Nos inícios do novo
milénio, uma viva polémica eclodiu no mundo da paleoantropologia. Com
efeito, a descoberta do «Hobbit», assim alcunhado pois era um hominídeo de
dimensões anãs, dividiu a comunidade científica em dois campos antagónicos:
- os que pensavam
ser um Homo moderno (o fóssil único encontrado foi datado com a idade de 17 mil
anos, portanto contemporâneo dos Homo sapiens modernos) mas sofrendo de uma
patologia. Eles viam neste fóssil «deformações» semelhantes a vários casos conhecidos de
nanismo;
- os que pensavam estar-se
perante uma nova espécie do género Homo, aparentada com Homo erectus. Os
traços que alguns atribuíram a uma forma nanismo, eram simplesmente características ancestrais.
O «Hobbit» teria sobrevivido durante muito tempo, pelas condições de isolamento
especiais que a Ilha de Flores (na Indonésia) possui.
Agora está
definitivamente demonstrado que H. floresiensis é uma espécie verdadeira. Não é
um caso de patologia isolado e que teria sido fortuitamente fossilizado. As escavações recentes datam os fósseis H. floriensis recentemente encontrados de mais de 700 mil anos.
O «Hobbit» teria
derivado de H. erectus, presente na região. O primeiro fóssil de H. erectus foi
descoberto em Java no séc. XIX e está datado de cerca de 800 mil anos. Existem
outros fósseis destes hominídeos, noutras regiões do Extremo Oriente, ainda
mais antigos. Pensa-se que esta espécie de hominídeos saiu de Africa há cerca
de 1,5 milhões de anos, colonizando muitas partes do continente asiático.
A importância
genérica da redefinição do que se entende por «ser humano» nunca poderá ser demasiado enfatizada.
Somos
muito influenciados por estereótipos sociais e a nossa imagem dos outros e das
sociedades é - muitas vezes - uma projeção dos nossos mitos.
Aos mitos da origem, presentes nas narrativas religiosas, em todos os povos, substituiu-se, a partir do século XIX, uma narrativa dita científica das origens da
humanidade.
Sem dúvida, a revolução
epistemológica do darwinismo contribuiu muito para isso. Porém, acontece que certas ideias têm imenso sucesso e logo são apropriadas, distorcidas, adulteradas, etc. ... para
satisfazer as agendas particulares de políticos demagogos. O que o público
«sabe» do darwinismo, não é mais do que uma série de clichés, ou seja, de ideias muito
genéricas e falsas. São formulações de tal modo simplistas, que se pode seguramente afirmar que não correpondem - de facto- ao pensamento do próprio Darwin.
Pegar numa frase,
distorcê-la, isolá-la do contexto em que foi pronunciada ou escrita, é
ideologizar, não é fazer «divulgação científica». Muitas vezes deparo-me com um chorrilho de ideias-feitas a propósito da evolução, em particular da
evolução humana.
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