From Comment section in https://www.moonofalabama.org/2024/03/deterrence-by-savagery.html#more

The savagery is a losing card. By playing it the US and the West are undercutting every ideological, normative and institutional modality of legitimacy and influence. It is a sign that they couldn't even win militarily, as Hamas, Ansarallah and Hezbollah have won by surviving and waging strategies of denial and guerilla warfare. Israeli objectives have not been realized, and the US looks more isolated and extreme than ever. It won't be forgotten and there are now alternatives.
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segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

O TERRAMOTO, NA FILOSOFIA, NA TEOLOGIA E NAS ARTES

Vem esta crónica a propósito da exposição «anatomia de uma pintura» (1) que está em exibição no Museu Nacional de Arte Antiga.  

                                  

Esta pintura do célebre pintor da época, João Glama (c.1708-1792), descreve a sua memória do que presenciou; é o melhor testemunho directo, visto que não existia fotografia, nem registo sonoro, apenas os esquissos de artistas poderiam dar conta, para as gerações futuras, da catástrofe e das suas consequências.

                      

Para além do momento, para além da geografia, este terramoto, marcou uma ruptura. 
Por essa altura, a intelectualidade erudita da Europa, aquela que «pensava o mundo», estava envolvida em polémica, uma guerra de ideias. 
Os autores libertinos de espírito, mais ou menos deístas (como Voltaire) ou mais ou menos ateus (como Diderot), esgrimiam-se contra a Igreja católica e contra a religião instituída, em geral. 
Tudo servia como argumento para destronar as visões teológicas de uma «Causa Divina» ou «Providência», para os acontecimentos deste mundo. 
Voltaire difundia, nos seus panfletos, a ideia de que Deus fez o mundo, como uma máquina, dotada de leis maravilhosas e simples, como ensinara Newton, mas não se inquietou em o manter em funcionamento (a metáfora do Grande Relojoeiro). 
Outros, clandestinamente, tentavam provar que não existia Deus, que o Universo se poderia explicar simplesmente pelas forças materiais e pela conjugação dos átomos, retomando o modelo do atomismo grego (Demócrito) e tentando demonstrar que não é necessária a hipótese de Deus para compreender o mundo, que todos os fenómenos tinham uma causa natural.
Aquando do Terramoto de Lisboa, acontecimento terrível que parecia castigar sem piedade um reino inteiro e sua população, logo saltaram os habituais predicadores da moral dizendo que se tratava de um castigo, da «Providência divina». 
Nessa ocasião, a crença em Deus ainda estava profundamente ancorada nas mentes da pessoas. Não era como agora, em que acreditar em Deus e afirmá-lo é quase um acto heróico, pelo menos em certos meios. 

Leibniz salvaguardava Deus no concerto universal, afirmando que tudo estava feito desde o início, segundo «o melhor dos mundos possíveis», projectando a Providência divina para a eternidade, pelo que aquilo que nos pareciam crueldades e imperfeições da Natureza, na realidade, não o eram, mas apenas consequências, fenómenos inevitáveis da divina obra global, mas cujo plano e desígnio estavam para além da humana compreensão.
O debate entre filósofos centrava-se em torno da questão de saber se existia, ou não, uma «divina providência» e o terramoto de Lisboa serviu como argumento, pela impressão profunda de horror, de absurdo existencial («avant la lettre» !) que se desprendia de tal destruição. 
Não! A Natureza, nem sempre era boa e generosa, também era capaz de - num instante - destruir vidas inocentes, de riscar povoações inteiras do mapa, transformar em montão de ruínas as cidades mais formosas.

Carlos Maria Bobone escreveu um artigo (2) bastante aprofundado, muito legível, sobre esta relação do debate filosófico no século das luzes com o grande terramoto de Lisboa de 1755.

Embora de um período mais tardio ( cerca de 1790), a peça para órgão de Mozart (3), pode ilustrar este tema, pela profundidade trágica que emana dos seus acordes.


    
  

Mozart era mação, tinha uma visão da Divindade  como «O Grande Arquiteto». Deixou-nos, além dessa obra-prima imortal, A Flauta Mágica, algumas obras abertamente maçónicas, destinadas a lojas que frequentava. 
Viena dessa época era tanto mais tolerante para com a maçonaria, que ela estava imiscuída nas mais altas esferas do poder político. 
Porém, Mozart não renegou o catolicismo; deixou-nos muita música sacra em conformidade com o rito católico, de profunda inspiração espiritual.



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(1) http://www.museudearteantiga.pt/exposicoes/anatomia-de-uma-pintura

(2) http://observador.pt/especiais/terramoto-de-1755-a-tragedia-que-arrasou-lisboa-e-tambem-mudou-o-mundo/

(3) https://www.youtube.com/watch?v=Q9WHeha80RA