação, e não os 4% anunciados. E não é por o governo caridosamente “dar” a cada pensionista, já no próximo mês, um “bónus” de mais 50% da sua pensão que desmente o facto de isso corresponder a coisa nenhuma – esses 50% correspondem a metade do valor mensal da pensão que deveriam receber em 2023 se esta fosse aumentada os tais 8 a 9%, e que já não vão receber, permitindo ao governo reduzir o valor das pensões em cerca de mil milhões de euros mensalmente. O meio mês que agora vão receber a mais, vão receber a menos no próximo ano e nos seguintes, até ao fim das suas vidas.

Partido destas constatações, toda a oposição, da direita ao BE e PCP, a que se juntou timidamente parte do PS, faz acompanhar as suas críticas de propostas construtivas sobre o que deveria ter sido feito para que as esmolas às classes trabalhadoras fossem mais generosas.

Sem surpresa, a direita põe a tónica na descida do IRC e do IVA e em dar prioridades as ajudas às empresas enquanto vai regateando a paternidade das partes do pacote do PS que considera boas.

Por seu lado, a “esquerda” ordeira, como já nos habituou, desdobra-se em conselhos construtivos e responsáveis sobre como o governo deveria conduzir a economia e o combate à crise neste momento de aflição: taxar os lucros “inesperados” das grandes distribuidoras de energia, baixar a taxa do IVA e gastar a receita excedente (relativamente aos anos anteriores) dos impostos arrecadados este ano. Tudo isto devidamente embrulhado em apelos moralistas “à responsabilidade e solidariedade social” do patronato e mostrando-se indignada com os “lucros excessivos” da EDP, GALP e demais distribuidoras.

Certamente que muito do que o BE e o PCP criticam é acertado. Mas a questão não é essa. É antes a de saber se essas críticas servem para alimentar a ilusão de que é possível sensibilizar a burguesia para os problemas dos debaixo, tornando-a menos gananciosa ao capitalismo menos rapace, ou se vão no sentido de desfazer essas ilusões mobilizando assim os trabalhadores para a luta radical contra o capital e não só contra o governo de serviço e os políticos “ladrões e corruptos”. Se esses partidos, que se dizem de esquerda e a favor do socialismo, realmente agissem de acordo com o que dizem ser, não se ficariam por estas críticas superficiais e tão óbvias quanto inócuas, que até parte da direita as subscreve. Preocupar-se-iam antes em elevar a consciência das classes trabalhadoras fazendo-os perceber que o problema é o capitalismo e não o capital financeiro, os maus políticos, a incompetência, a troca de favores e a satisfação das expectativas das respectivas clientelas.

Teriam de começar por dizer que no nosso país a pobreza é estrutural. Que a carestia não é só de agora nem só consequência da pandemia e da guerra na Ucrânia. Que a pobreza estrutural é uma constante com mais de 20 anos, vitimando 1 em cada cinco trabalhadores, incidindo principalmente nas mulheres, crianças e idosos; que a crise e a austeridade (que agora dá pelo nome de “contas certas”) iniciada em 2008 não terminou nem houve nenhum “virar de página”. E, acima de tudo, por dizer não ao Pacto de Estabilidade e Crescimento e ao pagamento da dívida; que não é possível melhorara as condições de vida das classes trabalhadoras portuguesas sem rejeitar o “memorando de entendimento” imposto pela troika ao PS, PSD e CDS, e que ainda continua em vigor, o qual obriga os governos a respeitar as metas do deficit, a degradar a segurança social e os salários, a precarizar e flexibilizar as relações laborais, a cortar prestações sociais, a aplicar os empréstimos naquilo que o BCE determina e não no que é necessário ao desenvolvimento económico do país, etc. É este o compromisso subserviente que une toda a burguesia portuguesa, e de que ninguém fala, que explica e dá sentido à prática continuada dos governos de António Costa (com e sem geringonça) de prometer e não cumprir, orçamentar mas não gastar, fazer e desfazer acordos segundo as conveniências sem se preocupar em cumprir o que acordou com os seus parceiros de circunstância, e também às opções do actual Orçamento de Estado e a esta sua proposta.

A crença partilhada pelo PSD, IL, PAN, PS, PCP e BE, de que é possível desenvolver a economia, criar riqueza e, ao mesmo tempo, cumprir o deficit e pagar os juros da dívida é uma falácia posta a nu pelo desinvestimento crónico na economia e nos serviços, e cujos resultados são o crescimento anémico da economia, a degradação acelerada dos transportes, o estado comatoso do SNS e do ensino, a degradação das infraestruturas e do meio ambiente, a crise da habitação, o florescimento do trabalho escravo (em particular na agricultura), a corrupção generalizada, os salários de miséria e a precarização crescente do trabalho. Situação esta que sofreu um forte agravamento com a pandemia e, agora, com a guerra na Ucrânia, e que não será revertida pelos milhões da dita “bazuca” nem pelo prometido PPR. Enquanto não se disser não à tutela europeia do BCE, ECOFIM e Eurogrupo, se recusar o pagamento de dívida, o espartilho das regras comunitárias e o diktat europeu, nada mudará a favor das classes exploradas.

