Muitas pessoas aceitam a situação de massacres de populações indefesas em Gaza e noutras paragens, porque foram condicionadas durante muito tempo a verem certos povos como "inimigos". Porém, as pessoas de qualquer povo estão sobretudo preocupadas com os seus afazeres quotidianos e , salvo tenham sido também sujeitas a campanhas de ódio pelos seus governos, não nutrem antagonismo por outro povo. Na verdade, os inimigos são as elites governantes e as detentoras das maiores riquezas de qualquer país. São elas que instigam os sentimentos de ódio através da média que controlam.
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segunda-feira, 12 de novembro de 2018

A PRIMEIRA GUERRA MUNDIAL: LIÇÕES A EXTRAIR


No centésimo aniversário do seu fim, a 1ª Guerra Mundial continua a ser muito polémica. Repare-se que, hoje em dia, várias teses radicalmente opostas se têm confrontado: por um lado, as da media mainstream em geral, portadoras das formas mais convencionais de interpretação a cargo de certos historiadores e, por outro, a forma tradicionalmente da esquerda e em particular da esquerda anti-autoritária, de que se tratou de uma guerra desejada pelos grandes poderes e não foi de forma nenhuma um «acidente de percurso».
A realidade documental é que o governo do Kaiser de então não desejava a guerra de forma nenhuma; mas os governos do Reino Unido e da França, por razões diversas mas convergentes, sim. 
O atentado de Sarajevo foi um evento trágico, explorado de forma a colocar a Europa NA SENDA DA GUERRA. Não seria caso de automática declaração de guerra entre grandes potências, a não ser como pretexto para uma guerra longamente planeada. 
Sarajevo é um mito, tal como a causa da guerra de Tróia, narrada na Ilíada: Realisticamente, não se acredita que a guerra de Tróia (a verdadeira, histórica) tenha sido exclusivamente «causada pelo rapto» de Helena por Pâris.

A guerra foi aceite por muitos proletários, os mais modestos membros das sociedades  nos diversos países ditos civilizados, como a França, a Grã-Bretanha, ou  a Alemanha: contam-se literalmente «pelos dedos» os dirigentes operários, de partidos ou de sindicatos desses países, que se opuseram activamente, que tiveram a coragem de ir contra a onda avassaladora de xenofobia homicida de que as massas estavam apoderadas: 
- Mas como é que se transformaram operários de vanguarda, seguidores das ideias socialistas e anarquistas e, portanto, totalmente contrários à guerra inter-imperialista, numa massa de fanáticos acríticos, desejando ir «torcer o pescoço» ao inimigo? 
Eis um fenómeno que importa aos historiadores da 1ª Guerra Mundial considerar: o enorme peso da propaganda sobre as massas, sobre a opinião pública de então. 
- Qual o papel da intelectualidade em difundir a visão específica em como esta guerra era «justa», «inevitável», para o «bem da civilização», enfim... porque seria, sem dúvida, a «última» das guerras? 

                                

Quando eu olho o panorama actual encontro alguma nostalgia  mas também uma indefinida e pouco explícita «justificação» da intervenção de Portugal na guerra, como a que defende a tese de que a República precisava (??) da guerra para ser capaz de «defender eficazmente» os seus territórios ultramarinos. 
Toda a retórica pró-guerra está envolvida, em países mais centrais ou periféricos, numa aparente mas, ilógica - se pensarmos um pouco - defesa do interessa nacional. AFINAL, O «INTERESSE NACIONAL» É UMA FORMA DE DIZER O «INTERESSE DA CLASSE DOMINANTE NACIONAL». 
A subida dos fascismos (e não somente do nazismo!), tanto na Itália como em Portugal, foram também consequência directa da enorme frustração resultante dos acordos de Versailles:  quem impôs a sua visão do mundo foram as grandes potências vitoriosas de então, França, Grã-Bretanha e os EUA, os quais chegaram tarde ao teatro da guerra, mas souberam explorar muito bem a sua primazia, como credores dos impérios francês e britânico falidos.
O desastre da república de Weimar, nascida não apenas de derrota do Reich alemão, como também da tentativa insurreccional falhada dos proletários das comunas de Berlim e Munique, não está suficientemente explicado, como a própria revolução de Fevereiro de 1917 na Rússia e todo o processo que iria culminar na revolução de «Outubro» (a 7 de Novembro, no calendário europeu ocidental, mas a 25 de Outubro no calendário ortodoxo). As revoltas e revoluções que se  sucederam caldearam, tanto na vitória como na derrota, muito das ideologias totalitárias que se vieram a desenvolver. Mas a forma como as coisas se passaram realmente, durante e no pós- primeira Guerra Mundial, é um dos assuntos da História mais mitificados, portanto mais ocultados, na realidade: assim tem sido feito por cada historiador, ou cada corrente na disciplina, no fundo relacionada com esta ou aquela ideologia: liberal, fascista, comunista, reformista, anarquista... etc.).
Podemos nos horrorizar perante o milhão (!) de mortos caídos de ambos os lados nas trincheiras de Verdun, ou outros horrores da 1ª Guerra mundial; mas não nos surge como real, agora, esse banho de sangue. É simplesmente fora da nossa experiência quotidiana e fora daquilo que comummente concebemos como sendo a guerra total: uma completa aniquilação causada por uma troca de bombas termo-nucleares, a total erradicação da vida humana e de muitas formas de vida do planeta Terra. 

Vejo como preocupante que certos meios e certos media nos queiram vender como decente uma visão de que «nós» tínhamos de fazer a guerra, que esta era «inevitável» e de que «nós» estávamos do lado certo da História, do bem, da moral, etc...

                                            

Para mim, este facto é preocupante porque é um resvalar para a propaganda de guerra: o «limpar» a memória de um acontecimento histórico, de o enaltecer, até, como se fosse um desígnio colectivo de um povo que o tivesse impulsionado contra um povo «inimigo», com toda a carga ideológica que isso supõe. Esta narrativa é a que convém àqueles que, de novo, querem demonizar uma ou outra nação (neste caso, claramente a Rússia e a China). 
Com efeito, a propaganda de guerra que antecedeu e se manteve durante esses quatro horrendos anos de 1914-1918, funcionou como apoio fundamental para o «esforço de guerra» e para a dominação, pura e simples, das massas.
A crise da democracia liberal, a ascensão do fascismo, as aventuras bélicas coloniais, as revoluções e contra-revoluções, as crises económicas e, finalmente, a 2ª Guerra Mundial, foram resultado da abertura da «Caixa de Pandora» da 1ª Guerra Mundial.

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2022

SE QUERES A PAZ, PREPARA A PAZ!

 ... EM VEZ DE GUERRA. PERGUNTA COMO SEREMOS MAIS «SAPIENS» E MENOS «BESTAS» 

Sim, eu sei que a guerra acompanha as sociedades humanas desde o princípio, ou pelo menos, desde os mais antigos registos arqueológicos de Estados, civilizações...

Mas, a propensão para a guerra não é a mesma que uma situação pontual de agressividade entre dois seres humanos. Posso compreender que duas pessoas se «peguem à porrada» (luta corpo a corpo), embora não seja um processo de resolver contendas individuais, sejam elas quais forem. Mas, a guerra não é isso, nem é sequer a extensão ou potenciação do fenómeno individual da luta corpo a corpo. Não! A guerra é uma coisa totalmente diferente. Qualitativamente.

Note-se que é um ato NÃO- espontâneo, quer a agressão seja iniciada por uma das partes, quer haja uma subida da agressividade mútua e as duas partes entrem em conflito, em simultâneo. Há sempre uma preparação para a guerra. 

O célebre ditado (julgo que vem dos romanos) «se queres a paz, prepara a guerra» é o mais falacioso que se pode imaginar: Se queres a paz, prepara a paz, pois é com instrumentos completamente diferentes (e com um estado de espírito também diferente) que se constrói a paz ou se prepara ou executa a guerra.

Além disso, na guerra, ocorrem sempre crimes. Além dos soldados, dos militares, que uma e outra parte consideram «legítimo» e até «honroso» matar, existem inúmeros casos de civis assassinados, feridos, violentados, expulsos e afamados.

