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terça-feira, 22 de junho de 2021

[Wagner, Vivaldi] NAVIO-FANTASMA - TEMPESTADE

 


O sobrenatural como símbolo pode ser libertador, não enquanto mito que subjugue a mente, ou que esteja conectado com uma visão fatalista. 

Percebi que o que há de delicioso nas histórias de fantasmas, é que elas nos dão um calafrio no momento mas, ao mesmo tempo sabemos que é ficção, pois estamos em segurança, lendo ou vendo ou ouvindo essa «estória de dar arrepios». 

Certamente o fantasma invoca a morte. Mas,  se temos medo da morte, não é do simples facto de um dia desaparecermos. Pelo menos, não duvidamos que desaparecemos enquanto ser material, algo que sabemos inevitável, a partir do momento que crescemos. A morte suscita medo, pelo seu lado desconhecido. 

Este aspeto, o desconhecido, manifesta-se no que está para além do mundo corriqueiro, do dia-a-dia vulgar. A narrativa de terror precisa, não apenas do perigo mortal, mas também de algo insólito, estranho, sobrenatural. 

O fantasma é uma criatura do outro mundo que vem visitar-nos neste mundo. 

O fantasma...um ser real, ou uma alucinação, um efeito de ótica ou ainda, uma  fantasia da nossa mente? 

As histórias de navios-fantasmas, que continuam a vogar pelos oceanos, durante decénios, sem tripulação lá dentro, pois morreu  até ao último homem, misteriosamente, tragicamente, são narrativas romanceadas de situações que ocorreram na realidade. 

Não é difícil um navio continuar a flutuar durante algum tempo, sem ninguém para cuidar dele. Que isso tenha acontecido variadíssimas vezes durante a história da navegação, não nos pode surpreender. O que é mais da ordem do fantástico, são as lendas em que o navio surge durante as tempestades,  periodicamente, do nada, do nevoeiro, como um monstro oceânico imponente. 

Simbolicamente, o «navio-fantástico-fantasma» resume os medos (fobias) que podem nos habitar, pessoal e socialmente: O medo da morte, dos «mortos-vivos», dos fantasmas que poderão estar dentro do navio fantasma, o medo da natureza indiferente, do destino severo, vingativo, o castigo da não-sepultura, pela transgressão das leis dos homens ou -sobretudo- dos Deuses.

Muitas histórias de navios-fantasma relacionam-se com epidemias misteriosas que dizimaram toda a tripulação. Neste século de histeria pandémica, é provável que estas antigas histórias sejam evocadas, recicladas e atualizadas.

A famosa ópera «Die fliegende Hollaender/ The Flying Dutchman» de Wagner retoma o mito do navio-fantasma. 

Abaixo, a abertura da ópera: 

                            

Mas, na época barroca, já existia um subgénero de música descritiva, a «tempestade no mar», abaixo exemplificada no concerto para flauta de Vivaldi. Note-se, que ele não foi o único na sua época, a utilizar o tema da tempestade marítima!  Aliás, Vivaldi também escreveu outro famoso concerto para flauta «La Notte» RV 439 onde um dos movimentos se intitula «Fantasmi», fantasmas.