Como qualquer novidade tecnológica, estes sistemas de busca e processamento na Rede, através de algorítmos têm sido muito publicitados, têm-lhes sido atribuídos poderes miraculosos, a capacidade infinita de processar dados, «inteligência» muito acima da simples humanidade... Porém, realisticamente, tem servido, no quotidiano, para muitas coisas, por ex.: Os trabalhos de casa de alunos, fazer uma revisão extensa e completa sobre um tópico que nos interesse...
Algo que me parece muito interessante é o decifrar de antigas formas de escrita, de cuja «chave» nos falta (ou falta aos cientistas). Com o auxílio de IA, pode-se decifrar essas linguagens escritas e - a partir deste ponto - ler textos inscritos na pedra, em tábuas de argila, ou noutro suporte.
A interpretação, usando os algorítmos de IA, de qualquer coisa que saia fora da experiência corrente deverá - porém - ser vista com cuidado. Com efeito, a IA processa apenas informação que está estocada em qualquer ponto da Rede, acessível pela Internet. Se houver um número vasto de artigos científicos que interpretam um fenómeno, basicamente da mesma maneira, creio que um relatório de «IA» vai enfatizar estes pontos de vista maioritários, talvez mencionando pontos de vista divergentes, mas sem verdadeiramente fazer a avaliação crítica dos mesmos. Com efeito, a estatística não nos diz nada sobre a correcção ou incorrecção de uma dada hipótese, de uma dada teoria.
Do universo da IA está ausente o aspecto criativo. Compreende-se, pois a aventura criativa é justamente aquela em que se fazem hipóteses mais ou menos «anormais», fora da «média estatística». A criatividade, seja ela em que domínio for, parece-me continuar a ser exclusividade humana. Tanto nas ciências, como na criação literária, as capacidades que se devem conjugar situam-se a vários níveis. Desde o nível do conhecimento de dados em bruto, até ao nível da discussão sobre teorias concorrentes, sabendo quais os argumentos avançados pelos defensores de uma, ou de outra teoria. Nestes casos, a mente humana tem de exercitar o seu espírito de análise, de síntese, de crítica, de intuição, etc... Todas estas componentes têm de estar integradas, não somente em termos teóricos, como em termos de vivido.
As tarefas repetitivas, enfadonhas, poderão ser reservadas para a IA. Aqui, será importante para os utilizadores saberem como tirar partido da "ferramenta" em suas mãos. Com efeito, de acordo com a forma concreta como é formulada uma pergunta, assim a pesquisa e a resposta de IA, serão orientadas. Mas, penso que é algo que se pode dominar, após alguns meses de treino de utilização de IA.
Esta utilização da IA, permitiria utilizar as funções nobres em exclusivo para o cérebro, as funções que sempre foram apanágio da mente humana: A criatividade, seja em domínios científicos ou artísticos; ou a interacção com o mundo observado: A prova de uma teoria, não está na correcção formal do sistema de equações usado, mas nas observações e experiências controladas, permitindo confrontar o(s) modelo(s) proposto(s), com a realidade.
A crença das pessoas em «virtudes supranaturais» de máquinas ou artefactos («Deus ex Machina») vai continuar, durante algum tempo. Isso irá dar oportunidade aos que controlam este mundo, de transformar algo que tem potencial libertador e potenciador da produtividade humana, em algo opressor: Com efeito, se as descobertas e inovações fossem postas ao serviço da humanidade inteira, haveria um efeito direto positivo na vida das pessoas comuns. Por exemplo, a produtividade dos trabalhadores, tendo aumentado devido às transformações tecnológicas, poderiam receber melhor salário, trabalhando as mesmas horas que antes, ou até menos horas. Ficariam assim com mais tempo livre para se dedicarem à família, ao lazer, à educação e à cultura... Mas, isso seria um problema para a classe patronal. Esta não teria indivíduos submissos, temerosos, etc... Indivíduos incapazes de resistência face ao arbítrio. Neste mundo de classes antagónicas, onde a classe dominante dispõe da propriedade e uso monopolístico dos meios de produção, a prioridade do patronato vai ser de transformar em seu em favor qualquer inovação ou aplicação, para que esta aumente o seu poder e o controlo sobre as classes dominadas.
A automatação, a robotização, a utilização de IA, etc... seriam bem-vindas numa sociedade onde os recursos e a produção estivessem repartidos de maneira equitativa. Tais inovações têm um potencial libertador, mas, para ser efetivo, é preciso que a sociedade - no seu todo - se organize de forma não opressiva, que a hierarquia não seja de poder, mas somente de função, em que a decisão se distribua por aqueles/as a quem um determinado processo, trabalho, ou tarefa, dizem respeito. Pressupõe o controlo dos trabalhadores, e de todo o povo, sobre a utilização daquilo que é colectivo. Mesmo guardando a propriedade privada em grande parte dos meios de produção, esta não poderá ser um meio de exerceer poder sobre a sociedade em geral. Ela terá de estar a produzir segundo o interesse coletivo. A propriedade intelectual não poderá ser instrumento de controlo e extorção sobre os outros, terá de haver justiça em remunerar os inventores, mas não tolerar que se apropriem de «bens intelectuais» como forma de capital, reservando para si os «direitos» de propriedade.
Não há nada que o espírito humano não possa inquirir; não existe nenhum problema que esteja para além do alcance dos humanos.
O Universo, que tudo produz e destroí, dará continuidade à aventura da tecnologia humana, se esta não for dominada por sociopatas e psicopatas (os «vencedores» nesta sociedade). Estes, são pessoas sem nenhuma empatia, sem sentimentos de solidariedade, centradas em si próprias e no seu poder.
Mas, cabe a todos nós, nos apropriarmos das ferramentas (físicas e conceptuais), que nos podem libertar.