 Um general dos EUA disse e escreveu um grande manifesto pacifista: «A guerra é uma chantagem!» (War is a racket).



Sim e além disso, é um crime cometido a sangue frio contra pessoas (e incluo a maioria dos soldados, nesse número) totalmente inocentes,  que são meras vítimas dos poderosos. Todos os que iniciam uma guerra, deveriam ser presos e julgados em tribunal penal internacional, mas também os seus acólitos, os que cobardemente insuflaram o ódio, de um e outro lado. 

As indústrias de armamento, essas, ficam felizes quando se inicia, e enquanto dura, a carnificina: elas não são entidades «humanitárias», que eu saiba. Não se destinam a espalhar o «bem», mas sim dividendos (e chorudos!) aos seus acionistas. 

A guerra não é um «mal inevitável». A guerra é a expressão de barbárie, seja qual for a sua génese. Porque, mesmo quando pensamos que uma parte «tem razão» e a outra não, estamos a fazer de conta que o mal está TODO e apenas de um lado. Mas, imagine-se não só o «nosso lado», o dos «nossos» ; do lado oposto, passa-se o processo exatamente  simétrico. 

Portanto, não pode haver solução, nesta como em qualquer outra guerra, senão com um forte repúdio da situação de guerra, em si mesma. Por razões éticas: porque não existe guerra «limpa», não existe guerra sem «danos colaterais» e  porque uma guerra - ganha ou perdida - é sempre «semente» de outra guerra futura, porque sempre ficam rancores, feridas, injustiças.

Em geral, os nacionalismos alimentam-se destas situações, aproveitam-nas, tiram partido das mesmas. É assim que ascendem ao poder grande parte dos psicopatas e sociopatas: eles prometem aos seus eleitores «vingar» as afrontas sofridas.

Por todos estes motivos, a única atitude aconselhável e ética é depor as armas, fugir, desertar, no que respeita aos soldados. Humanamente, estou com os desertores de todos os bordos e convicções: Estes, merecem a minha compaixão, não os generais e os políticos, que fazem «profissão» de mandar outros matar e matarem-se, em nome deles!

Mais; eu sou cristão e como tal falo, mas o que eu digo pode ser compreendido e assumido por qualquer, desde que a sua humanidade não tenha sido anulada, desfigurada, por condicionamento. 

O condicionamento (o chamado treino militar) para se matar, sem compaixão, implica a violação permanente do que existe de mais profundo num ser humano. 

Para agravar ainda mais a desumanização e ter maior controlo preferem fazer a guerra à distância, com drones e robots: as máquinas não têm alma e podem fazer as coisas mais terríveis, sem problemas de consciência. 

Vendo, concretamente, os abismos de brutalidade e de perversão deste nosso século, desde o seu começo, estou convencido que é preciso um choque moral para  permitir o acordar de muitas pessoas.  

Ninguém se pode pôr de lado e dizer que «isto não é comigo»: Porque todas as pessoas têm obrigação moral de impedir ou de minorar o mal, quando estão perante esse mal. Todos nós podemos fazer alguma coisa. A impotência é também uma ilusão.

Se estás de acordo com o essencial do que defendo, escreve-me (manuelbap2@gmail.com). Não tenho uma ideia definida do que fazer, mas uma coisa eu sei: as pessoas têm que se juntar em torno de objetivos muito concretos e válidos. 

A Paz  A-G-O-R-A  !

PS.1: Este cartoon chama a atenção para o fanatismo induzido:



quinta-feira, 9 de fevereiro de 2023

Resumo fundamentado de um ano de guerra na Ucrânia por Roberto Buffagni


Comentário, de MB:


Enviou-me Grazia Tanta este texto, traduzido do italiano pelo site «Estátua de Sal» . O texto é rico em pormenores e a sua visão de conjunto é realmente estratégica; ou seja, sopesa as consequências para a NATO e para a Rússia, sempre no campo do realismo, sem fazer considerações ideológicas. Ótimo, mas penso que tem uma grave falha, ao não sublinhar o outro fator vital (o primeiro era a expansão da NATO até às fronteiras russas) para a decisão russa: Refiro-me ao genocídio e as constantes ações militares do regime de Kiev sobre as populações civis de Lugansk e Donetsk, ações que causaram cerca de 15 mil mortes civis, nos 8 anos decorridos entre o golpe de Maidan e o início da invasão russa. O governo russo teve que intervir em virtude de uma intensificação dos bombardeios pelos exércitos de Kiev, sobre zonas civis. 
Se eu interpreto corretamente a situação, a intensificação dos bombardeamentos, em paralelo com a concentração de tropas do regime de Kiev, cerca de 75 mil soldados, bem equipados e treinados, perto das repúblicas separatistas do Don era em preparação a uma invasão desta parte do território. 
 Esta questão é fundamental para se compreender a própria estratégia russa nos primeiros meses, visto que estavam decididos a fazer essa intervenção ao abrigo de uma disposição inteiramente legal, segundo a legalidade internacional da ONU, em ir em socorro às populações que estivessem a ser massacradas e em grave perigo de vir a sofrer um ainda maior banho de sangue. Perante a opinião pública russa, os russófonos de Donetsk e Lugansk são tão russos como eles. Os russos do Don apenas se encontravam do lado de lá da fonteira, devido às partições e arranjos feitos em várias épocas,  desde a conquista da Crimeia, no tempo da Imperatriz Catarina da Rússia, continuando por vários Czares , por Lenine e pelo regime soviético até aos anos 1991 e ao  desmantelamento da União Soviética...

Mas, no conjunto, vale a pena ler este texto porque desfaz muitas atoardas e ocultações feitas (em vez de argumentos). A propaganda raivosamente anti-russa quer ver os «maus» de um lado e os «bons» do outro. 
Oxalá que as pessoas percebam que a guerra não é nenhum jogo, que não pode ser vista como tal, mas antes como um drama que envolve milhões de indivíduos, a maior parte deles, totalmente inocentes.

Manuel Banet
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Resumo fundamentado de um ano de guerra na Ucrânia

 

Roberto Buffagni, Observatoriocrisis, 02/02/2023, Trad. Estátua de Sal)


Um ano após o início da guerra, está claro que uma vitória militar ucraniana sobre a Rússia é materialmente impossível, mas a ajuda ocidental à Ucrânia pode prolongar o conflito. Agora, se eu tiver que arriscar um palpite, acho que a Rússia continuará a guerra de desgaste por muito mais tempo...


Neste artigo analiso, com a maior brevidade e clareza, o percurso estratégico e a dinâmica que conduziu à atual quarta fase da guerra na Ucrânia, fase que considero transformadora. Não insiro notas a não ser uma, referente a um grande estudo da RAND Corp., publicado enquanto preparava este texto, no final de janeiro de 2023.

Agradeço sinceramente ao General Marco Bertolini, ao historiador Giacomo Gabellini e Giuseppe Germinario, que tiveram a gentileza de ler este rascunho e me aconselhar. Claro que a responsabilidade pelos defeitos e limitações do artigo é exclusivamente minha.

ETIOLOGIA DA GUERRA NA UCRÂNIA. NATUREZA E FINS DA GUERRA DO PONTO DE VISTA RUSSO E OCIDENTAL

Sobre a etiologia da guerra na Ucrânia compartilho a interpretação histórica do professor John Mearsheimer. O conflito é consequência da expansão da NATO para leste e do desejo dos EUA de criar um reduto militar ocidental na fronteira russa, integrando a Ucrânia na NATO: uma estratégia que a Federação Russa declarou absolutamente inaceitável desde a Cimeira da NATO em Bucareste em 2008, em que esta organização militar anunciou a sua intenção de integrar a Geórgia e a Ucrânia na Aliança Atlântica.

