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sexta-feira, 21 de junho de 2024

SOBRE A EXTREMA-DIREITA EUROPEIA, NAS RECENTES ELEIÇÕES

 Quem está com o nariz sobre o assunto, frequentemente acaba por errar o diagnóstico, por estar demasiado focalizado em detalhes que são importantes, sem dúvida, mas que colocam de fora a realidade mais geral da dinâmica da sociedade. 

Quer queiram quer não,  sociedade está dividida em classes. Estas, têm antagonismo natural, visto que seus interesses fundamentais são contraditórios. Isto não significa que a classe dos oprimidos não se engane nas causas para as suas condições cada vez mais miseráveis e, particularmente, para a sua destituição da «cidadania»: Um conceito que apenas se aplica - em pleno - para a classe dominante, a burguesia, para os não proletários, para aquelas pessoas «naturalmente» candidatas ao poder (ou como auxiliares do mesmo).

A escola desempenha um papel, pois está sempre na situação ambígua de afirmar valores «republicanos» de igualdade, face às diversas etnias, às diversas origens sociais, por um lado. Mas, por outro, todo o sistema educativo é uma enorme máquina de selecionar os melhores serventuários do sistema.
Ou seja, está - em teoria - a proporcionar oportunidades para os destituídos (os seus filhos) se emanciparem mas, ao mesmo tempo, está criando e reproduzindo uma nova geração de serventuários, que não questionam sequer a classe dominante, seja porque pertencem a esta ou, mais frequentemente, porque pertencem a extratos que estão na orla do poder e desejam ascender a postos de prestígio. 
Os bons alunos reproduzem - inconscientemente, na maioria dos casos - os passos levados a cabo, na geração anterior, pelos seus pais. 
Por outro lado, os destituídos cedo reconhecem encontrar-se perante a falsa igualdade, de que a promessa de igualização das classes, através da educação que lhes é proporcionada. Ela está falseada à partida, pois o contexto social em que crescem as crianças, condiciona muitíssimo seu percurso escolar.
Na realidade, a chamada «escola republicana» é uma fábrica de fracassos, de excluídos. Aqueles mesmos que irão desempenhar as tarefas mais mal pagas e menos prestigiosas, de que o sistema, no entanto, precisa para se auto perpetuar.
É evidente que, se tivermos um pouco de empatia para com tais membros das classes ditas «inferiores», podemos compreender a sua revolta. 
Mas, isso não significa que eles próprios identifiquem corretamente o seu inimigo. Nem, tão pouco, que as soluções pelos partidos xenófobos e de extrema-direita, sejam as acertadas. 
Quer falemos de «pessoas de cor», de «gerações de filhos dos emigrados», ou de membros autóctones da classe operária, todos eles sempre foram exteriores ao padrão de cultura da escola. Estamos a falar daqueles que estão destinados, na imensa maioria, a preencher o papel social que tiveram os seus progenitores (não existe «ascensor social» para eles). Isto, faz parte da base do funcionamento concreto da sociedade de classes existente. 

O problema que se coloca em relação aos partidos de extrema-direita, semelhantes em xenofobia a vários partidos do sistema, é que as suas direções têm sabido usar, com sucesso, a insatisfação dos excluídos do sistema para se guindarem ao poder. A serem os novos senhores da República, os novos capatazes do poder do dinheiro. 
Se conseguirem, serão uma nova versão de burguesia reacionária, que em vários períodos da História, tomou conta das «democracias» burguesas, perante a desmoralização destas, devido ao facto dos detentores diretos do poder político terem perdido toda a credibilidade. Tão abjectos, tão desavergonhados se comportaram eles, que se tornava urgente (para importantes setores da burguesia industrial) a retirada dessa fração da burguesia dos comandos do poder, para a substituir por outra.
Essas guinadas para a extrema-direita, no passado, vieram evitar que  tal situação se tornasse revolucionária. O descontentamento e a indignação perante a perda de direitos tem levado, em vários momentos da História, os destituídos a tomar as coisas em suas mãos e correr com os parasitas que ocupavam o poder.

