PÁGINAS SOBRE MÚSICA

quinta-feira, 1 de novembro de 2018

DO NEOLÍTICO À IDADE DO BRONZE (PARTE IV *)

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                 Carro da idade do bronze, com c. 4000 anos

Se a sequenciação completa do genoma humano trouxe uma série de surpresas (mas isto seria tema para outro artigo) a descoberta de ADN antigo de várias proveniências e o seu relacionamento com o ADN das pessoas contemporâneas tem um papel igualmente desestabilizador relativamente às «certezas» das origens deste ou daquele povo. 
Hoje, iremos ver como é que um povo - os yamnaya - oriundo de uma zona entre as montanhas do Cáucaso e o Mar Negro, chamada o Ponto, se expandiu há cerca de 4500 anos atrás, espalhando os seus genes - como comprovado pelo ADN antigo - mas também a sua língua, o proto-indo-europeu, de onde derivaram quase todos os idiomas actuais da Europa e também do Próximo-Oriente, da Pérsia e do Norte da Índia.
Com efeito, contrariamente ao que se pensava, o modelo de transformação de uma cultura noutra por influências, «continuísta», não é o mais adequado, sendo antes a ruptura decorrente de invasão e conquista, uma modalidade de transformação que se afirma cada vez com maior nitidez, à medida que o ADN antigo vai sendo mais utilizado nos estudos.
Segundo os estudos com ADN antigo, os haplotipos autóctones (presentes no cromossoma Y) são substituídos, há cerca de 4500 anos atrás, seguidos de transformações em muitos aspectos tecnológicos, como as cerâmicas cordiformes, sepulturas de novo tipo, formando pequenas colinas artificiais e rituais diferentes de sepultamento, sepulturas individuais em vez de colectivas. Tudo o que se conhece nesta transição, indicia uma mudança de uma sociedade relativamente igualitária, para uma fortemente hierarquizada. 
Esta modificação teria mesmo sido acompanhada pelo desaparecimento completo dos autóctones do sexo masculino na Península Ibérica, como refere David Reich (1).

A domesticação do cavalo (2) e a utilização da roda radiante (ao contrário da roda de madeira sólida) tornando mais leves e ágeis os carros de guerra, terão sido os meios que permitiram a rápida conquista dos Yamnaya. 
Eles invadiram em ondas sucessivas, ultrapassando as grandes estepes e planícies a leste do Danúbio e do Elba, até ao Oeste do continente europeu, até o Atlântico. A data da conquista de Península Ibérica terá sido um pouco mais tardia, mas nem por isso foi menos avassaladora, ou mesmo, brutal.  
As hostes eram compostas essencialmente por homens; as mulheres não seriam mais do que um décimo da população em migração. Sabemos isso, pelo rasto do ADN antigo de haplotipos de  mulheres yamnaya, em populações europeias ocidentais após a invasão.
Houve portanto formação de descendentes híbridos entre homens yamnaya e mulheres autóctones. 

Note-se que ocorreu outra substituição de haplotipos típicos de uma população masculina autóctone de caçadores-recolectores, com aparecimento de novos haplotipos, oriundos de populações que já praticavam agricultura, muitos milénios antes (cerca de 10 mil anos antes do presente), aquando da transição do Paleolítico tardio para o Neolítico. Na Península Ibérica, o processo terá ocorrido há cerca de 8000 anos, bastante mais tarde que em relação ao centro da Europa. 
As migrações que espalharam as culturas do Neolítico na Europa deixaram rasto nos ADN dos cromossomas Y: verifica-se uma substituição não a 100%, mas da ordem de 80%. 
Por contraste, nas invasões do fim da idade do cobre (Calcolítico), início da idade do bronze, observa-se uma substituição total dos haplotipos anteriores (masculinos). Os especialistas em dinâmica populacional (3) da antiguidade colocam portanto a hipótese de que existiu uma guerra de extermínio e escravização dos sobreviventes, com tomada das mulheres dos povos submetidos pelos guerreiros invasores.

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Não sou a pessoa indicada para escrever em detalhe sobre as mutações (4) que sofreu o continente europeu, ao longo dos milénios do que se convencionou chamar a pré-história. 
Apenas gostava de chamar a atenção para o facto de haver muitas culturas esquecidas do grande público, do imaginário colectivo, apenas estudadas pelos eruditos. Mesmo as várias narrativas da antiguidade, que referem povos como os «filisteus» (Bíblia), ou os «troianos» (Ilíada), têm contribuído para uma visão parcial dos mesmos; só agora, com a arqueologia contemporânea, podem ser plenamente reavaliados. 



(1) A genetic analysis has revealed that, about 4500 years ago, part of southern Europe was conquered from the east. In what is now Spain and Portugal, the local male line vanished almost overnight, and males from outside became the only ones to leave descendants.
David Reich of Harvard Medical School in Boston, Massachusetts presented the results on Saturday at New Scientist Live in London, UK.
https://reich.hms.harvard.edu/

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