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sexta-feira, 1 de março de 2024

Vem aí o CIRCO ELEITORAL


A realidade do Mundo não se conforma com narrativas. Mas, as narrativas envolvem, na sua teia, as mentes embotadas que já não conseguem ler o real, que não distinguem os discursos, das realidades. Estão nesta condição muitas das gentes partidárias de esquerda ou de direita, sejam crentes em religiões ou ateias, pelo que a comunicação social de massas tem a sua tarefa facilitada: grande parte das suas almas cativas já não percebe nada. Elas são piores que criancinhas, pois estas últimas (teoricamente), podem ser ensinadas a ver a realidade.


O público adulto das ditas «democracias», tornou-se de tal maneira cobarde, que prefere não ver a realidade. Assim, não terá que agir, de uma ou outra forma, perante essa realidade. Creio que este é o maior bloqueio das sociedades contemporâneas. Seus cidadãos foram enredados em teias de falsidades, numa série de novelos cujos fios têm de ser pacientemente separados, um a um. Isto equivale a dizer que a quase totalidade dos súbditos modernos não será capaz de se desembaraçar sozinho das cadeias que os prendem.
Mas, esses súbditos não sabem. Pois as cadeias não são físicas, mas são mentais; é mais fácil para eles pretender que não existem. Assim, não terão o trabalho e a angústia de enfrentar a «gigantesca tarefa». Ou antes, a tarefa, que é afinal muito simples, em si mesma. Mas, isto tem de ser ocultado, senão os súbditos poderiam começar a libertar-se em massa da «matrix» em que estão enredados.
Entra aqui o medo: o medo paralisa o juízo crítico. Impede as pessoas de se interrogarem sobre as suas experiências. Torna as pessoas abúlicas, distraídas e passivas. Verifica-se como têm sido vãos os esforços para despertar estes pacientes do estado de hipnose cognitiva em que se encontram. Estes esforços são derrotados pelas estratégias de evitação e denegação, desenvolvidas pelos próprios. A chamada «cultura de cancelamento», afinal, reduz-se a isso. Uma autoritária negação de se exprimirem pontos de vista diferentes da norma, sob pretexto de que são «agressões», de que aumentam «o estresse» ou que vão contra o «politicamente correto». Note-se que este tipo de comportamento não tem nada que ver com direitos humanos básicos, nem liberdades fundamentais: porém, as pessoas estão tão alienadas, que esperam que os poderes as livrem do confronto penoso com outra narrativa, diferente e contraditória com aquela em que banham. Cúmulo da contradição, essas tais pessoas, que apelam ao controlo autoritário sobre os diversos canais de comunicação, clamam que estão a defender a democracia e a liberdade, os direitos civis, quando estão a realizar exatamente o contrário. Não creio que se possa esperar grande coisa de pessoas assim. Vão continuar no registo estritamente egoísta, míope, cheias de medo de serem vistas como saindo fora do rebanho. Nestes casos, apenas um choque emocional muito forte poderá fazer despertar tais indivíduos, fazê-los ver que estavam na ilusão. Mas, mesmo isso não é garantido pois, consoante a sua personalidade, o choque emocional poderá desencadear ainda maior inibição. Poderão, por exemplo, se auto- culpabilizar dos males que lhes acontecem, em vez de se libertarem das vendas que lhes tapam os olhos.
O plantar duma convicção, que pode ser absurda ou sem qualquer substância racional, é possível e corriqueiro na sociedade: Fizeram-se experiências de psicologia social, em que pessoas são persuadidas da veracidade duma teoria errada. Depois delas estarem convencidas, é-lhes demonstrado racionalmente que essa teoria estava errada. O descolar da convicção anterior de que a dita teoria era verdadeira, é muito mais lento neste grupo de pessoas, do que no grupo de controlo, ao qual não se lhes foi apresentada previamente como verdadeira, tal teoria. A estes, é-lhes exposta a teoria, mas conjuntamente com a explicação porque a mesma é falsa. Este grupo de controlo aceita muito naturalmente a falsidade da referida teoria. Porém, no grupo que ficou previamente persuadido da verdade da teoria, há indivíduos com dificuldade em estruturar o seu pensamento de outro modo, para aceitar que afinal a teoria era falsa. Isto não acontece porque as pessoas sejam «estúpidas» ou «teimosas». Esta situação ocorre com todos os tipos de pessoas, incluindo mentes brilhantes, cultas, com contacto com as ciências.
Portanto, é um mecanismo psicológico profundo, aproveitado pelos que querem moldar as nossas opiniões através dos «mass media» ao serviço dos poderosos. Eles sabem utilizar esta e outras propriedades curiosas da mente humana.
É possível que tal controlo exercido sobre o nosso espírito seja combatido e de forma eficaz. Mas isso implica haver consciência, além da noção clara e não ingénua, dos mecanismos que são aplicados. Há pessoas que conseguem evadir-se deste condicionamento mental abusivo, mas são poucas. A imensa maioria pulsa de acordo com as paixões primárias: A salvaguarda do ser físico, a satisfação das necessidades primárias em alimento, abrigo e segurança, essencialmente; ou ainda, necessidades afetivas e sociais como o amor, a estima, a proteção, o reconhecimento social. O ódio contra o inimigo, seja ele real ou não, entra revestido como salvaguarda do indivíduo. O inimigo é visto como aquele que põe em risco (de forma real ou fictícia) a satisfação das necessidades enunciadas acima.
A um certo nível, o medo é importante para a sobrevivência. Trata-se dum sentimento profundamente ancorado na nossa biologia. O indivíduo que não tem medo está muito mais exposto, do que aquele que - ocasionalmente - pode ter medo, mas que o consegue superar, para enfrentar o risco.
Todos os mecanismos psicológicos, na publicidade comercial, envolvem componentes profundos dos nossos desejos "animais": necessidade de afeto, de status, de prazer sexual, etc. Em geral, os mecanismos de comunicação na esfera política fazem intervir aqueles mesmos componentes atrás referidos, juntamente com o medo, que entra em combinação com os outros.
Na política, convencem-se os adeptos de que é preciso odiar intensamente o inimigo; sobretudo, é preciso convencê-los de que os sentimentos dos dirigentes espelham os dos militantes de base. Os mecanismos de identificação e reforço fazem-se através de objetos de ódio/medo comuns. Isto acontece perante uma imagem da realidade distorcida, falseada: Face a tal configuração psicológica, o que os dirigentes fazem, constantemente, é ativar e reforçar, nos seus seguidores, os sentimentos doentios de ódio, de vingança, de desprezo, de superioridade... A política, assim vista e praticada, não é mais do que uma forma larvar ou efetiva de guerra civil. É uma representação, também. É um teatro que os eleitores são supostos seguir, com os seus golpes, escândalos e revelações-surpresa. Nada de positivo pode sair da política-espetáculo: No melhor dos casos, trata-se de narrativas, juntamente com um rol de boas intenções, para apresentar aos cidadãos.
O discurso político é feito para adormecer o espírito crítico e estimular os desejos mais obscuros do eleitor: A projeção de suas frustrações e seu desejo de vingança simbólica, ou real, sobre o grupo de indivíduos percebidos como opositores, como obstáculos, como sabotadores, etc.
A única maneira de sairmos da «gruta», é percebermos que vivemos no seu interior; que as imagens com que nos entretêm, são projeções fantasmagóricas dos nossos medos; que este espetáculo nos é oferecido, para não despertarmos da letargia ou hipnose, mantendo-se assim o grupo restrito ao comando "da barca". É isso, no essencial, a política.
Não pode haver uma política de adultos feita para adultos, enquanto o povo se deixar tratar e levar, como se fosse uma criança. O povo tem o potencial para despertar e começar a auto- governar-se sem a casta de parasitas que nos quer domar através das suas demagogias, da política-espetáculo, das manipulações do aparelho de Estado, para obter o poder. É o poder, acima de tudo, que interessa aos sociopatas que nos governam. É este o fim último dos seus esforços: conquista e conservação no poder.
As eleições, que passam por ser o aspeto central da democracia, não são mais do que a ocasião dos bandos políticos desenrolarem seu estendal de demagogia para cativar os eleitores: Tudo é utilizado como pretexto para o show, menos as questões de real importância para os destinos do país! Ou, ainda, a valorização de pseudo- soluções para os problemas, como se tudo se resumisse a tais «soluções», sendo eles - os do bando X - os únicos capazes de as viabilizar.
Em qualquer dos casos, o circo eleitoral infantiliza o eleitor, promove a sua regressão ao estado de criança, a quem as várias propostas são apresentadas e ele só tem de «escolher». Mas, neste processo, o eleitor «é quem menos ordena»: é o pobre diabo enganado, desta triste comédia. Seus desejos e as promessas de os satisfazer são logo esquecidos, assim que se fecham as urnas. A partir deste momento, os políticos profissionais irão dar «uma lição de realismo» ao povo. É aqui que se vai revelando, aos poucos, o verdadeiro programa, aquele que os vencedores irão desenvolver no governo. Durante a campanha eleitoral foi mantido cuidadosamente fora do olhar do vulgo, pois possuía demasiados amargos de boca para o povo e muitas benesses para os privilegiados.