Mas se a aceitação da tutela europeia explica as opções do governo e a unidade nacional em torno da “Europa”, dos “valores europeus”, do euro e da Europa fortaleza, ela não explica nem a desfaçatez nem a arrogância de António Costa e seus ministros, nem a compreensão benevolente do presidente Marcelo face às “habilidades” do governo. O que as explica é o clima social caracterizado pela falta de um modelo de sociedade alternativo àquilo que existe, tanto por parte da burguesia como do operariado, que não vá para além do Estado social.

Portugal não só é o país europeu com o maior fosso entre ricos e pobres, como esse fosso não tem parado de crescer, e ainda mais com crises. Enquanto os salários dos trabalhadores portugueses são em média metade dos dos seus congéneres, os dos gestores públicos e privados são superiores. Se na Alemanha um gestor ganha em média 10 vezes mais que um trabalhador, no nosso país ganha cerca de 40 vezes mais, e a tendência é para alargar essa diferença.

A isto soma-se:
1) o estado de bandalheira a que chegou o regime democrático no nosso país, com a justiça transformada numa anedota, instrumento de disputa político-partidária e de ambições corporativas, a comunicação social a ser instrumentalizada como nunca e submetida ao pensamento único, e a economia transformada em negócio de “padrinhos”.

Situação que, ao contrário do que nos diziam, não se alterou com as receitas “purificadoras” do FMI, do Banco Central Europeu e da troika. E como nada se alterou e as finanças continuam à beira do colapso, a receita aí está, eterna, impondo a redução da despesa do Estado despedindo, baixando salários, cortando nas reformas, nas despesas e regalias sociais;

2) a mediocridade e corrupção da chamada “classe política” e o carácter rentista da burguesia portuguesa, que não está habituada a correr riscos, mas a viver da proteção e dos favores do Estado, das suas obras públicas, dos financiamentos comunitários por ele canalizados e, portanto, avessos a qualquer reforma que ponha em causa este status quo.

Como mais uma vez constatamos, a “esquerda” que temos, toda ela ordeira e sempre preocupada em “apresentar alternativas”, esteja dentro ou fora do parlamento, faz um silêncio absoluto sobre esta questão central da submissão à tutela comunitária, crucial para o crescimento de uma consciência revolucionária anticapitalista e internacionalista entre as massas trabalhadoras e o operariado em particular. Eternamente entretida a dar moral e conselhos à burguesia sobre a melhor condução dos negócios, em sensibilizá-la para os graves problemas sociais e os malefícios decorrentes da ganância e da falta de transparência, da preponderância do económico sobre o político, estamos condenados a pagar os custos das crises e os desmandos do capital. Como uma fatalidade, empurram-nos para uma opção viciada: a de escolher como vamos ser “espremidos”.

Nunca, como agora, foi tão necessária uma outra esquerda.

segunda-feira, 6 de maio de 2019

A CHARADA DA «REPOSIÇÃO» DO TEMPO DE SERVIÇO DOS PROFESSORES

A maior parte das pessoas não compreende até que ponto todo este processo está ferido de profunda ilegalidade, que - neste caso concreto - é absoluto sinónimo de injustiça.
Os professores tinham uma carreira, em que podiam progredir de «escalão», mediante a frequência de acções de formação e dos anos de serviço. O processo era mais exigente do que o da generalidade das carreiras da função pública, onde as «diuturnidades», ou seja, os anos de serviço, eram o único critério para se mudar de escalão remuneratório. 
A carreira docente começou a ser atacada com as «reformas» (contra-reformas) de Lurdes Rodrigues, a ministra da educação do governo PS de José Sócrates, detestada pela generalidade dos docentes e por uma grande fatia da população. Neste governo Sócrates, foi feita uma autoritária reforma, que tinha o objectivo claro de dificultar o acesso dos docentes aos escalões superiores da carreira, limitando artificialmente o número de vagas e sujeitando-as a «provas» ou «concursos» que, na verdade, eram ilegais e inconstitucionais no seu desenho. 
Mas, nessa época, havia uma «maioria» circunstancial de apoio ao governo PS, por parte da direita (PSD+CDS), para comprimir o «bolo» salarial nos docentes. 
Com a entrada de Passos Coelho e da «troica», foram congeladas as progressões, mesmo as que já tinham sofrido forte restrição de progressão, sob o ministério anterior de Sócrates/Maria de Lurdes Rodrigues.
O tempo de serviço tem de ser contabilizado na progressão de carreira, não pode ser «congelado» para este fim e manter-se como tempo de serviço, para se atingir a idade da reforma. A manutenção desta situação é absurda e ilegal. 
A brutalidade e ilegalidade flagrante deste processo foi razão importante para rejeição - quase unânime - do governo da «Troica», mesmo pelas pessoas ideologicamente situadas à direita.  
Os socialistas obtiveram um bom score eleitoral, em parte, porque as pessoas tinham a ilusão de que eles iriam repor a legalidade. Mas, na verdade, eles estavam ao serviço da recuperação 100% capitalista da economia, ou seja, de uma continuação da austeridade para os trabalhadores, até perder de vista, e duma abertura ainda maior para os negócios, para a especulação, para os capitalistas usarem mão-de-obra barata, que lhes é oferecida pelo governo.
Não se pense que as pessoas da função pública são uns «mandriões privilegiados», como a descreve insultuosamente a media ao serviço da classe capitalista (esta sim, parasitária, na sua imensa maioria, neste país...). Pense-se antes que são trabalhadores obrigados a «comer o pão que o diabo amassou», como os outros. Acontece que, devido à importância numérica relativa dos empregos na função pública, a melhoria dos salários desta, obriga - a breve trecho - rever as tabelas salariais nos sectores privados.
Os trabalhadores das carreiras técnicas  - em particular - podem assim receber um impulso salarial indirecto, devido à melhoria dos colegas de profissão no sector público. 
Porém, os que querem manter uma estrutura capitalista atrasada - baseada em baixos salários - precisam que o Governo lhes garanta que os trabalhadores da função pública não têm qualquer «privilégio» (como eles dizem!), ou seja, que venham a usufruir de nível salarial semelhante aos seus colegas doutros países europeus.