Entre 2008 e 2022, os Estados Unidos gradualmente integraram a Ucrânia na NATO, embora de facto e não de jure. Em 2014, pressionaram pela desestabilização do governo recém-eleito e instalaram um regime amigo, e nos anos seguintes elevaram as forças armadas ucranianas para o nível de prontidão da NATO. Em 2014, a Federação Russa anexou a Crimeia sem conflito militar.

No entanto, em 2021, registou-se uma aceleração significativa do processo de integração de facto da Ucrânia na Organização Militar Atlantista: importantes fornecimentos de armas, grandes exercícios militares conjuntos e, em novembro desse ano, foi renovada uma Convenção bilateral EUA-Ucrânia que reafirmou a intenção comum de integrar a Ucrânia na NATO, desta vez de jure.

De acordo com esta interpretação etiológica, do ponto de vista russo, a guerra na Ucrânia é uma guerra preventiva em defesa de interesses russos vitais, e não uma guerra imperialista de anexação/conquista e não é o prólogo de uma qualquer expansão territorial russa na Europa. Este último objetivo é, ao contrário, a definição da natureza e dos propósitos da intervenção russa adotada pelos Estados ocidentais.

PRIMEIRA FASE DA GUERRA (24 DE FEVEREIRO A PRIMAVERA DE 2022). ESCALADA MILITAR RUSSA: INVASÃO DA UCRÂNIA. ESCALADA POLÍTICA OCIDENTAL: REJEIÇÃO DE QUALQUER NEGOCIAÇÃO DIPLOMÁTICA.

Em dezembro de 2021, a Federação Russa, que nos meses anteriores havia destacado um contingente militar pronto para intervir na fronteira ucraniana, propôs uma solução diplomática aos EUA, na fórmula inusitada de um projeto de tratado tornado público. As principais reivindicações russas eram, fundamentalmente: a Ucrânia neutra e a aplicação efetiva dos acordos de Minsk para a proteção das populações de língua russa de Donbass, onde ocorre uma guerra civil desde 2014, apoiada não oficialmente pelos governos ucraniano e russo. Os Estados Unidos não responderam à proposta de forma satisfatória para os russos (adiaram, paralisaram, recorreram à "ambiguidade estratégica").

Em 24 de fevereiro de 2022, a Federação Russa intervém militarmente na Ucrânia. Não é possível saber ao certo porque foi escolhido esse momento. Talvez, mas esta é apenas a minha inferência lógica, porque de acordo com as informações que possuo, a Federação Russa acreditava que o exército ucraniano estava prestes a intervir contra as milícias de Donbass, uma vez que destacou a maioria de suas tropas que estavam em posições defensivas. que eles construíram ao longo dos anos, a fim de evitar uma possível intervenção militar russa e torná-la muito mais difícil, cara, incerta.

Os russos intervêm com um contingente militar de cerca de 180 a 200.000 homens, em condições de inferioridade numérica relativamente ao exército ucraniano em cerca de 3:1, embora os manuais tácticos prescrevam uma relação inversa atacantes/defensores (pelo menos 3:1 a favor do atacante, para compensar a vantagem da defesa).

Os russos desenvolvem ataques em cinco linhas, tanto no sudeste quanto no noroeste da Ucrânia. Os ataques no Noroeste são ataques secundários, uma grande manobra diversiva destinada a colocar tropas ucranianas em defesa de Kiev e outros centros afetados pela manobra, para moldar o campo de batalha no Sudeste, no Donbass, para onde se dirigem. Ao interpretar a manobra russa dessa maneira, concordo com a interpretação oferecida por "Marinus", provavelmente o pseudónimo do tenente-general (ret.) Paul Van Riper.

Em três ou quatro semanas, a manobra de diversão russa foi bem-sucedida. No final de março, as tropas russas que haviam realizado ataques secundários no Noroeste retiraram-se, enquanto o grosso das forças russas se desdobrou em praticamente todo o Donbass, infligindo pesadas perdas, especialmente materiais, ao exército ucraniano graças a um clara superioridade em poder de fogo de artilharia e foguetes. A ação militar russa evita cuidadosamente o envolvimento de civis, não toca nas infraestruturas de uso civil e militar (por exemplo, a rede elétrica) e, em última análise, assume a forma de "diplomacia armada": os russos tentam obter, com pressão militar moderada, os objetivos que não foram alcançados com a crescente pressão diplomática de vários anos.

Até ao final de março de 2022, parece que a "diplomacia armada" russa pode ter sucesso: entre 24 de fevereiro e o final de março, sete reuniões diplomáticas são realizadas entre a Rússia e a Ucrânia e, no final de março, o presidente Zelensky declara oficialmente a jornais russos independentes que está pronto para negociar a neutralidade da Ucrânia e a solucionar o problema das populações de língua russa de Donbass.

Primeira escalada política ocidental

Mas, em 7 de abril de 2022, o primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, visita o presidente ucraniano e declara oficialmente que a Ucrânia ”contra as probabilidades, desafiou e empurrou as forças russas para fora das portas de Kiev, realizando a maior façanha de combate do século XXI". A partir desse momento, cessaram todas as relações diplomáticas entre a Ucrânia e a Federação Russa.

A interpretação ocidental “aquela pequena Ucrânia derrotou a grande Rússia no campo de batalha” é baseada numa leitura das primeiras semanas da guerra que é radicalmente diferente daquela que propus acima.

De acordo com esta interpretação, o objetivo russo teria sido a tomada de Kiev e a "mudança de regime", o derrube do governo ucraniano e a sua substituição por um governo fantoche pró-Rússia, e os ataques no noroeste seriam ataques principais fracassados, não ataques secundários fazendo parte de uma ampla manobra de diversão. É uma interpretação possível, que, se verdadeira, denuncia uma grave insuficiência militar e política da Federação Russa: é impossível atingir objetivos tão ambiciosos com um desdobramento tão reduzido de forças e uma intensidade tão baixa do conflito.

As facções mais extremistas do campo ocidental e do governo ucraniano confiam cegamente nessa interpretação dos eventos militares, sejam elas corretas ou incorretas, genuínas ou enganosas. No Ocidente cristaliza-se a certeza oficial de que é possível infligir uma derrota militar decisiva à Rússia, sendo por isso realista propor objectivos estratégicos maximalistas, como a sangria da Rússia e a sua desestabilização política, tanto por pressão militar como por pressão económica através de sanções e a ativação de forças centrífugas. O objetivo final: a expulsão da Rússia das fileiras das grandes potências, o estabelecimento de um governo pró-ocidental e possivelmente a fragmentação política da Federação Russa.

Esses objetivos maximalistas foram reivindicados oficialmente em 24 de abril pelos secretários de Estado e de Defesa dos Estados Unidos. Assim, os países europeus e da NATO, exceto a Turquia e a Hungria, alinham-se sem escrúpulos e votam, por maioria parlamentar esmagadora, por duras sanções económicas à Rússia e remessas de armas para a Ucrânia. A Suécia e a Finlândia, historicamente neutras, anunciam sua intenção de se tornarem membros da NATO. A "diplomacia armada" russa falhou.

SEGUNDA FASE DA GUERRA (PRIMAVERA – MEADOS DO VERÃO DE 2022). CONQUISTA RUSSA DE DONBASS. A CONDIÇÃO DE POSSIBILIDADE DE VITÓRIA PARA A UCRÂNIA.

A conquista russa de Donbass continua com sucesso, com confrontos urbanos altamente violentos, de casa em casa em Mariupol e em outros lugares. As tropas russas presentes na linha de contato com o inimigo são principalmente as milícias Donbass, as formações de voluntários chechenos e o grupo Wagner. As formações do exército regular russo atuam principalmente (não só) no apoio, com artilharia, mísseis e comando operacional. A ação militar russa não tem como alvo a infraestrutura civil e militar (de uso duplo) da Ucrânia.

A proporção de perdas ucranianas para russas é claramente desfavorável aos ucranianos, tanto por causa do poder de fogo russo superior, quanto porque as operações militares ucranianas são fortemente influenciadas pela necessidade de justificar, aos governos ocidentais e à opinião pública, o colossal e quase unânime apoio político e financeiro à Ucrânia, apoio que tem sérias repercussões políticas e económicas nos países europeus, especialmente na Alemanha, que se vê excluída do fornecimento de energia russa barata, na qual baseia há décadas, a sua prosperidade.