Manuel Banet

 Parede, Portugal, a 01de Março de 2024

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terça-feira, 27 de fevereiro de 2024

A DEMOCRACIA PARLAMENTAR É UM LOGRO

 Praticamente todas as pessoas se conformam com este estado de coisas. Mas, quase todas, tecem severas críticas ao funcionamento do regime de partidos e aos efeitos desse regime sobre a «moral pública», ou seja, quase todos estão de acordo que a democracia parlamentar tem como corolário, a corrupção.

 Porém, eu vou mais longe que esta constatação banal de que existem políticos corruptos em todos os países onde haja democracia parlamentar: Eu nem sequer considero esta corrupção como inerente à natureza humana. Se assim fosse, teríamos de aceitar que não existe possibilidade nenhuma de haver democracia genuína, seja parlamentar ou outra. 

Não; eu assumo que existem determinadas formas de organização do poder político que convidam à corrupção; que são mesmo, estruturalmente, formas corruptas, em si mesmas, até quando seus protagonistas não tenham pessoalmente cometido atos de corrupção, ativa ou passiva. 

A democracia parlamentar assenta sobre o princípio da representação. Mas, este princípio é viciado, se não for complementado pelo princípio de responsabilidade. 

O que entendo por esta expressão? Responsabilidade, por aqueles que votam uma lei ou medida, das suas consequências; se votaram algo que vai contra o programa eleitoral, ou que contradiga as promessas feitas aos eleitores, estes deputados devem demitir-se ou ser demitidos, porque traíram a confiança dos eleitores. Para isso, tem de haver uma espécie de assembleias permanentes, onde os deputados venham prestar contas aos seus respectivos eleitores. 

A proximidade dos deputados aos seus eleitores respectivos não será fácil. Costuma-se objetar com o facto do poder legislativo ser de representação nacional. Note-se que existe a possibilidade de se fazer um sistema em patamares, em que o patamar mais na base - com um número de membros que coubesse numa grande sala pública - discutiria os assuntos em agenda. Dessa discussão, iria resultar uma orientação, que seria levada para a assembleia de grau intermédio, composta por mandatários escolhidos pela base. 

O desenvolvimento dos meios tecnológicos veio proporcionar que tal sistema se instalasse na sociedade, se tal fosse a vontade política da grande maioria. Hoje em dia, a tele- conversa, o voto eletrónico, etc. são meios de viabilizar, de remover os obstáculos a uma democracia descentralizada, direta: É perfeitamente possível, se as pessoas quiserem. Mas, nesta sociedade tecnologizada, também há grande inércia, indiferença e ignorância, que se conjugam para obstaculizar tal mudança. Não há dúvida de que tal é desejado e estimulado pelo sistema. 

De qualquer maneira, o que se verifica é o afastamento da pessoa comum em relação à política. Os chefões dos partidos, os funcionários e os ativistas partidários, adoram isso, pois só desejam que o cidadão comum «participe» com o voto. A fraude é muito clara; participar não é votar. Votar só pode ser assumido como participação ativa, se associado a um conjunto de reflexões e de ações políticas dos cidadãos. 

Num sistema de democracia direta, em que os cidadãos tenham voz nos assuntos que afetam suas vidas, as questões serão debatidas entre eles - de diversas maneiras - e, portanto, haverá uma participação natural e não forçada, num referendo, local, regional ou nacional, ou numa proposta de lei. 

Fosse a participação das pessoas efetiva, isso equivaleria a dizer que a ação dos deputados eleitos, ou de agentes políticos, assim como das instituições, estaria sempre sob escrutínio, que haveria conhecimento sobre quais as medidas votadas e estas seriam comparadas aos programas eleitorais respetivos. Não seria uma democracia perfeita; mas a componente de participação iria dar o controlo efetivo dos eleitos, pelos eleitores. 

Quando a democracia não é compreendida como uma efetiva participação dos cidadãos, incluindo na criação das leis, mesmo que este processo envolva várias etapas, acaba por se transformar numa competição entre as diversas «elites» pelo poder: Interiormente aos partidos e entre os diversos partidos. 

Pode-se imaginar todos os golpes baixos aplicáveis e aplicados, numa luta sem quartel, contra os próprios colegas de partido, já para não falar dos adversários. A demagogia torna-se a arma principal. O engano, a falsidade, estimulam os instintos mais baixos dos eleitores; são estes truques que mais «rendem», em termos eleitorais. O terreno político é propício às demagogias, ao ódio, à ganância, ao racismo, à vaidade. Quem tiver menos escrúpulos, mais indiferentismo moral, é quem triunfa, dentro deste sistema. Há um favorecimento dos sociopatas, dos psicopatas, para ascenderem na hierarquia dos partidos e dos cargos públicos.

Nem sequer abordarei aqui as problemáticas da educação e da informação, que deveriam ser não enviesadas, não controladas por monopólios. Toda a média de massas está ao serviço dos interesses capitalistas e especializada em fazer lavagens ao cérebro do público. No seu conjunto, existem muitos elementos que fazem com que este tipo de «democracia» parlamentar seja uma farsa.

De qualquer maneira, não conheço nenhum exemplo na História em que uma classe, ou grupo poderoso, esteja no poder e conforme-se com ser retirada do poder. As eleições são a possibilidade de alternância consentida pelo sistema, no seu interior, não existe alternativa senão de fora, senão derrubando as instituições caducas, viciadas, feitas para favorecer um restrito grupo. 

O problema, que não é equacionado devidamente pelos marxistas-leninistas, é que a instauração de um novo poder só se pode efetuar pela violência, sendo impossível graduar ou classificar essa violência, como legítima ou ilegítima, sendo essas tentativas classificatórias meras capas verbais para legitimar o poder ditatorial. 

Historicamente, os bolcheviques e até alguns anarquistas, seguiram a palavra de ordem de Lenine, de tomada do Palácio de Inverno, para descobrir, pouco depois, que - eles também - acabaram sendo triturados pela máquina de poder instaurada. 

Depois, os herdeiros da IIª Internacional (os partidos socialistas), sobretudo depois da IIª Guerra Mundial, foram os gestores do capitalismo (por ele instalados). Deve-se-lhes o chamado «Estado de Bem-Estar» ou «Estado Social». Os comunistas, com algum atraso, também se amarraram ao barco do parlamentarismo, sendo eles agora, outra versão, «mais à esquerda» da social-democracia. 

Neste momento, em Portugal, a deceção e a ausência de formação dos trabalhadores estão na origem da subida espetacular de intenções de voto num partido de extrema-direita. Tal como noutros países europeus, estes partidos têm sido apoiados discretamente pela burguesia, não porque ela se identifique com as suas fórmulas e programas, mas porque lhes permite fazer uma política muito direitista, com a ameaça implícita de que «se não formos nós, serão eles». 

O centro, em Portugal, é constituído por dois partidos, que têm nomes que em nada correspondem às suas políticas (partido «socialista» e partido «social-democrata»): Estão permitindo e até favorecendo o tal «monstro» da extrema-direita, assim como o fez François Mitterrand, ainda nos anos oitenta, ao permitir que o Front National de Jean-Marie Le Pen se fosse apresentar nas eleições. 

Enquanto a classe trabalhadora não gerar a sua própria democracia, com critérios próprios,  exercida através de assembleias (onde não haja capangas a comandar quem tem a palavra e indicando quais são os «bons» e os «maus»), ela será joguete de forças partidárias exteriores.  

