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quarta-feira, 17 de maio de 2017

EPIGENÉTICA - O NOVO PARADIGMA

Pergunto-me algumas vezes por que motivo alguém precisa de uma narrativa que a «desculpabilize» pelos seus fracassos pessoais. Já deve ter acontecido consigo que alguém lhe venha alegar traumas de infância ou relacionamentos infelizes na vida adulta, para «justificar» as suas falhas, a sua incapacidade em enfrentar as dificuldades da vida. 
De facto, muitas pessoas gostam de ser «assistidas», como se se tratasse de pessoas padecendo de doença, que precisavam de cuidados de saúde.  
Poucas pessoas assumem a sua própria «governança» e se auto-programam no sentido de serem aquilo que querem ser. 

Deparei-me com um vídeo, que coloca muitas perguntas, além de que vai buscar elementos de compreensão a um ramo da ciência biológica que eu tenho particularmente acompanhado, ao nível de artigos de divulgação. Como biólogo, tive o privilégio de trabalhar em estágio num laboratório dedicado, nos anos 80 do século passado, à expressão dos genes. Hoje em dia, os trabalhos dessa época seriam classificados como «epigenética». Simplesmente, o vocábulo não tinha ainda sido inventado ou não lhe era dado o significado que é dado hoje.

Acredito que existe algo de muito fundamental no «apoderamento» (empowerment) que faz com que o nosso Eu sub-consciente se encarregue de muitos dos comportamentos, visíveis ou não. A atitude interior, por oposição ao «teatro social» é aquilo que impulsiona as pessoas, não pela decisão do seu Eu racional, mas impulsionadas por várias forças. 

O Dr. Lipton tem razão - com certeza - ao apontar os programas comportamentais que estão «engramados» no nosso cérebro, que foram adquiridos entre os 0 e 7 anos. É um reportório de base, que todas as crianças adquirem num estado de recetividade extraordinária, semelhante à hipnose. Os muito pequeninos fazem por instinto, aprendem por instinto, tudo neles é instinto... são «bolinhas de afecto». 
Por isso, não me custa aceitar que estejamos todos programados socialmente, a um nível profundo, pela vivência na tenra infância. Também concordo com o entrevistado em relação ao papel dos genes como «plantas do edifício» (blue prints) ou seja, algo que contém as informações para construir edifícios ou pequenas máquinas maravilhosas (as proteínas) as quais serão ativas, a vários níveis, nas células e no corpo. 
Mas os genes não são ativos ou inativos: aqui reside o cerne da viragem de um paradigma para outro, ou seja... o sistema é que «decide» transformar essa potencialidade, o gene, em algo que irá ter expressão no corpo. Assim, nós já não estamos sujeitos à fatalidade do gene, o gene que «determina» uma doença ou uma característica não é - por si só - determinante de coisa nenhuma. 

Isto era sabido, evidentemente, desde o início da genética, nas primeiras décadas do século XX (como descrevo no livro «Génese e Genes»). Porém, a formulação «popular» acabou por tomar conta da forma de pensar dos médicos e cientistas e estes acabaram por raciocinar - e portanto também por agir - «como se» fossem os genes os protagonistas.

A possibilidade de um indivíduo moldar muito do seu ambiente próximo, aproveitando-o bem ou menos bem, traz como consequência que somos largamente responsáveis pela nossa saúde, pelo nosso estado, por tudo o que nos acontece. 
A predisposição para uma determinada afeção pode existir pelo hábito, pela atitude relativa ao complexo de variáveis ambientais que nos influenciam ou não. 
Por exemplo, se tivermos um comportamento responsável em relação ao nosso corpo, comendo comida saudável, equilibrada, fazendo exercício físico adequado à nossa pessoa e às circunstâncias em que nos encontramos... a probabilidade de cairmos doentes, mesmo de doenças transmitidas por agentes biológicos (vírus e bactérias...) diminui enormemente, em relação à média da sociedade. 
Isto deve-se ao facto de que - na sua grande maioria - os comportamentos dominantes e com interferência no estado de saúde geral são largamente negativos, irracionais, pulsionais... 

Também acredito que uma mudança de paradigma tenha implicações no modo como nos relacionamos socialmente; um grande empenho coletivo em realizar determinado objetivo, por estranho que pareça, é mais importante que a justeza teórica, racional, do mesmo. 
Infelizmente, quem nos manipula usa isso para o pior. Os demagogos servem-se das multidões, do desejo inconsciente de homens e mulheres, em serem tratadas como crianças e conduzidas a «acreditar» em algo, com toda a força, assim como as crianças o fazem em relação aos seus pais. 
Note-se que - na criança - isto é lógico e biológico: ela não tem dúvidas de que os seus progenitores querem o seu bem, o que - em geral - é o caso. Por isso, faz todo o sentido para a sua própria defesa, para a sua sobrevivência. 
Todas as pessoas têm um lado de criança, todas têm nostalgia de quando eram cuidadas pela mãe e se alimentavam tanto do seu amor, como do leite materno.

As proibições e os medos no indivíduo adulto são oriundos dum «superego» que lhes é incutido desde pequeno, com programas comportamentais altamente supressores da criatividade, da liberdade e da autonomia individual. 
Mas o que é importante para a sociedade em geral é justamente a capacidade dos indivíduos acrescentarem algo de original, de serem criativos. 
Para que prevaleça realmente este objetivo na educação, a sociedade deverá ser mais baseada na entre-ajuda e na fraternidade, como uma grande família (uma visão comunista autêntica, que nada tem que ver com o bolchevismo). 
No entanto, ela tem os seus gérmenes agora, pois as crianças são propensas a comportamentos de partilha e de entreajuda, de compaixão, de empatia, também em relação a animais, não apenas aos seus colegas... 
O que se chama agora de educação não é mais do que um amestrar, que coloca vendas nos olhos das crianças e adolescentes, fazendo deles dóceis e condicionáveis, para serem «bons» trabalhadores nesta sociedade em que 99% tem de obedecer a um ou vários patrões... 
Dentro desta sociedade, a criatividade não interessa; apenas a submissão é premiada, apontada como modelo: a reprodução de ideias erradas, mas que servem os propósitos das «elites», são constantemente papagueadas, nas escolas e nos media. 

Neste contexto, sair da «matrix» pode custar esforço e coragem, pois implica um risco real. No mínimo, implica uma certa solidão ou isolamento, devido à incompreensão no meio circundante... e nós sabemos que precisamos uns dos outros, que não podemos viver, senão em sociedade.

A possibilidade de vivermos de acordo com os nossos sonhos profundos existe, no entanto.
Todas as coisas que queremos realmente, nas nossas vidas acabam por realizar-se, mas não do modo como fantasiámos que iriam acontecer. 
Eu verifico isso aos 62 anos, na minha vida pessoal: tudo o que desejei profundamente realizou-se; tudo o que eu próprio sou agora, teve sua génese na minha própria existência, numa vivência que foi largamente influenciada pelo meio em que mergulhei, em várias circunstâncias e pela minha resposta, em cada caso, a esses desafios. 
Por outras palavras, construí-me a mim próprio. Isto não tem nada de extraordinário; é realmente comum a todos. 

Ao fim e ao cabo, o fator principal é a nossa intenção deliberada, aquilo que é nosso profundo desejo de realização. Este é um fator muito mais potente do que imaginamos. 
A determinação dos genes é muito relativa. Como biólogo geneticista eu sei isto de longa data e tenho surpreendido pessoas leigas nesta ciência ao lhes dizer isso mesmo...
  

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