Em suma, os ucranianos são obrigados a “vender” resultados no terreno, resistência inflexível e agressividade constante. Esta é a sustentabilidade política do indispensável apoio ocidental: a perspectiva de uma futura vitória militar ucraniana sobre a Rússia.

Claro, a corajosa resistência ucraniana não pode ser atribuída apenas a isso: para grande parte da população, o conflito com a Rússia transformou-se numa guerra de libertação nacional, que é complementada por uma guerra civil e uma guerra por procuração dos Estados Unidos. Estados Unidos/NATO contra a Rússia

 A condição de possibilidade de uma vitória militar ucraniana

No entanto, a condição para a possibilidade de uma vitória militar decisiva da Ucrânia sobre a Rússia é baseada numa suposição.

É um pressuposto que funciona como princípio ordenador da estratégia de dissuasão desenvolvida pelo general francês Gallois: tornar a relação custo/benefício da vitória sobre a potência mais fraca desfavorável para a potência mais forte.

De acordo com a tese de Gallois, se uma grande potência nuclear atacasse a França, certamente poderia destruir o país completamente, mas a ativação de sua força nuclear infligiria danos politicamente inaceitáveis para a potência mais forte.

Resumindo: para vencer, o poder mais fraco deve assegurar que a vitória do poder mais forte não lhe custe uma guerra total inaceitável. A Ucrânia é fraca, a Rússia é forte.

Mesmo com a ajuda ocidental, os recursos estratégicos da Ucrânia (população, poder económico latente, poder militar manifesto, tropas mobilizadas e mobilizáveis, profundidade estratégica) ainda são em ordem de grandeza inferiores aos recursos estratégicos da Rússia, porque a Rússia tem 145 milhões de pessoas, pode mobilizar até 25 milhões de homens, possui enormes recursos naturais e capacidade de transformá-los, uma grande base militar-industrial e uma profundidade estratégica de 11 fusos horários. (“Profundidade estratégica” é o espaço dentro do qual um exército atacado pode recuar, se reorganizar e contra-atacar, assim como os soviéticos fizeram após a devastadora série de avanços da Wehrmacht no início da Operação Barbarossa.)

Repito: uma potência muito mais fraca pode vencer uma potência muito mais forte apenas se tornar o custo/benefício da vitória desfavorável para a potência forte.

Foi assim que o Vietname e o Afeganistão derrotaram os Estados Unidos (foi assim também que os afegãos derrotaram a URSS). O que aconteceu é que se essas duas grandes potências tivessem decidido comprometer totalmente os seus ativos estratégicos, o Vietname e o Afeganistão não poderiam ter evitado a derrota total. Mas os EUA e a URSS não o fizeram porque consideraram que uma guerra desse tipo era politicamente insustentável: perdas muito altas, compromisso político, económico e militar de longo prazo inaceitável, crescente oposição interna à guerra, etc. Em suma, os EUA e a URSS decidiram perder porque avaliaram que, para eles, a relação custo/benefício da derrota era mais vantajosa do que a relação custo/benefício da vitória.

O que está em jogo para a Rússia

Mas hoje os objetivos estratégicos declarados oficialmente pelo governo americano e relançados pela NATO e pelos países europeus são objetivos maximalistas: sangramento e enfraquecimento permanente do poderio económico e militar da Rússia, desestabilização do governo, ativação de forças centrífugas dentro da Federação Russa, expulsão de Rússia da lista de grandes potências, possível fragmentação territorial. Particularmente aterrorizante para a Rússia – que historicamente se constituiu como um império multiétnico, multinacional e multirreligioso – é a possibilidade de ativação de forças centrífugas étnicas, religiosas e nacionais, num cenário semelhante ao da Jugoslávia na década de 1990.

Em suma, os objetivos declarados do Ocidente constituem uma ameaça existencial ao governo, estado, sociedade e nações russas. Assim, a liderança russa convenceu-se de que apostas absolutas estão em jogo na guerra da Ucrânia e, portanto, estão dispostas a fazer literalmente qualquer coisa para a vencer, e repetidamente o têm dito oficialmente. Na verdade, eles estarão dispostos, até compelidos, a fazer pleno uso de todos os recursos estratégicos russos para vencer a guerra: vencer a Ucrânia e, eventualmente, se for um conflito direto, vencer também a NATO.

Assim, a condição de possibilidade de uma futura vitória ucraniana é eliminada: que para a Rússia a vitória sobre a Ucrânia não valeria uma guerra até ao amargo fim da vitória. Para conquistar o “mundo russo”, a Ucrânia e seus aliados ocidentais teriam que obter uma vitória decisiva sobre uma Federação Russa disposta, ou melhor, forçada a comprometer plenamente, pelo tempo que for necessário, todos os seus recursos estratégicos: em suma, eles deveriam fazer a Rússia capitular.

Ao mesmo tempo, os EUA e seus aliados ocidentais, ao se comprometerem publicamente com objetivos maximalistas, estão fechando o espaço de manobra da diplomacia e a aumentar as apostas políticas das suas classes dominantes, que correm o risco de serem varridas pela derrota; apesar de um resultado desfavorável da guerra não prejudicar, como tal, os interesses vitais de suas nações, nenhuma das quais corre o risco de desestabilização após uma derrota ucraniana.

A única nação do campo ocidental que arrisca tudo é a Ucrânia, que só pode esperar terríveis desastres com a continuação da guerra e provável derrota.

TERCEIRA FASE DA GUERRA (FIM DO VERÃO – OUTONO DE 2022). SUCESSO DA CONTRA-OFENSIVA UCRANIANA . ESCALADA POLÍTICA RUSSA: ANEXAÇÃO DE QUATRO PROVÍNCIAS DE DONBASS. ESCALADA MILITAR RUSSA: BOMBARDEIO DE ALVOS MILITAR E CIVIL DE USO DUPLO. GUERRA DE MANOBRA E GUERRA DE ATRITO.

As forças russas estão estacionadas em Donbass, ocupando quase 20% de todo o território ucraniano e posicionadas numa frente de, aproximadamente, 1.500 km. Reorganiza-se o aparelho militar ucraniano, alarga-se a mobilização convocando os reservistas e estendendo-se o serviço militar obrigatório até aos 60 anos, abastece-se de novas armas ocidentais (em grande parte de material ex-soviético) para substituir as destruídas na anterior fases do conflito, o país é intervencionado por um envolvimento mais intenso do estado-maior da NATO e por uma estruturação mais capilar das funções ISR (Inteligência, Vigilância e Reconhecimento)... e em setembro de 2022 lança uma contra-ofensiva, tendo como alvo principal Kharkiv.

A contra-ofensiva ucraniana é bem-sucedida. Os russos tiveram de recuar ao longo de toda a frente, recuando mais ou menos em ordem. Motivo: o cobertor russo é muito curto. As unidades russas conquistaram vastos territórios que não podem manter com o pequeno número de tropas envolvidas na "operação militar especial". Devem, pois, resistir retirando-se o mais ordenadamente possível, encurtar a frente, reduzir os territórios a defender e fortificá-los para neles se instalarem, reconfigurar o dispositivo militar e reforçá-lo.

A Rússia ajusta-se à nova realidade no terreno. O comandante-geral das operações na Ucrânia, general Surovikin, propõe à Duma, que vota por unanimidade, a mobilização parcial de 300 mil reservistas. Também estão mobilizadas as indústrias militares, que trabalharão em três turnos de oito horas.

Escalada política russa: anexação dos quatro oblasts de Donbass

O governo propõe à Duma, que também votou por unanimidade em outubro, a anexação de quatro oblasts de Donbass: as regiões de Donetsk, Lugansk, Zaporizhzhya e Kherson, após um plebiscito organizado pelas autoridades russas de ocupação.

