Porém, esta é que seria a maneira correta de avaliar e compreender a inflação. Se o preço de mercadorias sobe, isso significa que aumentam as unidades monetárias para comprar as mesmas quantidades desses bens. Portanto, cada unidade monetária - sejam dólares, euros, libras, etc. - perdeu parte do seu valor, perdeu capacidade aquisitiva.
A quantidade de dólares em circulação, no mundo inteiro, é enorme: Muitos deles, são criados fora do sistema americano: São resultantes de empréstimos em dólares, efetuados nos mercados internacionais, entre terceiros, não-americanos. Em todo o mundo, os bancos, quer os comerciais, quer os centrais, têm reservas de dólares-cash. Uma parte desses dólares, está sob forma de obrigações do tesouro dos EUA, as «Treasuries». Estas, recebem um pequeno juro; o que é melhor do que ficarem grandes somas de dólares à ordem, sem qualquer juro.
Nos últimos tempos, a de-dolarização manifesta-se por um excedente de venda de «Treasuries» sobre a sua compra, nos mercados internacionais. Este desfazer das obrigações do tesouro dos EUA pode ter causas diversas: Pode um país precisar de cobrir os seus défices comerciais, usando dólares em reserva. Pode precisar de pagar juros de dívidas contraídas em dólares, ou fazer pagamentos a diversas entidades. A não aquisição - pelos particulares ou por Estados terceiros - das Treasuries postas à venda no mercado internacional, obriga a que o Tesouro americano ou o Banco Central (a Fed) as adquiram. É um facto que - devido ao estatuto de divisa de reserva mundial - os EUA podem fabricar novos dólares (sob forma digital, muito maioritariamente) para cobrir as despesas enormes do orçamento americano e também comprar Treasuries e pagar o juro das mesmas.
Porém, este jogo não poderá continuar indefinidamente. Ele é limitado, pelo menos, por dois fatores: A confiança dos compradores/detentores de dólares e de Treasuries, por um lado; por outro, chega um ponto em que são necessárias somas incomportáveis do Orçamento Federal para pagar os juros das Treasuries e a própria dívida. Não há real opção da Fed deixar de comprar Treasuries. Ela faz isso para sustentar o seu valor que, no caso contrário, desceria a pique, enquanto os juros correspondentes subiriam às nuvens.
O dólar perdeu cerca de 97% do seu valor, desde que a Reserva Federal foi criada, em 1913. Outras divisas perderam ainda mais, algumas deixaram de existir; muitas vezes, seu valor foi completamente tragado por inflação galopante. O dólar é apenas uma divisa que conserva ainda algum valor, mas somente em termos relativos às outras divisas. Estas, têm um comportamento ainda pior que o dólar.
Os défices monstros dos EUA, em termos comerciais e do orçamento de Estado, desencadeiam produções astronómicas de dólares. Ultimamente, foi atribuída a soma de cem biliões de dólares (40 biliões de $ para Israel e 60 biliões de $ para a Ucrânia ), em excesso dos 33 triliões da dívida pública dos EUA. Até agora, os dirigentes dos EUA têm acumulado dívida de forma totalmente impune. Porém, estas políticas de hiper endividamento irão brevemente tornar-se hiper inflacionárias: É que as pessoas, os Estados e as empresas deixam de ter confiança na divisa dólar e, por extensão, nos veículos financeiros denominados em dólares.
O ouro e a prata atingiram, esta semana, novos máximos e, provavelmente, irão subir muito mais. Mas, quando pensamos assim, estamos a pensar no preço dos metais preciosos em termos de divisas. Na verdade, os metais não "sobem" nem "descem", não pesam mais, nem menos, não mudam de estado da matéria, nem de propriedades físicas. Deveríamos - pelo contrário! - cotar as divisas em termos de ouro, ou de prata. Um grama de ouro custa 63,7 € hoje; o mesmo grama, há 5 anos, custava 39,8 € . Na verdade, não foi o ouro que subiu, foi o euro (ou qualquer outra divisa) que desceu, que perdeu capacidade aquisitiva. Os metais preciosos são apenas um indicador, entre outros, da perda de valor das divisas fiat.
Um sistema assim, não pode continuar por muito mais tempo. A taxa verdadeira de inflação é muito mais alta que as percentagens divulgadas nos media e nas estatísticas oficiais.
É nestas ocasiões, que costumam surgir as guerras. As guerras têm sempre causas económicas (embora também tenham outras, claro). Uma das situações económicas mais comuns, é os dirigentes estarem a braços com uma grande crise e não saberem o que fazer, para ocultar sua responsabilidade nela. Então, lançam os seus países para a guerra, o que «soluciona» as dificuldades, desviando a atenção do povo para a(s) ameaça(s) externa(s). Muita gente não vê que a miséria do seu país resulta das políticas do governo.
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*Divisas-fiat são divisas que só estão sustentadas pela crença do público na palavra das autoridades, do governo.
PS1 (28/10/23): Jim Rickards faz uma avaliação interessante da situação da economia dos EUA e mundial.
A de-dolarização resulta de muitos abusos dos EUA, em relação ao estatuto de moeda de reserva do dólar:
ResponderEliminarhttps://manuelbaneteleproprio.blogspot.com/2023/04/a-economia-global-entre-caribidis-e-cila.html
A queda do Império americano começou quando na sequência da implosão do império soviético concluiu (erroneamente) que poderia ser dono e senhor absoluto do mundo. Esta mentalidade está na origem da «weaponisation» (transformação em arma) do dólar; isto, por sua vez está na origem da de-dolarização acelerada, que muitos países estão a realizar.
ResponderEliminarA situação financeira e o estado comatoso do dólar não pedem ser melhor expostas do que no artigo seguinte:
ResponderEliminarhttps://goldswitzerland.com/debt-currency-debasement-war-the-timeless-pillars-of-failure/
A crónica de Alasdair Macleod ilustra e reforça o meu artigo acima:
ResponderEliminarhttps://www.goldmoney.com/research/war-wakes-gold-up
Interessante, sobre a utilização do dólar como arma (dos globalistas):
ResponderEliminarhttps://www.zerohedge.com/news/2023-10-24/according-putin-these-people-are-legit-legitimate-military-targets
Alasdair Mcleod sobre a distinção entre «dinheiro» e «crédito» e sobre as consequências de 50 anos (desde Nixon) de reino absoluto do dólar.
ResponderEliminarhttps://www.goldmoney.com/research/constructive-and-destructive-roles-of-credit
Jim Rickards expõe o lamentável erro em que a FED caiu:
ResponderEliminarhttps://www.youtube.com/watch?si=_bmVNavdEcLa8EXR&v=iqnIyqvLHeU&feature=youtu.be
https://www.goldmoney.com/research/playing-into-putins-hands-again
ResponderEliminarPublicado a 13/11/2023 e confirmando o essencial do meu artigo acima, de 21/10/2023