A IIIª Guerra Mundial tem sido, desde o início, guerra híbrida e assimétrica, com componentes económicas, de subversão, desestabilização e lavagens ao cérebro, além das operações propriamente militares. Este cenário era bem visível, desde a guerra na Síria para derrubar Assad, ou mesmo, antes disso.

segunda-feira, 29 de maio de 2017

EXERCÍCIOS ESPIRITUAIS - 8

[*poema de «Exercícios Espirituais», 1985, Ed. MIC (Estoril)]

HAIKKU






Mirífica declinação
Subtil hecatombe
Desritmia a compasso
Arcano evidente




domingo, 28 de maio de 2017

EXERCÍCIOS ESPIRITUAIS - 7

[*poema extraído do livro Exercícios Espirituais, 1985, Ed. MIC (Estoril)]


ESCREVENDO SOBRE O RIO

Vou escrevendo sobre o rio
Estas palavras
Entre murmúrios indolentes
Logo apagadas
Pela força da corrente…

Dizei-me: Que resta
De tudo isso, afinal?
- Resta a memória difusa
De eras varridas pelo sopro
Descido das montanhas…
Eco de cavalgadas viris…

- Calem-se vozes arrotando retórica
Sobre os cadáveres dos pássaros
Regelados na neve!
- Calem-se vozes gemendo ladainhas
Sobre os espaços estelares
Chovendo pérolas entre nuvens!

Calem-se! E deixem-me ouvir
A vibrante epopeia
Que as vagas atiram às rochas
Rolando, rompendo num rugido

Rouco, raivoso de espuma!



sábado, 27 de maio de 2017

EXERCÍCIOS ESPIRITUAIS - 6

[*poema extraído do livro «Exercícios Espirituais», 1985, Ed. MIC (Estoril)]


ADVERTÊNCIA A UM DESCONHECIDO





As harpas da noite
Estão inscritas
No sangue
Dos vampiros.


sexta-feira, 26 de maio de 2017

EXERCÍCIOS ESPIRITUAIS - 5

[*Poema do livro «Exercícios Espirituais», 1985, Ed. MIC (Estoril)]


A MENINA SONHA



Moscardos felizes dormem
Sob a axila da menina
De olhos de azeviche


Enquanto sonha com a aranha
Esta vai tecendo um véu
De pérolas de orvalho
Entre as circun-
                     voluções  do cérebro


A sua respiração soergue-lhe
O peito como fole
Atiça a chama na lareira



Seus dedos, livres, acariciam panteras.


quinta-feira, 25 de maio de 2017

EXERCÍCIOS ESPIRITUAIS - 4

[* poesia extraída do livro «Exercícios Espirituais», 1985, Ed. MIC (Estoril)]

PIERROT EM  NOVA-IORQUE

  



Fulgores de néon jogam à cabra-cega
Em versão electrónica nas janelas de Time Square
Orgia de 50 000 KWH
Na tua íris noctívaga deslumbrada…

Nos para-raios dos arranha-céus
Poderás colher poeira lunar
E com nove letras FL(u)ORESCENTES
Sobre ardósia reticulada

Escrever o nome de COLOMBINA…


quarta-feira, 24 de maio de 2017

EXERCÍCIOS ESPIRITUAIS - 3

[* poema extraído do livro Exercícios Espirituais, 1985, Edições MIC (Estoril)]



A SOMBRA DE POLICHINELO

  


Fora de todas as paisagens
Resta a paisagem do olhar
Enquanto vagueias pelo quarto
Dilacerado
E a sombra te acompanha
Rindo do teu ar louco
Indiferente a sentimentos
Cínica e titubeante
Analogia do seu dono.




terça-feira, 23 de maio de 2017

EXERCÍCIOS ESPIRITUAIS - 2

[* poema extraído do livro Exercícios Espirituais, 1985, Edições MIC (Estoril)]


AS HORAS DE ARLEQUIM


Desenlacei o olhar
Da página branca
Da aurora multicolor…
Debrucei-me sobre o raio
De luz que sai de uma telha
Partida, colocada neste lugar
Não se sabe por quem, nem para quê…
Afaguei o pelo quente do meu gato
Dizendo segredos em voz alta
Mas que ninguém pode perceber
Pois partilham a sua nudez
Com os muros leprosos
Batidos pelo sol e os ventos…
Repovoei a mesa de carvões,
De sementes, de tampas de canetas,
De espátulas misteriosas, de conchas,
De cachimbos, de caixas sonoras,
E fui mordiscar uma maçã
Frente às gelosias, com poeira d’oiro
Nas pestanas…
Embati de novo contra a lâmpada
Vermelha das noites estonteadas
Pelo zumbido dos insectos…
Decifrei - a custo – uma inscrição
Gótica nos veios da madeira
Da cómoda, mas sem saber ao certo,
Se a deva tomar como um testemunho
Da progressão do caruncho,
Ou se apenas, como mais uma maliciosa
Partida do meu punhal malaio…
Finquei os dedos no dossel
Do cadeirão, apertando-o
Até ele sussurrar o nome
De São Cristóvão
Isto a propósito do debate
Metafísico
Entre os ramos das árvores
E os pardais, evidentemente…
Sorvi uns decilitros de chá verde
Com a convicção própria de quem
Mergulha num poço onde
Se reflecte o luar…

E deixei-me cair no divã
Exausto por mais esta galopada
Imóvel pelos descampados
Das alcatifas,
Por estes telhados loucos
Como teclados de órgãos
Tangidos por algum frade
Possesso do demónio…