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sábado, 4 de novembro de 2017

O QUE AS PALAVRAS ESCONDEM (DOS CÃES E DOS HOMENS)

Os cães não sabem fingir, ou pelo menos não fingem de forma habilidosa, sistemática e continuada. Os cães são superiores aos homens. Porque um cão é indiferente com indiferença, ou é afetuoso com afeto. Não teatraliza, não faz discurso das suas «boas acções». 
Os homens (espécie humana, entenda-se, os dois géneros e quaisquer outras identidades que quiserem), são permanentemente falsos, são incapazes de sentimentos verdadeiros, a não ser quando possuídos de intensas paixões e apenas nesses momentos. 
Fora disso, são dissimulados, hipócritas, ou cínicos. Eles podem declarar tudo  e o seu contrário, para depois fazerem exatamente como se nada tivessem dito ou prometido. 
Os homens que assim agem são muitas vezes considerados e admirados como sendo os «vencedores» e enquanto que os que têm preocupações éticas, que têm pudor e não exibem a sua insignificância... estes, têm em geral a etiqueta de «perdedores».

Esta sociedade está cheia de pessoas que espezinham os outros e de cobardes que tratam os tiranos com deferência e temor, porque reverenciam o poder. 
Esta sociedade está cheia de filhos e filhas que deixam os pais ao abandono, que querem ignorar que seus progenitores estão a passar misérias. 
Eles repudiam-nos, como se não fosse nada com eles; amanhã, se tiverem filhos, acontecerá o mesmo com eles. 

Uma sociedade assim não pode viver, pode apenas fingir que vive, porque a vida não é a satisfação da matéria, mas é antes uma expressão  do espírito cósmico. 
O fato da vida se ter amesquinhado tanto nas nossas sociedades, é sintoma de decadência. Se esta decadência é irreversível ou não; apenas o tempo (longo) o dirá. 
Mas, de facto, estamos em pleno itinerário de decadência civilizacional. 
As culturas, as civilizações, são como os frutos, começam a apodrecer por dentro. No exterior só se notam as marcas quando já a zona central (os sentimentos, as emoções, o saber emocional, o coração, o cerne) está completamente alterada.

Haverá um renovo espiritual, se a humanidade não se auto-destruir de uma das múltiplas maneiras estúpidas que ela inventou para o fazer... bombas nucleares, catástrofes climáticas, perda acelerada de fertilidade dos solos, contaminação das águas, etc. etc.
Porém, este renovo espiritual não é possível nestas situações actuais de decadência generalizada, neste ocaso civilizacional, nestes tempos realmente obscuros. 

Voltaire inventou a figura do senhor Pangloss. Um filósofo que encontrava sempre razões para otimismo, mesmo no meio das maiores desgraças. Se ele vivesse hoje teria muito maior dificuldade em criar um personagem Pangloss contemporâneo. 
As distopias de Orwell ou de Huxley não parecem tão negativas, se comparadas à  horrenda realidade que está perante nós todos. Mas só alguns conservam ainda alguma sensibilidade para compreender que estão a ser testemunhos de uma tragédia.

A humanidade está em perdição permanente e grave: um sintoma disso é a perda do sentido de empatia com quem sofre; aquilo que se chama de compaixão. 
Não existe esse sentimento tão belo e natural, que se pode ver no mundo dos animais e que até se expressa entre espécies diferentes quando uma fêmea de uma espécie adota e aleita uma cria de outra espécie. 

Muitos outros exemplos existem, no comportamento animal, que mostram claramente que eles possuem um elevado sentido moral, muito superior ao de muitos humanos, que dele têm pouco ou nada. 
Mas, os animais não falam...felizmente!
Se os animais falassem.... seriam exactamente (fora as aparências físicas, claro) como humanos. 
Sabemos isso desde os mitos, lendas e fábulas, em que animais simbólicos são postos a falar, a ter comportamentos e emoções de humanos.