Preconizo uma forma de sindicalismo e de cooperativismo entre os trabalhadores, em que eles possam realmente manter o controle das organizações em suas mãos. Que estas não se tornem «correias de transmissão» de partidos, como tem sido demasiado frequentemente o caso, em Portugal, nestes 50 anos depois do 25 de Abril

A democracia parlamentar é sempre feita de acordo com a vontade da classe dominante, que a «inventou» e manipulou, de forma a que ela servisse os seus interesses. A democracia proletária, no sentido amplo, é baseada na pertença a um grupo socioprofissional e à adesão a formas de participação igualitária, na deliberação e tomada de decisão, assim como no controlo, pela base, dos mandatários escolhidos.


domingo, 3 de dezembro de 2023

SE ESTAMOS A VIVER NUMA ÉPOCA EXCECIONAL...

 Se estamos a viver numa época excecional, então devemos cuidadosamente rever todos os conceitos aos quais estávamos mais ligados. Devemos analisá-los criticamente, à luz das realidades emergentes e ver quais os que podem ser resgatados, quais devem ser reformulados e quais os que devem ser «deitados para o caixote de lixo».

Quando reflito sobre isto, a minha mente é imediatamente atraída pela palavra «contenção». Com efeito, as circunstâncias gerais, em cada sociedade e cada vida privada, tornaram-se de tal maneira voláteis, que nós devemos nos interrogar sobre a nossa «grelha de leitura» da realidade. 

Com efeito, os parâmetros que considerámos para avaliar a realidade  social, aqueles sobre os quais nos baseámos no passado, até mesmo no passado mais recente, ou se tornaram obviamente caducos, ou têm de ser reformulados, no todo ou em parte. 

As pessoas que não façam esse exercício, irão sofrer, nas condições de instabilidade e perturbação profunda que agora se estão a revelar. Elas irão  ser arrastadas/induzidas a tomar posições sobre as quais não tinham refletido previamente. 

Assim, em todos os aspetos da vida,  deve-se ser particularmente cuidadoso, não tomar os desejos pela realidade, não pronunciar juízos definitivos, sobre aquilo que parece ser, no momento. 

Dito isto, é verdade que as escolhas que fizermos poderão ser decisivas para nós, pessoalmente e socialmente. O que vi acontecer com muitos, é que tentam «encaixar» as inéditas situações, no molde envelhecido das suas ideologias. Seria este um caso para evocar a parábola bíblica do «vinho novo, em odres velhos».

As novas situações não têm «resposta» em escritos de filósofos, políticos ou economistas, que pensaram e escreveram em contextos totalmente diversos da atualidade. A única coisa de que podemos ter a certeza, é que não existem, em sociologia, economia, ou história, teorias preditivas verdadeiras, genuínas. As que são formuladas, correspondem apenas à visão do Mundo e ao desejo dos seus autores. Ora, esta visão do Mundo, mesmo que fosse muito adequada quando a escreveram, não poderia ter em conta toda a panóplia de descobertas e de ideias que se desenvolveram, entretanto. 

Num período de crise, como dizia corretamente Lenine, há semanas que são tão densas em acontecimentos, que parece que passaram anos. Esses acontecimentos são imprevisíveis no seu desenrolar. Mesmo que sejam previsíveis no seu desencadear. Por exemplo: uma guerra, pode ser previsível, ao se analisar as posições e movimentos das diversas potências. Mas, ninguém pode prever que uma tal guerra futura se desenrole desta ou daquela maneira. Que dure apenas uma semana, ou dez anos. Que dê a vitória inequívoca a um dos lados, ou que se arraste e esgote o lado mais forte. Que o lado mais forte inicialmente, mesmo que vença militarmente, acabe por experimentar o princípio da sua derrocada.

As situações de imprevisibilidade nos mercados são ainda mais patentes. Os que «pilotam» os bancos centrais, munidos de poderosos instrumentos para agir sobre mercados financeiros e a economia geral, não têm o poder que se lhes empresta. São o aprendiz do conto do «Aprendiz -feiticeiro». As economias vivem sujeitas ao caos completo, onde sábias e prudentes decisões são impossíveis de tomar. Os dirigentes efetuam meros «passes de mágica», de tal modo que o vulgo acredita que eles detêm enorme poder. 

A atitude mais inteligente - neste contexto- é de garantir aquilo que nós, pessoalmente, a nossa família, a nossa comunidade, possuímos enquanto meios de preservar a vida. Manter e aumentar a nossa capacidade de aguentar nos tempos mais difíceis das nossas vidas, deveria ser a preocupação primeira.  As «sereias» que apelam para investimentos sumptuários, especulativos, que causam um desequilíbrio, ou que diminuem os ganhos e as hipóteses de ganho, são de rejeitar. Por contraste, as iniciativas para preservação do adquirido e para o aumento da nossa autonomia (exemplos: produção própria de alimentos, geração de energia, etc.) tornam-se vitais, neste contexto. Também importa uma atitude mais racional com a saúde: a boa condição física é ainda mais importante, nas circunstâncias em que colapsam as estruturas e os meios de saúde.

A nossa energia deve estar centrada nos pontos acima, sendo também muito importante não olharmos de forma acrítica para as informações que nos chegam aos ouvidos ou aos olhos. Neste contexto, a informação da mídia é mais enviesada do que nas situações anteriores. Estamos perante ondas sucessivas de condicionamento de massas, primeiro com a histeria do «COVID», depois com a violação sistemática da nossa integridade, a imposição de «vacina», a perseguição da dissidência e a instalação duma censura férrea, além de uma vigilância total. Esta fase antecedeu e preparou as pessoas para aceitarem - perante as guerras da Ucrânia e de Gaza - no meio de campanhas de histeria sucessivas, a transformação do enquadramento legal.  A «legalidade democrática» foi varrida de uma penada, para se reprimir "legalmente"  dissidências e glorificar o bárbaro esmagamento de populações civis, incluindo a ressurreição do conceito, medievo e nazi, de  «culpa coletiva».

Com o medo instilado, pretende-se que as pessoas deixem de pensar, apenas reagindo, apenas seguindo os instintos de gregarismo e de xenofobia. Muitas, adotaram um comportamento de simulação, ou ocultaram a sua posição verdadeira, por medo de serem excluídas, de serem apontadas a dedo. 

O cenário está completamente montado e, aliás, a peça de teatro já começou a desenrolar-se diante dos nossos olhos. Mas, como não compreendemos o enredo desta peça, nem queremos fazer um esforço para o compreender, somos incapazes de protagonismo, de sermos proactivos. 

Se algo de verdadeiro existe nas palavras acima, creio que devemos refletir como agir para modificar este estado de coisas. Para agir maduramente, não devemos ocultar a realidade a nós próprios, nem cair na armadilha da propaganda, de uns ou de outros. Precisamos ser capazes de nos distanciar sem trair as nossas convicções. Não devemos tomar a nossa ilusão, o nosso desejo, pela realidade. Sobretudo, devemos guardar abertura a cada momento; não desenvolver sentimentos de ódio, em relação aos que estejam no polo diametralmente oposto. Sermos adultos, propriamente, quer dizer que somos capazes de analisar e não descartar outros pontos de vista, que nos pareçam - à primeira vista - errados, ou equivocados; por vezes, nós é que estávamos equivocados e os outros  tinham - afinal - razão. 

De nenhum modo, uma atitude sectária se justifica, neste contexto: A atitude inteligente é realizar alianças, o mais amplas possíveis, aos vários níveis. 



sábado, 23 de setembro de 2023

ARTE DA EXTINÇÃO

              O Dodo, ave que foi rapidamente extinta, pouco tempo depois de descoberta

             Retirado de:  https://off-guardian.org/2023/09/22/in-the-lands-of-the-dodo-bird/



Sim, leu bem! A arte da Extinção e não o contrário.

Aqui não se vai falar de extinção da Arte, porque a maioria das pessoas já a extinguiu das suas vidas

Mas as vidas, as «vidas biológicas», se assim quiserem dizer, essa vida que nós tomamos como algo tão importante, pela qual estamos prontos a tudo entregar, para o salvamento das nossas pessoas... a doutores, psicólogos, gurus, curandeiros, feiticeiros, carniceiros, enfim, a uma gente tão solícita e que promete a cura, mediante certa quantia em espécie sonante, sob forma digital, para ser-se moderno.

