O vespeiro ucraniano já dura há demasiado
tempo. Uma junta tomou o poder por um golpe de Estado, infundiu o terror na
população russófona dessa ex-república soviética, desencadeou de facto a
separação tanto da Crimeia (com um processo pacífico de referendo, primeiro no
sentido de sair da Ucrânia, seguido de outra consulta para entrar na Federação
Russa), como nas províncias separatistas do Don (Donetsk e Lugansk) onde a
resistência generalizada da população, aliada com forças militares
separatistas, permitiu aguentar este tempo todo uma situação de confrontos e
provocações por parte do poder de Kiev e seus batalhões de milícias
neo-fascistas.
O
incidente envolvendo barcos de guerra da marinha ucraniana no estreito de Kerch (águas
territoriais russas) em Novembro de 2018, foi claramente uma manobra ordenada
por Poroshenko, o presidente ucraniano do regime suportado pelos EUA e seus
súbditos da NATO.
Poroshenko
tem estado a atiçar a guerra, porque, segundo os acordos de Minsk, a Ucrânia
é obrigada a organizar eleições nos
primeiros meses do próximo ano e as sondagens (de institutos
pró-ocidentais) dão a Poroshenko um nível de popularidade da
ordem de 8%. Por isso, a sua salvação seria a declaração de uma guerra, quer
com a Rússia, quer com as Repúblicas separatistas. Só assim teria possibilidade
de adiar as eleições «sine die», de escapar ao veredicto das urnas.
A
desinformação, no Ocidente, sobre o que se passa na Ucrânia, torna extremamente
difícil um debate sereno nos países da NATO. Isto, admitindo mesmo que se trate
de pessoas minimamente respeitadoras dum pluralismo político, devido ao
black-out informativo e à distorção das informações pela media.
Acontece
que quase ninguém admite estar mal informado sobre um assunto, ora as
informações que quase todos recebem são apenas formas encapotadas de propaganda
de um dos lados...
Nós
todos, no Ocidente somos matraqueados pela propaganda disfarçada de
«informação», que pinta sempre a Rússia como o «Reino do Mal», a força
agressora, ameaçadora da estabilidade e dos processos democráticos, etc.
Além de
ser típico dos imperialistas e seus vassalos de declarar os opositores como
fautores daqueles crimes que, na verdade, são apanágio deles próprios, esta
barragem de mentiras (como dizia Goebels, ministro de Hitler, «uma mentira
contada mil vezes, soa a verdade») tem a função de ostracizar todos os que
querem introduzir dados objectivos no debate. São neutralizados , nos
«democráticos» países ocidentais, como sendo «partidários» de Putin.
A
guerra é um negócio para grandes empresas do armamento e também é um meio para
os poderosos se manterem no poder, pelo reflexo de medo nas populações, face ao
inimigo (real ou imaginário).
Na
época da Primeira Guerra Fria (1947-1989), a situação de medo permanente fazia
com que não fosse possível - nos EUA e muitos países do Ocidente -
fazer-se um debate público com elementos críticos da política atlantista.
Tais
elementos eram logo acusados de «fazerem o jogo dos soviéticos» e isto, mesmo
quando não se podia, por suas posições passadas e presentes, ter suspeitas de
que tivessem simpatia pelo comunismo!
Agora,
o «reflexo condicionado» foi reactivado (o inimigo soviético passou para
russo), sendo que a concentração dos media em muito poucas mãos, torna
praticamente impossível que o debate sobre a guerra e a paz tenha condições de
acontecer (o que tem havido, são «debates» entre aqueles que estão todos
basicamente do mesmo lado!).
A
sociedade e a cidadania do «ocidente» são portanto mantidas no limbo, numa
menoridade mental propositada, são interditas na prática de debater as grandes
questões. Somente lhes é permitido debater «assuntos de sociedade» e estes, de
maneira falsa, artificialmente empolada, como a sexualidade,
por exemplo.
A maior
parte das pessoas não possui um grau de informação suficiente, para perceber
que o mundo de hoje está verdadeiramente interligado. Senão, teriam
compreendido (entre muitas outras coisas), que a crise dos refugiados, vindos
do Norte de África e do Médio Oriente, foi desencadeada em resultado da guerra
levada a cabo pelas forças armadas dos países da NATO (caso da Líbia), ou pelas
forças djihadistas (na Síria) que recebiam todo o tipo de apoio do Ocidente e
regimes árabes «amigos» (os mais reaccionários, por sinal).
Hoje em
dia, a austeridade que é erigida em política oficial da União Europeia
aplica-se apenas aos pobres, aos trabalhadores, aos que estão dependentes do
«Estado social».
Esta
austeridade cessa, milagrosamente, logo que se trata de reforço de armamento e
de tropas, de construir forças armadas capazes de
enfrentar inimigos poderosos (leia-se a Rússia, claro) e constituir o pilar
europeu da NATO, com maior «autonomia» e maior participação financeira
dos países europeus.
Entretanto,
em Portugal, por exemplo, os salários da função pública estão praticamente
congelados desde antes da grande depressão de 2008. O efeito deste congelamento
sobre a população é dramático, pois o seu poder de compra desceu para cerca de
metade. Nestes 10 anos, a inflação foi sistematicamente sub-avaliada pelo
governo e pelos organismos oficiais.
O nível
económico dos reformados passou de mau, a muito mau, numa vasta maioria: não
houve actualização das pensões de reforma, mas antes um subtrair do poder de
compra das mesmas, por vários mecanismos, incluindo impostos e taxas.
A minha
sugestão é que as pessoas pensem, quando lhes vierem com discursos ocos sobre a
«Paz e a Fraternidade», típicos desta quadra natalícia, que os gastos de
Portugal em armamento e material militar e com reforços de pessoal, tudo
somado, se fossem aplicados nos ordenados e pensões, iriam devolver o poder de
compra aos trabalhadores e reformados portugueses.
Perante
um povo dócil e conformado, o bem estar económico dos 90% não é sentido como
prioridade pelos poderosos (altas patentes militares, políticos, empresários). Mas
sem um retomar do poder de compra de 90% da população, é impossível o
crescimento da economia a longo prazo. A bonança do turismo é temporária; numa
crise, que não tarda a chegar, será anulada.
O que é
que isto tem a ver com a Ucrânia? Obviamente, a instabilidade causada pela
NATO, nas fronteiras da Rússia, tem como efeito que os povos são chamados a
«fazer sacrifícios perante a ameaça».
Mas não
devíamos nós estar antes mobilizados para varrer as maiores ameaças, os
industriais do armamento, os generais da NATO, os governos lacaios do grande
capital?
Esta
casta toda não hesitará em arriscar a nossa pele... além de
pôr as nossas economias a saque, sob pretexto de lutar contra os tais
«inimigos» que não são os nossos, mas apenas deles e dos seus chefes?
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