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quarta-feira, 19 de dezembro de 2018

O VESPEIRO UCRANIANO E A UNIÃO EUROPEIA


vespeiro ucraniano já dura há demasiado tempo. Uma junta tomou o poder por um golpe de Estado, infundiu o terror na população russófona dessa ex-república soviética, desencadeou de facto a separação tanto da Crimeia (com um processo pacífico de referendo, primeiro no sentido de sair da Ucrânia, seguido de outra consulta para entrar na Federação Russa), como nas províncias separatistas do Don (Donetsk e Lugansk) onde a resistência generalizada da população, aliada com forças militares separatistas, permitiu aguentar este tempo todo uma situação de confrontos e provocações por parte do poder de Kiev e seus batalhões de milícias neo-fascistas. 

O incidente envolvendo barcos de guerra da marinha ucraniana no estreito de Kerch (águas territoriais russas) em Novembro de 2018, foi claramente uma manobra ordenada por Poroshenko, o presidente ucraniano do regime suportado pelos EUA e seus súbditos da NATO. 
Poroshenko tem estado a atiçar a guerra, porque, segundo os acordos de Minsk, a Ucrânia é obrigada a organizar eleições nos primeiros meses do próximo ano e as sondagens (de institutos pró-ocidentais)  dão a Poroshenko um nível de popularidade da ordem de 8%. Por isso, a sua salvação seria a declaração de uma guerra, quer com a Rússia, quer com as Repúblicas separatistas. Só assim teria possibilidade de adiar as eleições «sine die», de escapar ao veredicto das urnas. 

A desinformação, no Ocidente, sobre o que se passa na Ucrânia, torna extremamente difícil um debate sereno nos países da NATO. Isto, admitindo mesmo que se trate de pessoas minimamente respeitadoras dum pluralismo político, devido ao black-out informativo e à distorção das informações pela media. 
Acontece que quase ninguém admite estar mal informado sobre um assunto, ora as informações que quase todos recebem são apenas formas encapotadas de propaganda de um dos lados... 
Nós todos, no Ocidente somos matraqueados pela propaganda disfarçada de «informação», que pinta sempre a Rússia como o «Reino do Mal», a força agressora, ameaçadora da estabilidade e dos processos democráticos, etc. 
Além de ser típico dos imperialistas e seus vassalos de declarar os opositores como fautores daqueles crimes que, na verdade, são apanágio deles próprios, esta barragem de mentiras (como dizia Goebels, ministro de Hitler, «uma mentira contada mil vezes, soa a verdade») tem a função de ostracizar todos os que querem introduzir dados objectivos no debate. São neutralizados , nos «democráticos» países ocidentais, como sendo «partidários» de Putin. 

A guerra é um negócio para grandes empresas do armamento e também é um meio para os poderosos se manterem no poder, pelo reflexo de medo nas populações, face ao inimigo (real ou imaginário). 
Na época da Primeira Guerra Fria (1947-1989), a situação de medo permanente fazia com que não fosse possível - nos EUA e muitos países do Ocidente - fazer-se um debate público com elementos críticos da política atlantista. 
Tais elementos eram logo acusados de «fazerem o jogo dos soviéticos» e isto, mesmo quando não se podia, por suas posições passadas e presentes, ter suspeitas de que tivessem simpatia pelo comunismo! 
Agora, o «reflexo condicionado» foi reactivado (o inimigo soviético passou para russo), sendo que a concentração dos media em muito poucas mãos, torna praticamente impossível que o debate sobre a guerra e a paz tenha condições de acontecer (o que tem havido, são «debates» entre aqueles que estão todos basicamente do mesmo lado!). 
A sociedade e a cidadania do «ocidente» são portanto mantidas no limbo, numa menoridade mental propositada, são interditas na prática de debater as grandes questões. Somente lhes é permitido debater «assuntos de sociedade» e estes, de maneira falsa, artificialmente  empolada, como a sexualidade, por exemplo.

A maior parte das pessoas não possui um grau de informação suficiente, para perceber que o mundo de hoje está verdadeiramente interligado. Senão, teriam compreendido (entre muitas outras coisas), que a crise dos refugiados, vindos do Norte de África e do Médio Oriente, foi desencadeada em resultado da guerra levada a cabo pelas forças armadas dos países da NATO (caso da Líbia), ou pelas forças djihadistas (na Síria) que recebiam todo o tipo de apoio do Ocidente e regimes árabes «amigos» (os mais reaccionários, por sinal).

Hoje em dia, a austeridade que é erigida em política oficial da União Europeia aplica-se apenas aos pobres, aos trabalhadores, aos que estão dependentes do «Estado social». 
Esta austeridade cessa, milagrosamente, logo que se trata de reforço de armamento e de tropas, de construir forças armadas capazes de enfrentar inimigos poderosos (leia-se a Rússia, claro) e constituir o pilar europeu da NATO, com maior «autonomia» e maior participação  financeira dos países europeus.

Entretanto, em Portugal, por exemplo, os salários da função pública estão praticamente congelados desde antes da grande depressão de 2008. O efeito deste congelamento sobre a população é dramático, pois o seu poder de compra desceu para cerca de metade. Nestes 10 anos, a inflação foi sistematicamente sub-avaliada pelo governo e pelos organismos oficiais. 
O nível económico dos reformados passou de mau, a muito mau, numa vasta maioria: não houve actualização das pensões de reforma, mas antes um subtrair do poder de compra das mesmas, por vários mecanismos, incluindo impostos e taxas.

A minha sugestão é que as pessoas pensem, quando lhes vierem com discursos ocos sobre a «Paz e a Fraternidade», típicos desta quadra natalícia, que os gastos de Portugal em armamento e material militar e com reforços de pessoal, tudo somado, se fossem aplicados nos ordenados e pensões, iriam devolver o poder de compra aos trabalhadores e reformados portugueses. 
Perante um povo dócil e conformado, o bem estar económico dos 90% não é sentido como prioridade pelos poderosos (altas patentes militares, políticos, empresários). Mas sem um retomar do poder de compra de 90% da população, é impossível o crescimento da economia a longo prazo. A bonança do turismo é temporária; numa crise, que não tarda a chegar, será anulada. 

O que é que isto tem a ver com a Ucrânia? Obviamente, a instabilidade causada pela NATO, nas fronteiras da Rússia, tem como efeito que os povos são chamados a «fazer sacrifícios perante a ameaça». 
Mas não devíamos nós estar antes mobilizados para varrer as maiores ameaças, os industriais do armamento, os generais da NATO, os governos lacaios do grande capital? 
Esta casta toda não hesitará em arriscar a nossa pele... além de pôr as nossas economias a saque, sob pretexto de lutar contra os tais «inimigos» que não são os nossos, mas apenas deles e dos seus chefes?