Sim, é certo: tratam-te da saúde, lá isso tratam! Consoante as tuas posses, haverá milhares de maneiras para tu, leitor/a, seres "extinto/a".

Mas não irei esmiuçar as modalidades individuais de extinção neste escrito. Irei abordar algumas das tecnologias mais potentes para extinção coletiva, em massa, das que se podem aplicar a um povo, uma nação, um continente ou à totalidade da raça humana!

Na era tecnológica em que vivemos, a Extinção realizou progressos consideráveis. Irei sumariamente citar alguns aspetos de tais progressos.




1º Método,

Extinção por má gestão dos recursos, contaminação dos recursos básicos. Na nossa época, os meios de contaminar as águas doces e os mares, multiplicaram-se. As agências governamentais costumam virar para o lado a cara, pois as indústrias poluidoras são fonte de receitas em impostos, correspondem a um certo número de postos de trabalho e de qualquer maneira, seria mais oneroso limparem os derrames e contaminações, do que fingir que não se passa nada de grave, que a «natureza» se encarrega -por si só - de limpar, destoxificar, revitalizar. Como ninguém é multado, ninguém tem sua empresa encerrada, por causa dessas ocorrências, é como um cheque em branco para os industriais, mas um cheque muito oneroso para o ambiente, para nós e para as gerações futuras.




2º Método,

Usam-se técnicas de engenharia genética em plantas e animais domésticos, para os tornarem insensíveis a certas pragas. Os ditos genes não são confináveis a dada espécie, nem são delimitáveis geograficamente. Portanto uma «experiência» feita numa determinada planta cultivada, numa determinada parte do mundo, pode (e tem havido exemplos numerosos) contaminar culturas semelhantes, ou espécies com algum parentesco, totalmente fora do controlo de entidades ou governos. Os gigantes do agronegócio até perseguem (!) agricultores, cujas culturas acidentalmente foram contaminadas por tais genes, resultantes de engenharia genética. Podem ter processos e serem obrigados a desembolsar somas enormes, por «infringir os direitos de patente» dos tais gigantes do Agronegócio.

Mas isto, é pouca coisa, se comparado com a utilização massiva de nicotinoides e outros inseticidas, causadores de grande mortandade em abelhas e noutros insetos polinizadores. Os grupos da agroquímica, com seus lóbis, têm conseguido proteger-se. Continua a venda e utilização desses inseticidas, demonstrados como totalmente destrutivos para o ambiente. É nestas pequenas coisas que se percebe como é que deputados e outros políticos subitamente ficam ricos. A morte catastrófica de insetos polinizadores equivale a ter de abandonar-se a agricultura em zonas de excelente rendimento agrícola. Não é exagero dizer que os insetos polinizadores são responsáveis por mais de 4/5 das espécies vegetais cultivadas, ou mesmo, uma proporção mais elevada. É preciso ter em conta, também, as espécies não-cultivadas que utilizam a polinização por insetos e que desempenham papeis insubstituíveis nos ecossistemas naturais.




Método nº3

Um encarecimento brutal do preço da energia, sob pretexto de «revolução verde» ou de política «zero carbono», atingindo assim a subsistência dos mais pobres, incluindo nos países mais afluentes. Os grupos socialmente mais frágeis são os que sofrem mais. É uma dupla sentença, pois a sua opção resume-se a comer o suficiente no inverno, mas não aquecer os lares (e sofrer com o frio, o que causa mais óbitos do que o excesso de calor), ou pagar a fatura da energia, mas sofrer de insuficiência alimentar. Esse aumento dos combustíveis, em particular, é atribuído a muitas «razões» mas - sobretudo - à guerra na Ucrânia. É um facto, que foram as potências da UE que decretaram o embargo ao gás e petróleo russos, logo no início da guerra. Mas, como sabemos bem, é Putin o responsável por tudo o que acontece. Outro método, é fechar centrais nucleares, supostamente muito perigosas. Sobretudo porque, assim, torna-se viável a exploração de eólicas e de painéis solares, já para não falar dos automóveis movidos com baterias a lítio. Mas, se essas centrais nucleares foram fechadas, onde é que vão buscar a eletricidade? - Ah, reabriram e repõem em funcionamento, a todo o vapor (sic!), centrais a carvão , que - como sabemos - não têm qualquer efeito nefasto no ambiente, são mesmo «amigas do ambiente»! A prova? - Esta foi a solução adotada pelos ecologistas governamentais, na Alemanha.




Método nº4

Esta é das soluções mais radicais para o despovoamento. Inventada há menos de um século, chama-se bomba termonuclear. Sabemos que alguns governos têm uma longa «história de amor» com estas armas definitivas. Os dirigentes destas potências não querem saber sobre se existem efeitos «secundários», se estes forem consequência dum ataque nuclear ao inimigo, claro. Pois um bombardeamento nuclear, seja ele qual for, vai fatalmente causar danos ditos «colaterais», nas populações civis que são certamente as mais atingidas. Ainda por cima, é um método de longa duração. Por exemplo, os atóis do Oceano Pacífico usados para ensaios de explosão de bombas nucleares, seja por americanos ou por franceses, nos anos 40 e 50 do século passado, continuam não-habitáveis e assim ficarão, durante séculos.




Método nº5

Fabricar (falsas ou verdadeiras) epidemias* com vírus manipulados geneticamente. Tal foi o caso - comprovado, para além de qualquer dúvida - com o COVID. Estas armas biológicas são disseminadas em território inimigo, causando um prejuízo sobretudo económico, devido aos enormes gastos para tratar e recuperar a saúde das populações e às perdas na estrutura produtiva. Não é interessante - para os atacantes - causar uma epidemia demasiado mortífera: São sempre necessários escravos como mão de obra para tarefas penosas, insalubres, etc., indispensáveis ao funcionamento dos territórios conquistados.


Numa segunda fase, as tropas e as populações amigas recebem um antídoto, ou vacina: Assim, ficariam protegidos do vírus, ou de seus efeitos mais graves. Tentaram isso, mas foi um completo fiasco, com as «vacinas» usando vetores de ARNm contra o COVID. Os potentados farmacêuticos e os Estados mais poderosos e corruptos, não hesitam -porém - em, novamente, avançar com outras «vacinas» ARNm para outros vírus patogénicos. Devem estar a reservar a utilização em massa (e obrigatória) de tais «vacinas», para momento oportuno, para dizimar alguns milhões suplementares, com o pretexto de os «salvar» dum vírus perigoso. Dispõem da panóplia toda de engenharia genética. Têm aperfeiçoado muito - nos últimos tempos - as tecnologias de vigilância, controlo e condicionamento de massas. Vai haver muitas mais oportunidades, além do COVID: Na realidade, o COVID foi somente a primeira experiência planetária. Serviu para testar estratégias de controlo e condicionamento de massas, assim como os próprios vírus modificados. Os vetores virais e as «vacinas» (na realidade agentes de supressão da imunidade) tinham fraca letalidade**, mas elevada morbilidade. Foi ocasião para aplicarem, em grande escala, técnicas de «engenharia do medo», orquestradas pela média de massas, em simbiose com governos e organizações internacionais de «saúde» ( OMS). Num espaço muito curto e sem resistências significativas, instalou-se um novo tipo de Estado totalitário. Muitas pessoas não o reconheceram, porém, porque apareceu com a face sorridente e amistosa do «Grande Irmão». A campanha de terror psicológico serviu para isolar e ostracizar contestatários da Nova Ordem Mundial.

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(06/10/23) Acrescento uma referência recente que revela outro aspeto da campanha de «vacinação» contra o vírus covidiano:

A causa de sangramentos vaginais pode estar associada com casos de cancro do útero, dos ovários, ou outras afeções graves. Mas, mesmo nos casos mais benignos, significa uma diminuição da capacidade de procriação, diminuição de fertilidade e isso pode traduzir-se por uma quebra (ainda mais acentuada) na taxa de fertilidade, conduzindo a uma diminuição ainda mais grave da população ativa, dentro de poucos anos.


(02/11/23) Outra referência importante, em que se vê a criminalidade da casta dirigente dos EUA e Ocidente, associada a atividades criminosas de manipulação de corona vírus em Wuhan. Os objetivos das mesmas não eram aceitáveis, à partida: chocavam com a ética e com a lei internacional sobre armas biológicas: https://www.zerohedge.com/covid-19/unraveling-wuhan-cover-how-fauci-conspired-virologists-deceive-public-and-smear-critics Muitos milhões morreram em resultado de manipulações genéticas subsidiadas pelo governo dos EUA.