É a escalada política mais decisiva de toda a guerra, porque com ela a Rússia deita para trás das costas qualquer hesitação e implicitamente anuncia a sua firme disposição de comprometer todos os seus recursos estratégicos até ao fim para obter a vitória sobre a Ucrânia e seus aliados. Para que a Rússia se retire da anexação, devolvendo à Ucrânia os territórios que formalmente se tornaram território nacional da Federação Russa, a Ucrânia e seus aliados teriam que infligir uma derrota decisiva a toda a Federação Russa e fazê-la capitular.

Escalada militar russa. Bombardeio de propósito duplo de alvos militares e civis

A Rússia reconfigura o dispositivo militar em torno da unidade de comando e consolida a frente, enquanto a mobilização dos reservistas ocorre no meio de diversas dificuldades (é a primeira mobilização em oitenta anos e o aparato administrativo e logístico russo não está pronto; milhares dos russos atravessam as fronteiras para evitar o recrutamento).

O Comandante General Surovikin decide sobre escalada militar. Pela primeira vez, alvos civis e militares de uso duplo, em particular a rede elétrica ucraniana, mas também infraestruturas gerais como ferrovias, fábricas, depósitos de material militar e civil, etc., são afetados por uma série incessante de bombardeios de mísseis. A Rússia não ataca civis, mas ao atacar a infraestrutura causa sérios transtornos à população, põe em risco o curso normal da vida quotidiana e, obviamente, causa "danos colaterais", vítimas civis atingidas por engano pelos seus mísseis e pelo fogo antiaéreo ucraniano.

O general Surovikin também toma a decisão, politicamente difícil e impopular mas correta, de abandonar Kherson, um importante centro formalmente anexado ao território nacional russo, e retirar as tropas que o ocupam para a margem sul do rio Dnieper. A decisão operacional permite não desperdiçar forças evitando uma contra-ofensiva num ponto sensível, mas concentrar esforços no Donbass. Isso levará a resultados concretos benéficos no campo de batalha.

Guerra de manobra, guerra de desgaste. O exemplo histórico da Operação Barbarossa

A "guerra de manobra", em alemão Bewegungskrieg (guerra de movimento), é o oposto simétrico da "guerra de atrito", Stellungskrieg, (guerra de posição). Cada guerra combina, em porcentagens diferentes, manobra e desgaste. A guerra de atrito visa desgastar gradualmente as capacidades de combate do inimigo com a aplicação sustentada e constante da força superior. A guerra de manobra visa destruir rapidamente as capacidades de combate do inimigo, criando e explorando habilmente o Schwerpunkt, ou seja o ponto de viragem vital mais fracamente defendido da formação inimiga, contra o qual um ataque rápido e decisivo é lançado.

A vantagem da manobra sobre o desgaste parece óbvia: a manobra oferece a possibilidade de uma vitória rápida e decisiva, mas também ameaça a possibilidade de uma derrota igualmente rápida e decisiva, porque atacar é sempre arriscado e o inimigo sempre pode responder.

Como aponta Clausewitz, não existe “ciência da vitória”, e a lógica que rege a guerra não é linear mas paradoxal, como ilustra o ditado romano “si vis pacem para bellum”. A guerra de manobras é utilizada por exércitos que sofrem uma clara desvantagem na guerra de desgaste: são exércitos menos numerosos, com capacidades materiais ou logísticas inferiores às do inimigo.

Nesta fase do conflito ucraniano, que nas duas fases anteriores viu uma combinação de manobra e desgaste, a guerra estabiliza-se na forma de uma "guerra de atrito", o tipo de conflito onde mais pesa a disparidade de recursos estratégicos entre os contendores. De fato, na guerra de atrito, o que mais conta para a vitória é a capacidade de fornecer forças humanas e materiais de forma sustentável. É onde a Rússia tem a maior vantagem sobre a Ucrânia.

A vantagem russa é reforçada por um fato político essencial: a Ucrânia é totalmente dependente do apoio ocidental, e os líderes ocidentais devem justificar o crescente custo político e económico desse apoio para a opinião pública e para o seu eleitorado. Assim, os ucranianos são obrigados, por motivos políticos, a enviar constantemente tropas, mesmo insuficientes ou despreparadas, para a linha de contacto com os russos, mantendo vivo o conflito, renovando no Ocidente a admiração pela sua resiliência e alimentando a convicção de que a vitória final da Ucrânia é possível.

Do ponto de vista militar, os ucranianos deveriam realmente fazer uma pausa, reorganizar as suas reservas, reforçá-las e treiná-las, e economizar homens e equipamentos para futuras contra-ofensivas. Com efeito, uma potência com recursos estratégicos claramente inferiores ao seu inimigo só pode esperar derrotá-lo com uma hábil, agressiva e rápida guerra de manobra, especialmente rápida: numa guerra de atrito, o tempo corre a favor da potência com maiores recursos estratégicos.

Foram essas considerações fundamentais que ditaram a maneira como o poder militar prussiano, e posteriormente alemão, se desenvolveu e organizou, ou seja, na Prússia estavam os mestres da guerra de manobra agressiva e rápida.

Historicamente, tanto a Prússia quanto a Alemanha tiveram que lidar com a sua própria situação geopolítica: exposição em várias frentes no centro da Europa, fronteiras desprotegidas por obstáculos naturais, recursos naturais e humanos limitados; e, portanto, decidiram resolver esta difícil equação desenvolvendo um aparato militar altamente preparado para travar guerras de manobra rápida com grande agressividade e habilidade. Exemplos dos sucessos do estilo germânico são a magistral Blitzkrieg contra a Polónia e a França na Segunda Guerra Mundial.

No entanto, o fracasso da Operação Barbarossa também é exemplar. A Alemanha invadiu a URSS, obtém vitórias esmagadoras por seis meses, mas não consegue causar o colapso político e social do inimigo e chega ao limite das suas capacidades logísticas. A URSS não capitula, ela reorganiza-se e passa a gerar forças humanas e materiais cada vez maiores e superiores às forças que a Alemanha é capaz de gerar. Serão quatro anos de amargo conflito, mas o destino da Alemanha está selado.

Deve notar-se que na época da Operação Barbarossa todos os Estados-Maiores do mundo, deslumbrados com os esplêndidos sucessos alemães, deram como certa a vitória da Wehrmacht. Mas isso só poderia ter acontecido se a URSS tivesse entrado em colapso após os primeiros meses de derrotas devastadoras. A Operação Barbarossa foi, portanto, uma arriscada aposta estratégica, em que a vitória final dependia inteiramente do colapso da coesão política, militar e social do inimigo. O Alto Comando Alemão, por sua vez, não levou em conta tanto os recursos estratégicos da URSS quanto, e sobretudo, a sua capacidade de gerar novas forças, durante o tempo necessário para encerrar a guerra. vitoriosamente.

É o mesmo tipo de erro que o alto comando ocidental cometeu neste conflito ucraniano.

Eles subestimaram enormemente os recursos atuais da Rússia: esse erro da inteligência militar ocidental explica as constantes alegações de que "a Rússia está prestes a ficar sem reservas de mísseis e projéteis de artilharia". Esse tipo de desinformação tem-se tornado cada vez mais grotesco e desconectado da realidade; o Ocidente subestimou seriamente a capacidade da Rússia de gerar novas forças humanas e materiais a curto e médio prazo: daí a avaliação incorreta do impacto das sanções económicas sobre a Rússia, erroneamente acreditada; eles também subestimaram seriamente a coesão política e social da estrutura russa, a sua vontade de lutar e de se mobilizar: isso também explica os anúncios cada vez mais ridículos de um derrube iminente do governo russo por setores da classe dominante.

QUARTA FASE DE TRANSFORMAÇÃO DA GUERRA (FIM DO OUTONO 2022 – INVERNO 2022/23). DUAS FACÇÕES NA LIDERANÇA DOS EUA: ESCALADA OU DESCALADA? TRÊS FACTOS SIGNIFICATIVOS. ESTIMATIVAS DE PERDAS PARA UCRÂNIA E RÚSSIA. PREVISÕES. A DUPLA ARMADILHA ESTRATÉGICA

Considero a fase atual da guerra transformadora porque só nesta fase vem à tona a sua natureza de dupla armadilha estratégica. Na quarta fase da guerra, três eventos significativos ocorrem.