É este o contexto de fundo das derrotas dos partidos de centro-direita e do centro-esquerda no xadrez político-eleitoral europeu. A extrema-direita aproveita, como seria de esperar. Mas, não se pode ter qualquer ilusão de que ela poderá servir genuinamente os interesses do povo, ela apenas utiliza o seu descontentamento.

segunda-feira, 19 de novembro de 2018

NÓS, OS PEQUENOS DEUSES (Nº2)

No primeiro texto, a minha crítica centrava-se mais numa perspectiva antropológica e ecológica, da insustentabilidade do ecossistema global na idade do antropoceno. 
Hoje, porém, irei centrar mais a minha crítica na lógica própria do modo de produção capitalista. 
Ao fazer esta análise crítica, desejo pôr em evidência que a própria lógica do capitalismo é condutora, inevitavelmente, à anulação de suas condições de funcionamento. 
Com efeito, a lógica do capitalismo é a da acumulação: acumulação de capital, sob suas diversas formas, para ele se reproduzir, originando mais capital. 
É um sistema que precisa de consumir cada vez mais e que não pode prescindir de maximizar o lucro, a cada etapa e por cada ator do processo. 
É esta a lógica intrínseca: os atores que não saibam ou possam assumir esta mesma lógica, acabam - mais cedo ou mais tarde - por ser varridos do jogo, por outros com mais agressividade, mais tenacidade, maior apetência para o lucro, etc.  

A lógica do capital penetrou todos os «poros» da sociedade, não havendo realmente nenhuma classe, nenhum grande sector da sociedade, que esteja disposta a coletivamente reivindicar outra forma de organizar a produção, o consumo e a própria a vida. 
Os trabalhadores reivindicam mais salário ou melhores condições de trabalho, não a abolição da sociedade baseada no trabalho, enquanto forma de exploração.

As disfunções que se observam têm muitas causas próximas, mas existe uma causa fundamental, a meu ver: a ideia generalizada de que a posse, a propriedade, a riqueza material, consiste na forma de se obter felicidade e segurança. 
Isto significa que as pessoas sentem justificação para fazer tudo com vista a obter essa tal riqueza material. 
Além disso, não limitam nunca a sua acumulação de riqueza, tal como o próprio sistema capitalista, que moldou suas mentalidades: «quanto mais, melhor; dinheiro, nunca é demais»... 
A valorização da acumulação é muito típica do capitalismo em todas as suas etapas, não apenas da presente. Sem essa procura constante de acumulação de riqueza e de poder, não haveria impulso inicial para construção das empresas pelos empresários, nem para uma total identificação à lógica da empresa, dos seus quadros médios e superiores. 

O espírito acumulador estende-se a todos os atores, desde os trabalhadores realizando as tarefas mais humildes, até ao topo da hierarquia social e empresarial. Para a generalidade das pessoas, não possuir emprego, ou outro meio de gerar dinheiro, de modo a que possam participar na sociedade de consumo, constitui a maior ameaça, o maior medo. 

Como vimos no artigo anterior, a questão principal que se coloca, é em relação à sustentabilidade ecológica de um tal sistema. Para o «bom» funcionamento do capitalismo é preciso sempre um «crescimento económico», seja lá como for. 
No século XIX, durante a primeira fase da revolução industrial, havia muitos recursos inexplorados, tanto energéticos como outras matérias primas, muitas delas vindas das colónias, possuídas por potências europeias. 
Além disso, não havia escassez de mão-de-obra disponível para ser explorada.
Aquando da segunda etapa, do «Fordismo» e do «Toyotismo», era essencial que os operários tivessem uma participação efetiva no consumo dos produtos da sociedade industrial, pelo que tiveram acesso a confortos e bens materiais, anteriormente reservados apenas aos extratos mais ricos (automóveis, eletrodomésticos, etc).
O capitalismo, presentemente, na sua fase de financeirização extrema (predomínio absoluto dos bancos sobre os outros ramos da atividade económica, subordinação do capitalismo industrial ao capitalismo financeiro), com a diminuição ou a impossibilidade de geração de valor,  recorre a todas as artimanhas para empurrar as pessoas a consumir a crédito, muito para além das suas verdadeiras possibilidades, até à insolvência. 
O mesmo se passa com os Estados, com as finanças públicas, empurradas para uma dívida cada vez maior. 
Mas esta dívida é, no fundo, um imposto diferido, um imposto que será cobrado sobre a sociedade em geral, de uma ou outra forma, no futuro. Este esquema perpetua-se porque os políticos querem manter-se no poder e as pessoas não questionam esse poder, se tiverem mais (ou a ilusão de mais) no imediato.
Portanto, as condições de funcionamento «normal» de uma sociedade e economia capitalistas são insustentáveis em si mesmas, visto que não existem recursos infinitos, nem apetência ou capacidade infinita de os consumir. As contradições vão-se agudizando, em relação à sustentabilidade ecológica, mas também entre classes sociais: Observa-se, nestes últimos 20 anos, a acumulação cada vez maior de riqueza nas mãos duma pequena oligarquia, perante um número cada vez maior de destituídos, de marginalizados do processo de consumo.
A mudança torna-se inevitável; mas tanto pode ser para melhor, como para pior. Não existe determinismo na evolução das sociedades.