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Até agora, estão de parabéns, os globalistas: Têm conseguido o que queriam e com muito pouco custo. Os de baixo, estes, estão ainda mais destituídos, sem meios eficazes de protesto. As eleições, nos países auto- designados de «democracias liberais», são tão genuínas como as organizadas nas ditaduras comunistas, ou fascistas.

Talvez surpreenda alguns leitores a minha opinião seguinte. A arma mais poderosa é a metodologia que possibilita todos os métodos anteriormente enumerados: O controlo mental, através de uma campanha permanente de perversão e ocultação dos factos e da realidade. Os cidadãos vivem num mundo de fantasia, mas chamam a isso «realidade». Creio que o termo que se aplica em psicologia, é o de alucinação coletiva. Os mais afetados enfurecem-se quando alguém lhes tenta mostrar que... «de facto, o que eles tomam por realidade, é somente uma construção conveniente, para que permaneçam dóceis, como ovelhas no rebanho».

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* Ver artigo de Parry: 

https://manuelbaneteleproprio.blogspot.com/2020/03/max-parry-sera-que-pandemia-global-e-um.html

 **A letalidade é a capacidade de causar morte. No pânico orquestrado com a pandemia de COVID, os casos reais  de morte por COVID foram poucos. Mas, foram empolados com toda a espécie de casos de óbito por outras causas, ao mesmo tempo que se interditava a autópsia de todos os pacientes falecidos.          morbilidade é a capacidade de provocar doença. Foi grande a morbilidade causada pelos coronavírus manipulados. Sendo estes transmitidos pelo ar, tal como a gripe, a sua rápida disseminação estava assegurada.

segunda-feira, 24 de julho de 2023

LEE CAMP: A POLÍTICA EXTERNA DOS EUA ESTÁ CHEIA DE MENTIRAS

 Uma entrevista dada ao «Neutrality Studies»


Um mundo multipolar vai-nos salvar do belicismo hegemónico dos EUA:


Matando e Pilhando em nome da «Segurança Nacional»



domingo, 19 de fevereiro de 2023

A PROPÓSITO DE UMA FRASE DE D. H. LAWRENCE

Aplica-se, hoje, o dito de D. H. Lawrence, de há um século atrás: “O essencial da alma americana é sua dureza, isolada, estoica, de assassino. Ela nunca chegou a derreter-se.” Citação retirada de artigo de Ed Curtin: https://off-guardian.org/2023/02/19/the-world-wants-to-be-deceived/
Não tenho dúvidas da justeza* de D. H. Lawrence, há um século atrás, como não duvido da justeza* do diagnóstico dececionado de Edward Curtin no excelente artigo: «O Mundo Quer Ser Enganado».

Mas, na realidade, não há assassino sem vítima. Quem se coloca na posição de vítima, são aqueles mesmos que ficam impressionados com «as luzes da ribalta», com retórica humanitária e a imagem totalmente falsa da maior «democracia» do Mundo, que estes assimilam, não vendo que estão a engolir em pequenas doses de veneno, o engano destinado a apresentar o «típico» americano como alguém muito decente, crente, bonacheirão, firme na defesa da «democracia» e respeitoso do poder, seja ele o do dinheiro ou o político.  

Para ilustrar este facto, irei descrever algumas experiências pessoais, embora eu saiba que não têm qualquer significado em termos estatísticos:

1) Há muitos anos, no metro, casualmente, encetei conversa com uma jovem americana. Não me lembro de que conteúdo falámos, só sei que a certa altura, a conversa resvalou para a política, em especial a americana. Não pude evitar falar-lhe das guerras sujas que os EUA estavam a fazer ou a apoiar fações, como no caso da Nicarágua (o diálogo passava-se quando Ronald Reagan era presidente). Ela abriu muito os olhos de espanto e dizendo, com voz ofendida, que a América era uma Nação pacífica, que ajudava os povos mais fracos. 

2) Num cemitério situado na Coreia do Sul, sob bandeira das Nações Unidas, repousam os soldados americanos e da coligação liderada pelos americanos que combateram na guerra da Coreia. Eu mostrei-me surpreendido ao guia, que a Coreia do Norte e a China não estivessem representadas, pois estávamos num pedaço de território que pertencia (legalmente) à ONU e não à Coreia do Sul. Ele não teve argumentos para me contrariar, mas também que os tivesse, não iria entrar em discussão comigo, visto que ele tinha de ser amável com os turistas. 
Mas a todos os sul-coreanos a quem contei o episódio e a minha perplexidade, não houve um que tivesse respondido o óbvio (para mim): A coligação que combateu as forças da Coreia do Norte e da China Popular, embora nominalmente sob bandeira da ONU, na realidade, eram tropas americanas e das nações que contribuíram com «voluntários». 
Há diferenças até na morte; eles (americanos) não esquecem, nem perdoam nunca. Se és inimigo, nem após a morte, te reconhecem a dignidade de ser humano.   

3) Num curso de Verão, num cantão da Suíça para aprender língua alemã, conheci uma jovem americana. Ela tinha talento musical e preparava-se para frequentar um curso superior de música na Suíça. Eu esteva no curso de Verão para poder beneficiar duma bolsa de investigação dada pela embaixada suíça. Ora, esse curso de língua alemã era frequentado por variados estudantes de ambos os sexos. Não sei por que motivo, a referida jovem, meteu-se-lhe na cabeça ensinar aos colegas dos outros países (ele era a única cidadã dos EUA) o seu hino nacional. As pessoas fizeram-lhe a vontade, não por submissão ou por convicção, mas porque quiseram mostrar-lhe que não tinham nada de pessoal contra ela (nem contra o seu país). Mas, eu fiquei a pensar no que aconteceria, se um Iraniano ou um Chinês (eram vários), tivesse a mesma ideia de querer ensinar aos companheiros de curso, o seu hino nacional? Tal não seria possível, porque nem eu nem os membros das outras nações,  estávamos interessados em manifestar um nacionalismo que ia ao ponto de obrigar os colegas, por cortesia, a aprenderem um hino que não lhes dizia nada.

4) Uma estudante, fazendo mestrado ou doutoramento em Coimbra, de origem curda e de nacionalidade turca, contou-me que, nas zonas curdas sob «proteção» americana, os diversos grupos étnicos, curdos, turcos, cristão sírios, árabes, etc. vivem em comunidades separadas e que cada comunidade tinha seus representantes, «em democracia». Mas isto era exatamente o modelo importado dos EUA (não sei se ela tinha consciência disso), em que as comunidades vivem separadas, têm uma organização comunitária separada por etnias e/ou por religiões: Os representantes políticos locais e regionais, são dum dos grupos étnicos mais fortes na zona, ou têm acordos que asseguram que os interesses dos vários grupos étnicos serão tidos em conta. Não existe nos EUA, qualquer «mistura» de pessoas vindas dos diversos cantos do globo (quanto aos que lá sempre estiveram, os sobreviventes do genocídio, estes foram «aparcados» em reservas e aí continuam). É por isso que, nos EUA, há periodicamente explosões de violência. Por as pessoas se definirem pela cor ou tom da pele: «brancos», «amarelos», «negros» e «latinos». Ou melhor, os poderes tudo fizeram para que as pessoas tenham sua representação mental da sociedade, dividida em comunidades por raças. Assim, a realidade fundamental da identidade de interesses entre oprimidos (seja qual for sua etnia) contra opressores (seja qual for a sua, também) é diluída.

5) Eu tive frequentes contactos com cidadãos dos EUA, enquanto estudante ou como recém-formado. Podia-se falar sobre política de modo civilizado, sendo eu cuidadoso para que não se sentissem ofendidos. Com efeito, mesmo alguém de elevado nível cultural, poderia confundir meu anti-imperialismo com uma forma de exprimir antipatia pessoal pelos americanos. Porém, o que sobressaia era que, os que estavam dentro do espectro político «mainstream», tinham uma abordagem simplista. Por contraste, as pessoas não-académicas, ativistas sociais ou sindicais dos EUA, que encontrei em vários momentos da minha vida, eram pessoas com originalidade; tinham interessantes pontos de vista sobre vários assuntos de política internacional.  