A presente crise resulta da involução do PS, de um partido dito de «charneira», pelo menos ao nível sociológico, para um partido totalmente refém dos sectores mais atrasados do capitalismo nacional: os que apostam nos salários de miséria, quando são empresários ou apenas parasitas e especuladores dedicados a sacar lucros no curto prazo, com a bolha imobiliária nas grandes cidades, etc...
As estruturas produtivas deste país continuam reféns deste domínio duma classe capitalista, parasitária do Estado, que está no entanto sempre a clamar contra o mesmo... uma «rábula» que já não convence ninguém!
- Mas, isto é possível, porque a classe política maioritária deixou-se capturar completamente pelos seus interesses, ou é composta ela própria por aquele sector da classe capitalista. Ela está, de facto, ao serviço directo deles, como dos grandes monopólios internacionais e da banca e sector financeiro (muito largamente, dominados por capital estrangeiro, de várias proveniências).

Seria interessante fazer-se um estudo aprofundado sobre os últimos decénios do que eu designei como o «complexo neo-colonial português»: como se passou dos governos Sócrates, com um certo patamar no desmembramento do tecido produtivo e da capacidade de desenvolvimento do país, à imposição de políticas de austeridade da troica no governo Passos Coelho, para se chegar, por fim, a uma falsa «redenção» através da famosa «saída da crise». Esta saída deveu-se ao crescimento do turismo, grandemente favorecido (sobretudo a partir de 2011) pela instabilidade e guerra em quase todos os países mediterrâneos, destinos com os quais Portugal competia pelo turismo, em tempos normais. 

O que é facto, é que a reposição das condições de carreira dos docentes são apenas um mínimo, não são privilégio, nem são uma excepção. 
Aquilo que mais enoja é ver os lacaios disseminados por uma série de órgãos de comunicação social, que vão colocando sectores do povo uns contra os outros. Eles, realmente, estão ao serviço da parasitagem, que beneficia das condições de super-exploração. 
Mas, enquanto as coisas forem assim, haverá cada vez menos profissionais de qualidade em Portugal, não apenas na docência, como em todas as outras profissões com formações de longa duração. 
É que os jovens, compreensivelmente, preferem ir para outras paragens, onde as suas capacidades e entusiasmo são melhor remunerados. 
A «drenagem dos cérebros», causa um empobrecimento geral, sorrateiro, silencioso, mas  irreversível e brutal ... 
As instituições, públicas ou privadas, ficam privadas dos melhores deste país. A mediocridade perpetua-se; com ela, o atraso estrutural do país. 

quarta-feira, 9 de janeiro de 2019

PORTUGAL, PARAÍSO FISCAL... PARA ESTRANGEIROS!

        
                                          https://www.youtube.com/watch?v=-9Gg6wGYVcA

          BREVE COMENTÁRIO A FRANCK DEDIEU

Os dados mencionados são correctos. 

O interessante é que o PS não nega absolutamente nada destes factos. Assume-os, como aliás não podia deixar de ser. 
Este afluxo de dinheiro, que Franck refere correctamente, teria de ser canalizado para investimento reprodutivo, para melhorias de infraestrutura, especialmente nas vilas esquecidas do interior, para que houvesse um verdadeiro desenvolvimento sustentável. 
Assim, lamentavelmente, Portugal apenas reforça o seu destino de neocolónia [como a Grécia, a Tunísia, etc, etc] para férias (do tipo Club Med. ou  equivalente) da classe média dos países europeus mais afluentes.