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sábado, 2 de fevereiro de 2019

ALEGORIAS DA VERDADE




                                     
Provavelmente muitos portugueses - e não poucos estrangeiros que visitaram Portugal - reconhecem a famosa estátua, visível da rua do Alecrim, a caminho do Chiado, mais precisamente, no Largo Barão de Quintela. 
A célebre estátua é da autoria do grande escultor António Teixeira Lopes. 
Em primeiro plano, a Verdade, meia desnudada; em segundo plano Eça de Queiroz, que olha para ela e sustenta os seus panejamentos. 
A razão de ser desta composição relaciona-se com o lema do próprio Eça de Queiroz: «Sobre a nudez crua da verdade, o manto diáfano da fantasia». Era esta a definição do seu ideal estético, enquanto romancista da escola realista. 
Uma notícia descritiva detalhada pode ser consultada aqui.

Embora também dispense as roupas, a Verdade do quadro de Gérôme é bem diferente, no carácter:

                                       

Jean-Léon Gérôme (1824-1904), designou a sua composição de «A Verdade Saindo de um Poço Para Castigar a Humanidade». 
A obra data de 1896, da época do escândalo Dreyfus, um oficial do exército francês condenado - com base em falsas provas - por espionagem a favor da Alemanha. 
O dito oficial, de origem judaica, suscitou simpatias em muitos intelectuais, que viram nessa sentença a expressão do carácter anti-semita e reaccionário dos generais do Estado-Maior. 
A Verdade grita, indignada, furiosa, segurando uma chibata com a qual vai fustigar os que calcam aos pés a Justiça...
O facto da Verdade estar a sair de um poço, tem a ver com uma frase atribuída a Demócrito, «da Verdade não sabemos nada, pois ela está no fundo dum poço».

Afinal de contas, tanto Eça como Gérôme estiveram ao serviço da Verdade: não só eram ambos da escola realista, como ambos defenderam a inocência de Dreyfus e denunciaram a infame decisão do tribunal militar. 
Continuam, para além de suas qualidades artísticas próprias, a ser bons exemplos de coragem intelectual.