Os governos e parlamentos da UE gostam de clamar a sua fidelidade aos direitos humanos e fazem pressão sobre a China para que esta mude de política no que toca aos campos de «reeducação» do Xinquiang, onde, segundo os ocidentais, um milhão de uigures são mantidos. Mas também fazem exigências de que a China se conforme com as convenções da Organização Internacional de Trabalho e melhore as condições de trabalho nas suas fábricas.
Não serei eu a negar estas acusações contra a China. Admito que haja uma base real para elas. Não me surpreende que Pequim tenha mão pesada sobre o movimento independentista uigur, inspirado pelo fundamentalismo islâmico. Também não creio que os trabalhadores chineses tenham uma protecção adequada no trabalho, nem usufruam de reais direitos laborais, incluindo de representação sindical independente do partido comunista. Não…
Porém, há duas coisas que me incomodam…
1º Durante um período de mais de vinte anos, a China tem sido a «fábrica do mundo», exportando para todo o Ocidente, incluindo para a Europa, uma enorme gama de produtos industriais.
Durante esse longo período, os governos da União Europeia, os Parlamentos e a Comissão Europeia, foram muito mais sensíveis às GARANTIAS dos investimentos de capitais na China, do que aos problemas dos direitos humanos no «Império do Meio».
A deplorável condição de certas minorias (não apenas os Uigures) não era segredo para ninguém, tal como não era segredo a violenta repressão sobre dissidentes políticos. Sabia-se perfeitamente quais as condições de trabalho vigentes nas fábricas, incluindo nas concessionárias de marcas ocidentais, com longos turnos, sem condições de higiene, sem direitos sindicais, etc.
Tudo isto era bem conhecido e - no entanto - os responsáveis políticos e empresariais do Ocidente, acabavam sempre por fazer vista grossa, por colocar entre parêntesis tais questões dos direitos humanos, quando se tratava de negociar acordos, seguindo o pragmático princípio de «os negócios acima de tudo»!
2º No mesmo período e também antes dele, os EUA tinham um registo de direitos humanos digno de nota. Tornaram-se o país com a maior percentagem de presos, no Mundo. Desenvolveram uma indústria de exploração da mão-de-obra encarcerada. Muitos presos estavam condenados com longas sentenças, mas por crimes leves, sem proporção com a severidade das sentenças. Era preciso alimentar com mão-de-obra (escrava) a indústria prisional. É de notar que estas prisões privatizadas são altamente rentáveis, visto que estabelecem contratos com grandes firmas industriais privadas e com departamentos do Estado Federal.
Os Estados Unidos também são conhecidos por conservarem a pena de morte, abolida há muito tempo em todos os países europeus, com base em considerações humanitárias. Além disso, existe nos EUA a prática cruel de manter os prisioneiros no «corredor da morte», uma forma de tortura de longo prazo.
No «país da liberdade», o governo e o sistema judicial procuram sentenciar «por traição», para a vida inteira, Julian Assange (por sinal, um cidadão australiano), por este ter revelado ao Mundo crimes de guerra do exército americano, não por outro motivo.
Quanto a comprovadas violações de direitos humanos dos EUA no exterior, não têm conta. Mas, deveríamos começar pelos crimes contra a humanidade*, que são as agressões militares e invasões, que se repetem desde há decénios. Neste momento, estão bem presentes no Afeganistão, no Iraque, na Síria…
Perante isto tudo, seria de esperar que os defensores dos direitos humanos na Europa, exercessem uma fortíssima pressão sobre os EUA. Deveriam colocar embargos e sanções contra os sistemáticos violadores dos direitos humanos
Eu não acredito na honestidade e seriedade dos «nossos» dirigentes dos países da União Europeia, pela simples razão de que a sua política de direitos humanos não tem qualquer coerência: nem no tempo, nem no espaço.
No tempo, porque - ao longo de décadas - foram mantendo e aprofundando laços empresariais e comerciais com violadores sistemáticos dos direitos humanos, a China e os EUA, sabendo - perfeitamente - o que lá se passava.
No espaço, porque embora costumem assinalar tudo o que de errado se passa na China, fazem vista grossa, ou mesmo colaboram activamente com os EUA, que tem sido - de longe - o maior infractor dos direitos humanos.
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*Note-se que o desencadear de uma guerra é considerado, pelo Direito Internacional, um crime contra a humanidade. Este entendimento resulta dos Julgamentos de Nuremberga, em que responsáveis nazis foram acusados e condenados por terem desencadeado a IIª Guerra Mundial.
E os governos americanos, depois disso, quantas guerras e invasões desencadearam eles?
Se houvesse sinceridade dos dirigentes europeus, estes teriam feito algo: a Síria é de novo bombardeada com dezenas de mortes, pelos EUA, facilitando assim a reactivação de ISIS. Igualmente o ordenador do suplício e morte de Kashogghi o príncipe Bin Salman da Arábia Saudita, está garantido de não ter qualquer incómodo e Israel pode continuar a espalhar o medo e opressão nos palestinianos e ameaçar o Líbano, a Síria e o Irão, com perfeita cobertura...Mas, como é Biden, e o partido Democrata, eles estão caladinhos que nem ratos!
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