Sua originalidade faz dele, a meu ver, o poeta eternamente jovem, eternamente atual. É um fervoroso católico, mas sua religião é (também) a do amor à sua esposa e à sua terra, Arrábida.
É o que mais transparece da leitura da sua obra poética, que - em grande parte - foi publicada postumamente.
Assinale-se o facto de também ter sido um apaixonado professor de Português; os seus escritos pedagógicos têm valor próprio, são reflexões do transmissor da paixão pela literatura e pela poesia, às jovens gerações.
Morreu cedo (Vila Nogueira de Azeitão, 10 de abril de 1924 — Lisboa, 7 de fevereiro de 1952), de tuberculose. Porém, para sempre, o poeta vive nas palavras vibrantes e radiosas de vida nos seus poemas. E sua palavra soa através das paisagens maravilhosas da Serra da Arrábida, que ele soube amar e dar a conhecer.
Ver: SEBASTIÃO DA GAMA, O POETA DA ARRÁBIDA: documentário da RTP
O agoiro do bufo, nos penhascos,...
foi o sinal da Paz.
O Silêncio baixou do Céu,
mesclou as cores todas o negrume,
o folhado calou o seu perfume,
e a Serra adormeceu.
Depois, apenas uma linha escura
e a nódoa branca de uma fonte antiga :
a fazer-me sedento, de a ouvir,
a água, num murmúrio de cantiga,
ajuda a Serra a dormir.
O murmúrio é a alma de um Poeta que se finou
e anda agora à procura, pela Serra,
da verdade dos sonhos que na Terra,
nunca alcançou.
E outros murmúrios de água escuto, mais além :
os Poetas embalam sua Mãe,
que um dia os embalou .
Na noite calma,
a poesia da Serra adormecida
vem recolher-se em mim.
E o combate magnífico da Cor,
que eu vi de dia :
e o casamento do cheiro a maresia
com o perfume agreste do alecrim ;
e os gritos mudos das rochas sequiosas que o Sol castiga
--passam a dar-se em mim .
E todo eu me alevanto e todo eu ardo.
Chego a julgar a Arrábida por Mãe,
quando não serei mais que seu bastardo.
A minha alma sente-se beijada
pela poalha da hora do Sol-pôr ;
sente-se a vida das seivas e a alegria
que faz cantar as aves na quebrada ;
e a solidão augusta que me fala
pela mata cerrada,
aonde o ar no peito se me cala,
descem da Serra e concentrou-se em mim.
E eu pressinto que a Noite, nesse instante,
se vai ajoelhar ...
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Ai não te cales , água murmurante !
Ai não te cales , voz do Poeta errante !
-- se não a Serra pode despertar .
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Pelo sonho é que vamos
Pelo sonho é que vamos,
comovidos e mudos.
Chegamos? Não chegamos?
Haja ou não haja frutos,
pelo sonho é que vamos.
Basta a fé no que temos.
Basta a esperança naquilo
que talvez não teremos.
Basta que a alma demos,
com a mesma alegria,
ao que desconhecemos
e ao que é do dia a dia.
Chegamos? Não chegamos?
– Partimos. Vamos. Somos.
1 comentário:
Ver os artigos desta série, «REPÚBLICA DOS POETAS», que abrange a poesia escrita em português.
Número anterior: https://manuelbaneteleproprio.blogspot.com/2023/08/republica-dos-poetas-n-7-luiz-vaz-de.html
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