Porque razão os bancos centrais asiáticos estão a comprar toneladas de ouro? - Não é ouro em si mesmo que lhes importa neste momento, mas é a forma mais expedita de se livrarem de US dollars!!
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segunda-feira, 14 de agosto de 2023

REPÚBLICA DOS POETAS nº 7: LUIZ VAZ DE CAMÕES

Podem celebrar o poeta como o genial autor dos Lusíadas, tanto quanto quiserem! 
Eu, pessoalmente não me sinto - nunca me senti - impressionado pela versificação épica! 
Além do mais, não consigo olvidar que para se fazer o exame do 7ª ano dos liceus, tinha-se de saber dividir as orações dos Lusíadas. Era assim nesse tempo, «matam-se dois coelhos de uma cajadada» (pensavam eles): «Ficam a saber fazer análise gramatical e aprendem os Lusíadas».  Na realidade, nem uma coisa, nem outra: Muitos de nós, até os com maior inclinação literária, perante este exercício estúpido e mecânico criavam uma aversão tal, que «contagiava» os Lusíadas!
Felizmente, tinha em casa a recolha integral das Líricas, editadas e prefaciadas pelo Prof. Hernâni Cidade. Foi esse Camões que, desde muito cedo aprendi a apreciar: A beleza do soneto e da redondilha, a subtileza e o engenho dos poemas de amor. 
Noutro tomo da mesma obra estava reunida a dramaturgia, peças de teatro quase completamente esquecidas, hoje. Porém, têm real valor com aquela truculência cómica na linha direta de Gil Vicente.
Tudo isto são impressões pessoais, mas não esperem de mim outra coisa, pois a poesia e os poetas têm sido os meus companheiros. Suas palavras mágicas habitam na minha mente: Isto significa que, às vezes, lembro-me dum verso, ou duma estrofe, a propósito ou despropósito.  
Deixo-vos com Mário Viegas e com Amália Rodrigues, para vos fazer apreciar a música encerrada nos versos camonianos.

«Erros Meus» dito por Mário Viegas


 Erros meus, má fortuna, amor ardente
Em minha perdição se conjuraram;
Os erros e a fortuna sobejaram,
Que pera mim bastava amor somente.

Tudo passei; mas tenho tão presente
A grande dor das cousas que passaram,
Que as magoadas iras me ensinaram
A não querer já nunca ser contente.

Errei todo o discurso de meus anos;
Dei causa [a] que a Fortuna castigasse
As minhas mal fundadas esperanças.

De amor não vi senão breves enganos.
Oh! quem tanto pudesse, que fartasse
Este meu duro Génio de vinganças!

e «Erros Meus...» cantado por Amália Rodrigues (música de Alain Oulman)



«Com Que Voz» cantado por Amália Rodrigues (música de Alain Oulman)

Com que voz chorarei meu triste fado
Que em tão dura paixão me sepultou
Que mor não seja a dor que me deixou o tempo
Que me deixou o tempo de meu bem desenganado
De meu bem desenganado

Mas chorar não se estima neste estado
Aonde suspirar nunca aproveitou
Triste quero viver, pois se mudou em tristeza
Pois se mudou em tristeza a alegria do passado
A alegria do passado

De tanto mal, a causa é amor puro
Devido a quem de mim tenho ausente
Por quem a vida e bens dele aventuro
Por quem a vida e bens dele aventuro

Com que voz chorarei meu triste fado
Que em tão dura paixão me sepultou
Que mor não seja a dor que me deixou o tempo
Que me deixou o tempo de meu bem desenganado
De meu bem desenganado, desenganado



terça-feira, 1 de agosto de 2023

REPÚBLICA DOS POETAS nº4 - Cecília Meireles






                                              https://www.youtube.com/watch?v=rcNpV5vNpt8


A poesia da brasileira Cecília Meireles não se pode filiar em nenhuma escola estética, embora possua traços de simbolismo. Esta inclinação da poeta, talvez se relacione com seu conhecimento de poetas orientais, que traduziu (indianos, chineses, japoneses). 

O poema «Naufrágio» foi posto em música por Alain Oulman e cantado por Amália Rodrigues, num disco* que reúne notáveis expoentes da poesia de língua portuguesa. 

Em «Naufrágio», transparece o sentido trágico da perda inexorável de um referencial, o que é transposto simbolicamente na imagem do navio que se afunda no mar. Mas, este navio simboliza as esperanças da poeta, seus sonhos e esperanças perdidas. 

Mas, a última quadra escapa à fatalidade inexorável. Ela não foi incluída na versão cantada de Amália Rodrigues. 

A última estrofe muda o significado dos versos anteriores, pois a serenidade alcançada («tudo estará perfeito») é resultante de catarse, de ir ao fundo da dor e desespero, para renovar as energias interiores e renascer. Mas, isso é obtido por alto preço: «as minhas duas mãos quebradas».

Um poema muito belo, especialmente quando completo.

                                           Naufrágio


Pus o meu sonho num navio
e o navio em cima do mar;
– depois, abri o mar com as mãos,
para o meu sonho naufragar.

Minhas mãos ainda estão molhadas
do azul das ondas entreabertas,
e a cor que escorre de meus dedos
colore as areias desertas.

O vento vem vindo de longe,
a noite se curva de frio;
debaixo da água vai morrendo
meu sonho, dentro de um navio…

Chorarei quanto for preciso,
para fazer com que o mar cresça,
e o meu navio chegue ao fundo
e o meu sonho desapareça


Depois, tudo estará perfeito;
praia lisa, águas ordenadas,
meus olhos secos como pedras
e as minhas duas mãos quebradas.

Cecília Meireles (1901-1964), Viagem, Lisboa, 1939

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*Além do referido disco, Amália cantou fados com letras de grandes nomes de poesia lusófona. Um dos mais célebres fados é «Fado Português», poema de José Régio e música de Alain Oulman: https://www.youtube.com/watch?v=CFLO_zObeUI

quarta-feira, 6 de julho de 2016

POESIA DO FADO PORTUGUÊS





                                     










TUDO É BELO NESTE ÁLBUM mas, para mim, «Gaivota» é a mais extraordinária e rara combinação de talentos: a letra do poeta Alexandre O'Neill, a música do compositor Alain Oulman, com a interpretação inultrapassável de Amália Rodrigues.


- MINHA SINGELA HOMENAGEM.

FADO*

No vinho procurei o abrigo
Que teus braços recusaram
As doçuras cedo acabaram
Só mágoas guardo comigo

Do peito pisado como uva
Rios de sangue ardente
Tingiram esta alma doente
De negro manto de viúva

Sem carinho, sem ternura
Como viver esta vida
Errante, triste e dura...

Alma pra sempre dorida
Perdida em noite escura
A Morte lhe dê guarida

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* Da recolha de Poemas «Tenção»; inéditos de 1973 -1978 de autoria de Manuel Banet