Sabotagem Northstream 2

Em novembro de 2022, uma sabotagem submarina desativou o Northstream 2, o gasoduto construído para transportar metano russo para a Alemanha através do Mar Báltico, contornando a Ucrânia. A investigação imediatamente parou, devido à impossibilidade política de identificar os autores: de facto, a lógica sugere que os Estados Unidos são os responsáveis pelo ataque.

A operação é provavelmente o resultado de uma colaboração entre a Marinha Real, as forças especiais britânicas e polacas. Motivo da sabotagem: a classe dominante alemã está cada vez mais preocupada com os efeitos desastrosos de longo prazo (desindustrialização progressiva da Alemanha) e a cessação do fornecimento barato de energia russa.

A sabotagem do gasoduto é um verdadeiro ato de guerra contra a Alemanha, destinado a intimidá-la a alinhar-se sem hesitação com a estratégia de oposição frontal à Rússia decidida pelos Estados Unidos. A intimidação é bem-sucedida. A Alemanha está intimidada. O único estado europeu que não adere à linha americana é a pequena Hungria; na NATO, o único estado com alto grau de autonomia política é a Turquia.

Declarações públicas do general Milley, chefe do Estado-Maior Conjunto dos EUA

Em novembro, e novamente em dezembro de 2022, o general Mark Milley, presidente do Estado-Maior Conjunto dos EUA, emite declarações públicas informais, pedindo a abertura de negociações diplomáticas com a Rússia e afirmando que "não se pode pedir mais aos ucranianos".

Os comentários improvisados de Milley são uma indicação clara de que duas grandes facções estão em desacordo nos centros de tomada de decisão dos EUA: uma centrada no establishment bipartidário da política externa, a favor da continuação da guerra na Ucrânia até ao fim; e outra, articulada no Pentágono, a favor da desescalada do conflito.

O facto de Milley comunicar publicamente suas posições mostra que, no debate dentro da Administração dos Estados Unidos, a posição do Pentágono é minoritária, e que o choque entre as duas posições é muito amargo.

Como prova adicional da existência desses dois alinhamentos dentro da liderança americana, um estudo muito recente publicado pela RAND Corporation ( Evitando uma longa guerra: a política dos EUA e a trajetória do conflito Rússia-Ucrânia ), analisa, do ponto de vista de o interesse nacional dos EUA, os custos de um prolongamento da guerra na Ucrânia, e recomenda a desescalada e o estabelecimento cauteloso de um processo diplomático que leve a uma conclusão negociada do conflito. A RAND Corporation é um importante e prestigioso think tank que desde sua fundação realiza análises e projetos, sobretudo para o Pentágono.

Reconfiguração da estrutura de comando russa, anúncio da reforma das forças armadas russas

Em janeiro de 2023, o governo russo reconfigurou o comando militar das operações na Ucrânia e anunciou uma reforma estrutural mais geral de suas Forças Armadas. O soldado russo de mais alta patente, General Gerasimov, Chefe do Estado-Maior das Forças Armadas Russas, recebe o comando geral das operações na Ucrânia, enquanto o General Surovikin reassume o seu papel anterior como Comandante das Forças Aeroespaciais.

O governo restaura os distritos militares de Moscovo e de Leninegrado, ordena a formação de um novo grupo do exército na Carélia, na fronteira finlandesa, e a criação de doze novas divisões do exército. Também anuncia que até 2026 aumentará o tamanho de seus meios militares permanentes, elevando-os para 1,5 milhão de homens.

Os principais líderes russos começam a declarar publicamente que a guerra em curso na Ucrânia é, de facto, uma guerra entre a Rússia e a NATO. Essas declarações públicas sem precedentes também têm, como sempre na guerra, valor de propaganda interna, mas interpretadas à luz das reformas militares em curso, sugerem, com alto grau de plausibilidade, que os governantes russos estão a preparar-se para o pior cenário, ou seja, para uma intervenção direta das forças ocidentais no conflito ucraniano.

A guerra de desgaste continua. Estimativas de perdas ucranianas e russas

Enquanto isso, a guerra de desgaste continua em solo ucraniano. Os ataques com foguetes contra a infraestrutura civil e militar de uso duplo da Ucrânia continuam. O dispositivo militar russo é consolidado nas posições defensivas ocupadas e fortalecidas após a retirada.

A formação dos reservistas reformados continua e é aperfeiçoada, e a logística adapta-se gradualmente à chegada dos reforços e à continuação dos intensos e constantes ataques de mísseis. Os departamentos russos lançam ataques incrementais contra as linhas defensivas ucranianas, com uso reduzido de tropas e fogo de artilharia intenso e prolongado, para limitar ao máximo as suas perdas. Os ucranianos, continuam presos à necessidade política de atacar o mais rápido possível, para justificar o apoio ocidental,

É impossível, enquanto durar a guerra, ter dados confiáveis sobre as perdas. Enquanto escrevo, no final de janeiro de 2023, fontes ocidentais como a Strategic Forecasting, uma importante agência de inteligência que frequentemente colabora com a CIA, falam de mais de 300.000 ucranianos mortos e perdas irrecuperáveis totais de cerca de 400.000 homens.

As estimativas ocidentais não oficiais mais recentes de perdas russas irrecuperáveis falam de 20.000 mortos e 30.000 feridos graves. Mesmo com todas as precauções necessárias, é bem provável que a relação entre as perdas da Ucrânia e as perdas da Rússia esteja entre 10:1.

Nas grandes batalhas da Segunda Guerra Mundial, a taxa de baixas entre o perdedor e o vencedor girava em torno de 1,3 – 1,5 para 1. O exército ucraniano não parece capaz de preparar uma contra-ofensiva em grande escala num futuro próximo: por ter sofrido um elevado número de baixas, especialmente oficiais veteranos e suboficiais; pela escassez de material bélico, apesar dos renovados carregamentos de armas ocidentais; pela crescente desorganização das estruturas de comando militar; e, pela degradação crescente e progressiva das condições económicas e sociais de toda a Ucrânia.

Eleições operacionais do Alto Comando Russo. Previsões.

Em síntese, na quarta fase da guerra começa a ficar claro que o aparato militar russo alcançou, ou está prestes a atingir, as condições necessárias e suficientes para dar ao conflito o rumo desejado por seu comando militar e político.

Claro, apenas o Alto Comando Russo sabe qual é esse rumo, mas atualmente parece ser capaz de:

Um: continuar a guerra de desgaste, aplicando constantemente a sua força superior no aparato militar ucraniano e em toda a sociedade e economia ucranianas: economizando assim o seu recurso mais precioso, os homens. Os homens são o ativo mais valioso da Rússia politicamente, por razões óbvias reforçadas pelas próximas eleições presidenciais russas de 2024. Eles também são o ativo mais valioso da Rússia militarmente, e especialmente os veteranos, que precisam treinar reservistas, nenhum dos quais com experiência direta em cargos tão elevados. guerra de intensidade (ninguém no mundo a tem exceto aqueles que nela participaram, de um lado ou do outro).

Dois: Partir para a ofensiva em larga escala, numa ou mais linhas. Objetivos estratégicos previsíveis, aniquilação progressiva da capacidade de combate do exército ucraniano; a reconquista das porções territoriais dos quatro oblasts anexados à Rússia e tomados pela Ucrânia após a retirada russa; a ocupação e a anexação de Odessa e de todo o território de Novorossiya à Rússia, a fim de excluir a Ucrânia do acesso ao mar.

Provavelmente, nas avaliações do alto comando russo estão presentes, e não em segundo plano, as previsões da reação ocidental a uma e outra decisão operacional russa. Continuar a guerra de desgaste permite que os líderes ocidentais adiem decisões político-estratégicas sobre escalada ou desescalada e provavelmente beneficiará a facção pró-desescalada, dando-lhe tempo para se organizar melhor, encontrar aliados, divulgar os seus argumentos.