Não se pode generalizar, mas confesso que esta vivência acaba por influenciar o meu modo de ver o povo americano. Tenho lido muitos textos - os de Edward Curtin, Howard Zinn, Noam Chomsky e outros - sobre o modo como têm sido condicionados, nos EUA, geração após geração. 
Sei que a minha abordagem pode parecer simplista; de facto, não vivi nunca nos EUA. Gostava que os americanos não se tomassem pelo povo «excecional», isso - além de ridículo - é mesmo ofensivo para as restantes nações.
Pessoalmente, compreendo o forte sentimento de identidade que se possa ter, em relação à nação onde se viveu a maior parte da vida, da qual são os nossos pais e mães. Sei que o sistema educativo e político acaba por ter muita influência no moldar da mentalidade individual e coletiva. 
Mas, a questão é, simplesmente, de não se colocar numa postura de «superioridade» falsa, pois repousa sobre o poderio, a riqueza e força militar de uma potência, sobre as outras.  
A multipolaridade não vai eliminar as desigualdades entre as nações. Não vai anular diferenças culturais e políticas óbvias. Penso que vai permitir que não haja nenhuma nação hegemónica que dite às outras por que parâmetros políticos, morais, etc. estas outras se devem reger.  Para não falhar, não poderá ser apenas um projeto de força económica, militar, política, etc.: Tem de haver o suporte dum conjunto de regras ou leis internacionais, que permitam os povos viverem e desenvolverem-se, sem colonialismo, neocolonialismo, nem imperialismo. 

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* Não duvido da justeza de D.H. Lawrence e de Edward Curtin porque assumo naturalmente que ao falarem de «assassinos americanos» referem-se aos líderes, os que têm real poder, no Governo, na Administração e nos Negócios.



sábado, 31 de dezembro de 2022

A CRISE DA ESQUERDA E PORQUE ISSO É GRAVE PARA TODOS

 Neste fim de ano de 2022, gostaria de vos dar, senão uma perspetiva sorridente do ano que vem aí, pelo menos apresentar-vos alguma paisagem com uma nesga de céu azul de esperança. Mas, tal não será fácil de acontecer, pelo menos na transição de 2022 para 2023, apesar de que todos - subjetivamente - nos sentimos atraídos para o otimismo, nestas épocas. 

É difícil e penoso explicar-vos a enorme revolta que sinto, quando penso na evolução que o mundo está a tomar. Mas, após esse pensamento inicial, pergunto-me: «como é que chegámos aqui?». Qual o fio condutor que nos leva - durante estes anos todos - a chegar com a quase fatalidade da tragédia, ao estado presente do mundo e das nossas sociedades?

As raízes do mal presente são tão fundas, que preciso recuar no tempo (pelo menos) até aos alvores das democracias. Contrariamente ao que muitos podem pensar, as democracias na Europa e América do Norte, não se instauraram de uma vez, como resultado de uma «revolução». Foi um processo lento, com períodos muito conturbados, é certo, mas com a persistente vontade dos povos a serem representados ao nível das estruturas de poder. Qualquer que seja a democracia que daí decorreu, quer mais «parlamentar», quer mais «presidencial», todas elas se basearam no princípio da representação.

O princípio da representação, como fundamento de um Estado democrático, eis o que nos soa a natural, a óbvio. 

Porém, ao nível de grandes conjuntos populacionais, não existe nunca uma representação, sem que o processo ocorra através de representantes políticos eleitos. Então essa pedra-angular da representação (como diziam os revolucionários liberais americanos: não pode haver taxação sem representação) foi substituída por outro critério, muito menos transparente, que é o «princípio da eleição». 

Ora, como tenho várias vezes escrito neste blog e noutros locais, a representação é inevitavelmente falseada pelos mecanismos eleitorais, que dão peso - implicitamente - a quem tem mais poder económico. Os magnates «gostam» de entregar milhares ou milhões a partidos e seus candidatos, não porque estes tenham a sua simpatia ideológica. Mas, antes porque assim os têm «na mão». Ou seja, o partido ou candidato que «morder a mão que lhe dá de comer», já sabe que, na próxima eleição, não terá subsídios (meios de corrupção) para conseguir atender às importantes e inevitáveis despesas eleitorais. Não será eleito, porque a campanha de propaganda de seu(s) adversário(s) estava melhor subsidiada, portanto, as campanhas rivais «convenceram» o eleitorado, em detrimento da campanha do «partido ingrato».

Perante este esquema de corrupção estrutural, não existe verdadeira democracia, pois a representação do dinheiro (quem tem mais dólares, mais euros, etc. e que os podem investir nas campanhas) é quem inevitavelmente ganha. Não são mesmo necessárias grandes fraudes, ao nível da votação ou da contagem dos votos. Os partidos que compõem o leque parlamentar e sobretudo, o leque dos elegíveis para cargos de governo, acabam sempre por ser partidos em consonância com o sistema, mesmo que alguns tenham posturas radicais de direita ou de esquerda. 

O que se constata da história das democracias, é que não são poucos os casos históricos de partidos de esquerda que chegaram ao poder, para logo - ou passado pouco tempo - governarem, não em função da vontade dos seus eleitores (em geral, da classe trabalhadora e da burguesia mais modesta), mas dos interesses dos grandes capitalistas. Justificam estas viragens com o «interesse nacional», ou outra frase-feita, suficientemente vaga, para que não seja fácil demonstrar a  falácia.

A partir de certo ponto, que começou no início do século vinte, deu-se a rendição da social-democracia; eram partidos inicialmente revolucionários, que pretendiam derrubar o capitalismo e instaurar o  socialismo. Sucessivas ondas de (ditos) representantes do proletariado, nas democracias ditas liberais, tiveram o mesmo destino; iniciaram a sua atividade parlamentar como forças de «fora» do sistema, mas em pouco tempo integraram-se inteiramente na mecânica parlamentar. Quando vemos isto, podemos ficar desencorajados, pois é um mecanismo que não pode ser mudado facilmente; o mecanismo da cooptação é o que melhor garante a continuidade do status- quo.

Aquilo que se está a passar neste momento trágico na Ucrânia, é devido à rendição das diversas esquerdas, que jogaram o jogo do belicismo. Isto é válido em todos os países da Europa, incluindo claro, a Rússia. Mas, sobretudo, as forças mais poderosas da esquerda, as que se agrupam na chamada 2ª Internacional Socialista, que têm tido governos ou forças parlamentares de oposição fortes em praticamente todos os países da Europa ocidental, todas se alinharam com o belicismo: Marcharam todas integrando o desfile militar, a passo cadenciado, a mando dos que dominam, da oligarquia. Uma guerra, sobretudo destas dimensões (pan-europeia, na verdade), é sempre impulsionada pela ínfima minoria que explora e domina a maior parte da  riqueza criada e que tem manobrado os governos, através do seu controlo das finanças, da média, da corrupção dos partidos, dos peritos e especialistas. 

O dilema de uma força de esquerda parlamentar é, hoje, bastante claro: 

- Ou se retira da fantochada eleitoral e a breve trecho desaparece, como força organizada ao nível nacional, reduzindo-se à dimensão de «seita»; 

- Ou se mantém, mesmo que diga que o faz «criticamente», mas o seu objetivo acaba por ser a manutenção e expansão  da representação parlamentar, com o objetivo de vir a ser convidada e participar num governo de centro-esquerda. 

Não creio que possa existir uma «terceira» via, para partidos de esquerda, que escolheram a via de colaboração com o sistema. É esta a mensagem implícita que nos dão as suas estratégias e táticas, as suas tomadas de posição e declarações. Claro, não vão dizer ao eleitorado, largamente das classes mais pobres, «nós vamos continuar a política de centro-direita/centro esquerda» e «vocês devem votar em nós, porque nós somos os bons, os competentes, etc.» Claro que a sinceridade está fora do jogo do parlamentarismo. São enganadas muitas pessoas, convencidas de que a transição para o socialismo está ao virar  da esquina, bastando para isso votar nos partidos que têm advogado o socialismo. É dentro desta alienação que opera toda a esquerda parlamentar, hoje em dia.

Não quero deixar a impressão de que tenho uma saída - de curto prazo - para este problema. Não a tenho e confesso-o sem hesitar. 