Passar à ofensiva os força a escolher rapidamente, muito rapidamente, se o ataque pretende ter um êxito claro. A facção dos EUA a favor da desescalada continua sendo uma minoria: a situação no terreno favorece-a, mas carece do apoio aberto de pelo menos um dos mais importantes aliados europeus.

Na minha opinião, é vantajoso para a Rússia evitar uma aceleração do conflito, tanto pelos riscos de fracasso quanto pelos custos humanos - sempre associados a ações ofensivas de grande escala. Isso pode mudar por decisão do "partido da guerra" que, aproveitando um choque emocional, poderia iniciar uma participação direta e formal das forças ocidentais no campo de batalha, por exemplo, com a ação de uma "coligação de vontades" proposta em novembro de 2022 pelo General (ret.) David Petraeus. Ou seja, com tropas polacas, romenas, bálticas, que interviriam sob suas próprias bandeiras, mas não como membros da NATO, a partir de um pedido de ajuda militar do governo ucraniano: uma manobra legal para evitar o conflito direto entre a NATO e a Rússia,

Então, se eu tiver que arriscar um palpite, diria que a Rússia continuará a guerra de desgaste por muito mais tempo.

Vitória decisiva apenas para a Ucrânia. Vitória decisiva com intervenção ocidental direta. chance e probabilidade

Em suma, um ano após o início da guerra, está claro que uma vitória militar decisiva da Ucrânia sobre a Rússia é materialmente impossível, mas a ajuda ocidental pode continuar, ou mesmo aumentar, nas suas formas atuais. A situação só pode mudar com a participação direta das tropas ocidentais.

No entanto, surgiram dúvidas entre as lideranças político-militares ocidentais de que uma participação direta das tropas ocidentais na guerra não seria suficiente para garantir uma vitória decisiva sobre a Rússia. Acima de tudo, as dúvidas são militares: é por isso que a facção dos EUA a favor da desescalada se sedia no Pentágono.

Razões:

A atual estrutura militar da NATO, incluindo os Estados Unidos, não está projetada e preparada para uma guerra convencional de alta intensidade contra um inimigo capaz de travá-la, como a Rússia. Desde o fim da Guerra Fria, todas as nações da NATO reduziram drasticamente as suas forças militares, desmantelaram grande parte das suas instalações logísticas, direcionaram a construção e treino das suas forças armadas e a produção das suas indústrias militares para conflitos de curta duração contra inimigos. geralmente pertencentes ao "Grande Sul do mundo"; uma decisão inteiramente razoável, até que a NATO se opôs à Rússia, que de fato não a ameaçou de forma alguma.

A Rússia, por sua vez, estruturou as suas forças armadas e a sua indústria militar com vista a uma guerra defensiva contra a NATO, tradição histórica de um país que sempre teve de enfrentar e repelir grandes invasões ao seu território. Até agora privilegiou a defesa de último recurso, a tríade nuclear mas, como prova a guerra na Ucrânia, não abandonou a preparação convencional e está a reforçá-la. Ela também ganhou uma relativa superioridade sobre os Estados Unidos em áreas cruciais, como mísseis e defesa aérea. Leva-se anos a compensar tal deficiência.

Um rearmamento ocidental é muito difícil, o seu resultado incerto, os tempos longos. O financiamento, mesmo o crowdfunding, não chega: o dinheiro só compra o que já existe, e o que já existe não chega. Para fazer existir o que falta, é preciso primeiro determinar politicamente a estratégia de segurança coletiva da NATO, processo muito complicado e difícil também pela fragmentação dos centros de decisão.

Se o principal inimigo da NATO é a Rússia, é essencial, no mínimo e apenas para começar: construir um grande número de caças-bombardeiros para serem usados em apoio à infantaria, e capazes de sobreviver às defesas antimísseis russas; construir a infraestrutura logística necessária para uma grande projeção de forças em caso de crise, com o planeamento correspondente; lançar um grande programa de defesa antiaérea integrada do território europeu; lançar um vasto programa de recrutamento e formação de tropas, especialmente oficiais e suboficiais.

Neste sentido, há que ter em conta que a renúncia por parte dos países da NATO ao serviço militar obrigatório tem levado à perda de enormes reservas treinadas a que se pode recorrer em caso de necessidade. Basicamente, no caso de uma guerra que nos envolva (por muito tempo e com perdas significativas), mobilizações como as convocadas por Moscovo e pela Ucrânia são quase impossíveis nos países da Europa Ocidental. É bom ter em mente que a renúncia de recrutamento por parte de todos os países da NATO levou à perda de enormes reservas treinadas, às quais se poderia recorrer em caso de necessidade.

Obviamente, o envolvimento direto do Ocidente na guerra impediria os Estados Unidos de se concentrarem em conter a China, solidificaria a aliança desta última com a Rússia, exporia os Estados Unidos a uma possível guerra em duas frentes contra duas grandes potências nucleares e aumentaria progressivamente o risco das armas nucleares aparecerem no conflito.

Quanto mais direto e intenso for o conflito convencional entre as duas grandes potências nucleares como a Rússia e os Estados Unidos, mais provável é que o contendor que acredite estar sujeito a uma provável derrota decisiva, considere seriamente o uso de armas nucleares.

Igualmente óbvio, num conflito direto entre as forças ocidentais e a Rússia, as baixas ocidentais chegariam a dezenas de milhares, um custo humano difícil de justificar politicamente.

Uma armadilha dupla estratégica

Com a expansão da NATO para o Leste, e insistindo em incluir a Ucrânia, os Estados Unidos armam uma armadilha estratégica à Rússia, obrigando-a a escolher entre duas alternativas, ambas muito perigosas a médio e longo prazo: aceitar a proibição de ter uma esfera de influência e aceitar a presença ameaçadora de uma fortaleza militar ocidental no limiar da Rússia européia; ou intervir militarmente, assumindo o grave risco de um conflito com a NATO, e comprometendo as suas próprias relações políticas e económicas com a Europa. Esta é a primeira “mandíbula” da armadilha estratégica em que a Rússia entrou de olhos abertos, depois de quatorze anos tentando evitá-la.

No entanto, os Estados Unidos subestimaram seriamente as capacidades de reação e resistência militares, económicas, políticas e sociais da Federação Russa e também superestimaram tanto o prestígio dissuasor de sua força quanto a sua atual capacidade e potencial militar e económico. Portanto, eles são forçados a escolher entre duas alternativas, ambas muito perigosas a médio e longo prazo.

A primeira alternativa é a redução de danos, uma desescalada do conflito ucraniano que se traduz numa clara derrota político-diplomática, um forte descrédito dissuasivo, a possível abertura de uma crise por falhas no sistema de alianças e graves retrocessos políticos internos, por exemplo, uma grave deslegitimação geral da classe dominante.

A segunda alternativa é a fuga para a frente, uma escalada total do conflito, com a possível - na verdade provável, porque necessária - participação direta das tropas ocidentais; o risco de uma guerra convencional de alta intensidade para a qual os Estados Unidos e a NATO não estão preparados; o possível envolvimento futuro do território nacional dos Estados Unidos e, em perspectiva, a crescente possibilidade de uma degeneração nuclear do conflito.

A segunda “mandíbula” dessa dupla armadilha estratégica está agora a fechar-se para os estrategas americanos que a implementaram: eles entraram com os olhos fechados e só agora começam a vê-la.

Athes, a deusa que cega os líderes, a princípio os seduz com gestos amigáveis, mas depois os arrasta para redes onde não há esperança de fuga para eles” (Ésquilo, Os Persas, 96-100).

Fonte aqui


Nota

[1] Charap, Samuel e Miranda Priebe, Evitando uma longa guerra: a política dos EUA e a trajetória do conflito Rússia-Ucrânia. Santa Monica, CA: RAND Corporation, 2023. https://www.rand.org/pubs/perspectives/PEA2510-1.html

 Resumo do trabalho da Organização Rand: “A discussão da guerra russo-ucraniana em Washington é cada vez mais dominada pela questão de como ela pode terminar. Para informar essa discussão, essa perspectiva identifica as maneiras pelas quais a guerra poderia evoluir e como trajetórias alternativas afetariam os interesses dos EUA.