Porém, a única forma de transformar a realidade política e social em profundidade é através da educação, é pela educação que as pessoas se tornam críticas, que são capazes de raciocinar e de estudar por si próprias, aprendendo não só aspetos «técnicos» dos assuntos, mas também as questões mais profundas. Uma educação verdadeira implica conhecimento, o estudo de livros e artigos sobre Filosofia, Política, Sociologia, Psicologia e História. É de constatar que a escola de hoje está muito longe de encorajar a independência de espírito. As pessoas que organizaram os curricula - desde curricula da escola primária até ao ensino superior- são pessoas da inteira confiança da classe dominante. A escola não é um corpo separado do resto da sociedade, mas é atravessado pelas contradições que nela se exprimem. Apesar disso, a educação, mesmo que não tenha sequer uma réstia de crítica ao poder dominante, é sempre perigosa para este, pois alguns filhos da classe oprimida, conseguem atingir um nível de compreensão aprofundada das matérias e destes, uns poucos, serão críticos da realidade social que se lhes depara. 

Concedo que um partido pudesse ser o veículo dessa educação independente,  não enfeudada a interesses de classe, que são os tipos de ensino dominantes nas escolas superiores e universidades, controladas por vários arautos da burguesia. Mas, a verdade é que este tipo de educação, muitas vezes, se limita a formar quadros do próprio partido. Assim, a educação popular, em todas as esferas da atividade não pode ser veiculada por qualquer partido, mesmo que este tenha as melhores intenções do mundo. Porém, organizações populares de base, não enfeudadas a nenhum partido, poderiam desempenhar um papel  muito mais relevante do que o fazem hoje: Cooperativas, associações populares, associações de vizinhança, sindicatos (não controlados por nenhum partido) etc., podem ser um bom terreno para a emergência duma cultura não-elitista, que proporcione as mesmas oportunidades a todos .  

Se o mundo sobreviver entretanto, talvez daqui a muitos anos haja uma transformação qualitativa nas sociedades e seja ultrapassada a etapa capitalista, em que nos encontramos. Parece-me afinal mais construtivo apontar para um objetivo longínquo mas realizável, do que insistir na fórmula vazia (corrompida e corruptora) do parlamentarismo. Os políticos «profissionais» de esquerda, que sabem isso melhor que ninguém, vivem do engano dos seus eleitores. 

Não é verdade que a «esquerda», por o ser, tenha uma qualquer vantagem moral sobre as formações políticas de direita, ou de centro. A mitificação da esquerda, como superior moralmente às outras forças, traduz-se numa autoilusão, numa alucinação mesmo (nalguns casos) de militantes de base sinceros; enquanto os outros, sobretudo dos escalões de topo e intermédios, têm sobretudo uma enorme sede de poder e não são de modo nenhum sinceros. 

Costumo dizer que a melhor maneira de nos corrigirmos, é olharmos para nós próprios e vermos realmente aquilo que nós fizemos de certo ou de errado. É uma autoanálise praticada pelos filósofos desde a antiguidade greco-romana, pelo menos. Também faz parte do ensinamento de muitas escolas filosóficas do Oriente: do Confucianismo, do Budismo Zen. Está igualmente presente no Cristianismo, no Judaísmo e no Alcorão. Em correntes leninistas e maoistas, encontramos apelos à «crítica e autocrítica»; encontramos semelhante apelo para a introspeção em filósofos influenciados pela psicanálise, ou em pós-modernistas. Podemos encontrar em muitas filosofias, não-europeias, este apelo; a própria «sabedoria das nações», repositório da  experiência multissecular dos povos, vai nesse sentido. Seria de esperar que tal fosse praticado pelo povo de esquerda também, ou seja, pelos que não se deixaram corromper e que não têm a soberba de achar que o mundo todo está errado, que eles é que estão certos.

Um bom ano de lutas para 2023!


Uma ilustração de humor satírico de William Banzai

                               https://www.zerohedge.com/news/2022-12-30/stay-woke

terça-feira, 20 de dezembro de 2022

JIMMY DORE DESMASCARA A CASTA POLÍTICA DOS EUA, CORRUPTA E INCOMPETENTE


                                     https://www.youtube.com/watch?v=aZZ20LJXTeU&t=98s

O «sonho americano» é antes o «pesadelo americano» ou «para  acreditares na propaganda deles é porque estás a sonhar »...

Aumentam o orçamento para o Pentágono para o total 857 biliões de dólares, mais 55 biliões do que a proposta do Presidente.

Jimmy Dore diz ao público americano, depois de mostrar os exemplos concretos de corrupção em Washington: O vosso governo é mais corrupto que o da Rússia, mais que o da China. A casta governante dos EUA é o vosso principal inimigo.

Tanto faz serem votos de democratas ou republicanos no Senado e na Câmara dos Representantes. Deu-se o caso dos republicanos deitarem abaixo a proposta de orçamento para 2023.  Como alternativa, «impõem» um aumento de uns tantos biliões a mais*! 

* J. Dore exemplifica a situação grotesca com uma piada erótica: «Can I give you a kiss?» - «No, she rebukes him, don't do that! But what about a blow-job?»

quinta-feira, 3 de novembro de 2022

Dmitry Orlov & Jeffrey Sachs: DUAS VOZES DE PAZ

A política é dominada pelas paixões. Isso não nos irá surpreender muito. Mas, aquilo que surpreende, é que no «Ocidente», em especial nos EUA, os responsáveis políticos fazem um papel de irresponsáveis
Não encontro explicação simples e unívoca para o fenómeno: será húbris, será autointoxicação com narrativas de propaganda bélica, será a pressão constante do complexo militar industrial, será que esperam assim ganhar eleições e obter maior poderio?  
A ala Democrata do partido único (Chomsky dixit) do establishment americano, não apenas colhe imenso descrédito face aos seus concidadãos, como é vista como causa de imenso sofrimento nos povos. 
A administração Biden é claramente responsável pela guerra na Ucrânia, pelo seu desencadear e prolongamento, pelo afundar as economias da Europa ocidental, dos seus «aliados», pela perda de qualquer «capital de sedução» junto das nações do Terceiro Mundo. Estas nações estão a virar-se (incluindo a Arábia Saudita) em direção aos BRICS, à China, à Rússia! 
Digam-me se esta liderança democrata fez algo de positivo: Semear o caos, não me parece senão causar desgraça, a destruição, o mal!

Duas pessoas, cidadãs dos EUA, que tenho acompanhado, pelas quais tenho imenso respeito, embora não me identifique com os seus percursos e com muitas das suas afirmações. No entanto, nesta época de pequenez, têm a coragem de dizer a verdade e de proporem um caminho para a paz.



                                                   Entrevista com Jeffrey D. Sachs




DMITRI ORLOV: 


The New Cuban Missile Crisis That Isn’t

("A nova e inexistente crise dos mísseis cubanos")

 

domingo, 21 de agosto de 2022

A JANELA DE OVERTON E A ILUSÃO DA DEMOCRACIA

 Neste país à beira-mar plantado, todo ele com os pés na areia e o sol a queimar-lhes os miolos, seria milagre que aqui alguém prestasse atenção ao que escrevo. Como não acredito em milagres, tenho realmente pouca convicção de que alguém, neste soporífero país, veja e explore as pistas de reflexão que lhes apresento. Mas, o Mundo é vasto e a Internet também. De facto, mais de meio milhar de seguidores anónimos consultam este blog diariamente, da Austrália ao Canadá,  da Rússia ao Reino Unido.

Para meu público anónimo, quero apresentar um autor de vídeos de Youtube, que descobri muito recentemente: Não me identifico com algumas opiniões dele, ou com certas formulações nalgumas questões. E depois? O essencial é saber se o sumo do que ele expõe tem conteúdo, tem informação; se o discurso do autor é coerente e nos provoca. Sem nos confrontarmos ao outro, como diz Byung-Chul Han, não existe discursividade; e sem ela, a democracia fica - no mínimo - castrada, torna-se uma farsa, um jogo sem conteúdo. Creio que foi George Orwell (Eric Blair) quem definiu melhor a democracia, como «quando podes dizer aquilo que os outros NÃO gostam de ouvir».

Regalem-se pois, com o vídeo abaixo (podem ativar legendas automáticas, em espanhol):



quinta-feira, 9 de junho de 2022

Que teoria política para o nosso tempo?

[REFLEXÕES DE MANUEL BANET] 


- A igualdade não é uma fórmula quantitativa. A liberdade não é  um conceito abstrato. Ambas estão em íntima relação.