Os autores argumentam que, além de minimizar os riscos de uma escalada séria, os interesses dos EUA seriam mais bem atendidos ao evitar um conflito prolongado. Os custos e riscos de uma guerra prolongada na Ucrânia são significativos e superam os benefícios potenciais de tal trajetória para os Estados Unidos. Embora Washington não possa determinar a duração da guerra em si, pode tomar medidas que tornem uma eventual conclusão negociada para a guerra mais provável. conflito. Baseando-se na literatura sobre o fim da guerra, os autores identificam os principais obstáculos para as negociações Rússia-Ucrânia como otimismo mútuo sobre o futuro da guerra e pessimismo mútuo sobre as implicações da paz. A perspectiva destaca quatro ferramentas políticas que os Estados Unidos poderiam usar para mitigar esses obstáculos.


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GRAZIA  TANTA

Documentos e textos em:    

http://grazia-tanta.blogspot.com/                               




quarta-feira, 16 de novembro de 2022

CRÓNICA (nº10) DA IIIª GUERRA MUNDIAL: UM ASSUNTO MUITO SÉRIO

Mísseis S300 ucranianos, cedidos por ex-membros do Pacto de Varsóvia. Os sistemas antimísseis ucranianos são da era soviética; só podem operar com estes mísseis S300.


Ontem, dois mísseis disparados a partir das defesas antiaéreas ucranianas durante um ataque de mísseis russos, contra as infraestruturas elétricas da Ucrânia, numa zona próxima da fronteira Ucrânia/Polónia, aterraram em território polaco e causaram dois mortos*. Este caso foi logo tornado - pela comunicação social de massas do ocidente - num «ataque Russo contra a Polónia», o que potencialmente poderia desencadear O ALARGAMENTO/ GENERALIZAÇÃO DAS OPERAÇÕES DA GUERRA, visto que a Polónia é membro da OTAN.
As pessoas que não querem ver, não veem. Este é o resultado, ou da sua cobardia, ou por estarem nas mãos de agentes poderosos e que lhes mandam fazer e dizer certas coisas, ou por autointoxicação ideológica. De qualquer maneira, este incidente e sua falsa atribuição, poderiam significar o despoletar de um conflito direto da NATO, com a Rússia.
Ele foi rapidamente reduzido à sua dimensão verdadeira pela declaração de Joe Biden de que «tudo indica que estes mísseis tinham sido disparados partir da Ucrânia, para intercetarem mísseis russos lançados contra as instalações elétricas ucranianas».
 Os que sopram os ventos da guerra, não deveriam gozar de impunidade prática, sob pretexto de serem membros de órgãos de comunicação social. Os poderes servem-se, frequentes vezes, destes indivíduos sem escrúpulos, que por venalidade ou ideologia, se prestam a difundir «notícias» extremamente perigosas (propaganda), que podem desencadear reflexos de pânico ou de raiva, numa parte dos leitores. Podem também ser aproveitados por forças sombrias do «Estado profundo» (não apenas dos EUA, como de outros países da Aliança Atlântica), para forçarem o alargamento da guerra.

Com efeito, alguns criminosos, em posições estratégicas do aparelho administrativo, de espionagem ou militar das potências mais fortes, têm uma convicção da «inevitabilidade» de uma guerra GENERALIZADA entre a Rússia a NATO. Isso está por detrás da «lógica» deles, para incitarem posturas agressivas das potências ocidentais, para estas terem a iniciativa de um ataque nuclear. Eles contam com o «efeito surpresa». Note-se, que este incidente vem após a recente modificação da doutrina de guerra nuclear pelos EUA em que já admite, como fatores desencadeantes de resposta com mísseis nucleares, situações que NÃO envolvem ataque ou ameaça de ataque nuclear por uma potência inimiga.
Por isso, os neocons estão sempre a tentar provocar uma escalada, seja com falsas-bandeiras, seja com declarações incendiárias, para arrastar os governos a fazerem uma política de provocações e de confronto.

Os cidadãos que pensam que existe «democracia» nos países do Ocidente, estão completamente enganados. Eu concedo que existiu, mas é preciso ver a realidade de frente: Ficámos completamente destituídos de poder e somos considerados, coletivamente, como ovelhas destinadas a ser guiadas para o curral, ou para o matadouro. Todos os meios lhes servem: A desinformação, o medo, as operações de falsa-bandeira, etc.

Como tenho dito, a 3ª Guerra Mundial começou há bastante tempo, só que as pessoas não se aperceberam (foi-lhes ocultado isso) que era esse o estado do Mundo.

A IIIª Guerra Mundial, no mínimo, começou OITO ANOS ANTES da invasão russa da Ucrânia, com o golpe de 2014 de Maidan, teleguiado pelos Americanos. Em resposta, as populações ucranianas de origem russa (cerca de 40% da população) defenderam-se. Não queriam ficar submetidas ao regime nacionalista russófobo e de extrema-direita de Kiev. A encenação criminosa do abate do avião das linhas aéreas malaias MH17, destinava-se a desencadear uma resposta emocional anti- russa em todo o Mundo. Os acordos de Minsk, para solucionar a guerra civil entre o governo de Kiev e as duas repúblicas separatistas do Don, foram enterrados pouco depois de assinados, pelo próprio governo de Kiev que os assinou. Seguiu-se uma longa guerra de atrição em que as forças de Kiev causaram mais de 14 mil mortes, em grande maioria civis das repúblicas separatistas.

Sem a conivência dos EUA e doutros países da NATO, tal comportamento do governo ucraniano da altura, não poderia ter existido.

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(*)Tweet:



Jackson Hinkle 

@jacksonhinklle


Ukrainian military telegram admits that the deadly explosion in Poland was caused by a Ukrainian anti-missile defense S-300P to protect their country against Russian missile barrages.

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PS1: Em baixo, artigos da série «CRÓNICA DA IIIª GUERRA MUNDIAL»:


CRÓNICA (nº10) DA IIIª GUERRA MUNDIAL: UM ASSUNTO MUITO SÉRIO


CRÓNICA (nº9) DA IIIª GUERRA MUNDIAL: POLÍTICAS NEOLIBERAIS E GUERRA


CRÓNICA(nº8) DA IIIª GUERRA MUNDIAL - ECONOMIA EUROPEIA CAI NO ABISMO


CRÓNICA (nº7) DA III GUERRA MUNDIAL - A EMERGÊNCIA DE UM NOVO PADRÃO MONETÁRIO


CRÓNICA (nº6) DA IIIª GUERRA MUNDIAL - Os laboratorios de bioarmas dos EUA


CRÓNICA (nº5) DA IIIª GUERRA MUNDIAL: UM RESET PODE ESCONDER UM OUTRO.


CRÓNICA (nº4) DA TERCEIRA GUERRA MUNDIAL - ECONOMIA, O NERVO DA GUERRA


CRÓNICA (nº3) DA TERCEIRA GUERRA MUNDIAL - FACTOS E VISÕES QUE A MEDIA MAINSTREAM ESCONDE


CRÓNICA (nº2) DA TERCEIRA GUERRA MUNDIAL - Hipocrisias... que nos podem matar


CRÓNICA (nº1) DA TERCEIRA GUERRA MUNDIAL - MÚLTIPLOS TIROS NO PÉ



PS2: Veja como «Moon of Alabama» regista a extensão da fraude premeditada dos media ocidentais e em especial, britânicos. Acho que estão em linha com as instruções dos seus donos!

PS3: John Helmer publica no seu blog uma extensa análise do efeito que teve na sociedade e forças políticas polacas não só o trágico incidente em si, da explosão do míssil ucraniano causando a morte de dois cidadãos polacos, como - sobretudo - a atitude de Zelensky, enquanto presidente da Ucrânia, insistindo que o míssil era russo, não pedindo desculpa pelo ocorrido e ainda por cima, querendo que os polacos lhe deem acesso ao inquérito sobre o ocorrido.