A retórica habitual dos atores da política centra-se muitas vezes nestes dois conceitos de «liberdade» e de «igualdade». Mas nós não devemos entrar numa discussão nos seus termos sofísticos. Por isso, digo que a liberdade não é um conceito abstrato. Entenda-se a afirmação anterior, quando estamos a construir um programa, com objetivos claros e com estratégias exequíveis. Politicamente, a liberdade só pode ser avaliada como uma propriedade ou característica relativa ao funcionamento do sistema político no seu todo e nas suas partes; e isto, «desce» até ao nível dos indivíduos. A liberdade nunca pode ser «concedida», é uma propriedade integral do sistema, o qual será tanto mais pleno de liberdade, quanto mais ou melhor se verificarem tais e tais condições, para os indivíduos e comunidades. 

Do mesmo modo como afirmo relativamente à liberdade, também a igualdade deve ser vista como uma característica sistémica, nunca se poderá ver em isolamento, nem tem sentido reclamá-la sem que se verifiquem as condições de liberdade para assegurá-la. Igualdade sem liberdade, não faz sentido. O inverso, liberdade sem igualdade, também não. Isto significa que todas as retóricas que se destinam a dar prioridade a uma em detrimento da outra, são discursos vazios, sem substância ou coerência lógica. Não podemos medir a igualdade, mas podemos avaliá-la: Ela traduz-se, no concreto, em igualdade de meios e condições materiais* de que usufruem os indivíduos, não apenas no plano dos direitos e deveres cívicos ou políticos, como nos restantes. «Igualdade», em termos de discussão política séria, não pode significar uniformidade, não pode significar uma repartição «igual» da riqueza. Além de que a tentativa de alcançar este objetivo é contrária à manutenção da liberdade dos indivíduos e comunidades, logicamente tal implicaria uma classe de burocratas, fosse qual fosse a ideologia afixada, encarregues de administrar essa tal «igualdade». Pode-se compreender que tal burocracia, inevitavelmente, terá o essencial do poder (e com as benesses que daí decorrem), enquanto todos os outros ficarão sem poder: Logo, não existirá nenhuma igualdade, mas o contrário**. 

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*Alguns usam a expressão «igualdade de oportunidades», mas eu penso que esta formulação é enganadora. Pode parecer que um filho de rico e um de pobre, têm as «mesmas oportunidades», se frequentarem a mesma escola: Na prática, isso não é assim. Por outro lado, alguém com um melhor desempenho na sua profissão que outros, não seria justo que lhe fossem recusadas maiores oportunidades para potenciar a sua formação, etc. devido a um princípio rígido «igualitário». 

**Perante a experiência longa e penosa do regime saído da revolução bolchevique e de todos os seus avatares que surgiram sobretudo no século XX e debruçando-me em profundidade  sobre essa história, cheguei à conclusão de que foi feita a demonstração pela prática e em tragédias terríveis para os povos em causa, do que afirmei sinteticamente acima.

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-Preservar o máximo de conectividade e de autonomia. 

Na natureza, verifica-se que seres vivos, populações e comunidades  perduram no ecossistema, graças às estratégias que desenvolveram ao longo da evolução e que lhes permitem um máximo de resiliência. Ora, esta resiliência numa espécie social, como é o caso da nossa, equivale a manter um relacionamento, que será sempre diferenciado, com os outros: A família, os colegas de trabalho, o grupo de amigos, etc. Note-se que uma das tragédias maiores do nosso tempo, é o paradoxo da abundância material ao nível social, enquanto se assiste a um isolamento cada vez maior do indivíduo: Em vez da partilha, o fechamento; em vez do convívio, o isolamento; em vez da comunicação, a agressão, etc. Muitos médicos e cientistas sociais sabem que, nas sociedades contemporâneas, as patologias mais frequentes são de natureza social na sua génese.

A autonomia dos indivíduos, dos grupos e das sociedades, não é a antítese da conectividade. Há mesmo um efeito de potenciação de ambas. Se pensarmos quem é mais autónomo, não são pessoas com menos conexões, pelo contrário. E o mesmo se poderá observar em conjuntos maiores: Em famílias, comunidades locais, regionais ou nacionais. A autonomia não deve ser confundida com autarcia: São posturas essencialmente diferentes, apesar do prefixo «auto» ser comum. A autonomia significa que o indivíduo ou grupo não está dependente, em qualquer aspeto vital, dos outros quer estes sejam indivíduos ou grupos. Mas, não significa que o ser autónomo rejeite o intercâmbio, a realização conjunta de projetos. Aliás, verifica-se no concreto que, quanto maior autonomia do indivíduo ou grupo, mais está disponível para se abrir aos outros, ao exterior. A atitude que se pode classificar de autarcia, implica a vontade de isolamento e a organização dos diferentes aspetos da vida para realizar e manter esse isolamento. Num indivíduo, corresponde com frequência a uma patologia, a um autismo. Numa sociedade, traduz-se na redução ao mínimo dos contactos com o exterior, quer nos planos das trocas comerciais e culturais, ou na circulação dos indivíduos, etc. Em geral, quando se pensa a independência em termos de Estado, de Nação, é no plano da autonomia dessa Nação, em relação a outra ou outras, que é entendida, não se está a pensar em alcançar um estado de autarcia.

- Gerir ao nível local o que é adequado ao nível local.

A sociedade de hoje é demasiado complexa para poder viver em autarcia. Esta ocorre "naturalmente" pelas circunstâncias em que se encontrem pequenos grupos, tribos ou etnias, muito isoladas da civilização: Por exemplo, nalgumas tribos da Amazônia. Mas, em sociedades complexas, existem demasiados patamares a ter em conta, o que tem provocado dois movimentos contrários: Ou uma tendência centralizadora, impondo as soluções de cima para baixo, do centro para a periferia; ou a solução de atribuir autonomia de decisão e correspondente responsabilidade aos atores de cada um desses patamares. No caso primeiro, assiste-se a um estreitar ou mesmo anular da autonomia e das liberdades, em grau maior ou menor, consoante a violência com que essa centralização é imposta. No segundo caso, é condição para a gestão do grupo e da sociedade, no respeito dos indivíduos e coletivos. Digo condição, apenas, porque para que se realize tal funcionamento, em qualquer dos patamares, é necessário que os atores estejam conscientes dos valores e treinados no debater e agir coletivamente. 

- Construção orgânica dos diversos patamares com metodologias comuns, mas âmbitos legais distintos

Se a organização da sociedade for erigida desde a base, sem imposições de uma elite que se coloca como a «representante» (na realidade, a proprietária) da população, os diversos patamares de organização têm de obedecer aos mesmos princípios gerais. É portanto inútil e mesmo prejudicial estar a especular sobre o concreto dessa organização social, o fundamental é haver, ao nível da população, um entendimento consensual do que sejam os princípios de uma boa governança. Esta «governança», por oposição a «governo», seria sinónima de linhas-guia relativas aos processos de tomada de decisão, de execução das medidas acordadas e de avaliação. Note-se que, aqui, não há apelo a uma utopia, seja ela qual for: As utopias deram demasiadas vezes em tragédias, na história da humanidade. Pelo contrário, a construção orgânica é anti -utópica: O que socialmente é construído, está em potência nos princípios gerais adotados pela sociedade. Não existe nenhum plano prévio, de como se deva organizar e gerir. São os próprios povos interessados, que se mobilizam, debatem e chegam a consenso sobre os caminhos a adotar nas diversas tarefas de construção de instituições. Quanto aos «âmbitos legais distintos»: Significa que determinado patamar tem competência legal para gerir uma determinada área geográfica, ou setor de atividade. Os princípios gerais devem ser adaptados, a cada um desses âmbitos, o que - evidentemente - deverá ser feito pela sociedade, não por um indivíduo ou grupo de indivíduos.

- Não ter pressa nas deliberações e ter preocupação na implementação das decisões

Muitas pessoas confundem rapidez, com eficiência. Isso é consequência duma sociedade em que ser-se servido imediatamente, segundo o seu capricho, tornou-se «exigência» das pessoas, que se acham no seu direito, sobretudo se têm dinheiro e poder. As deliberações entre iguais, têm de ser conduzidas com respeito por todos os intervenientes, seja qual for a metodologia utilizada no debate. Isto é lógico, pois se um ou alguns intervenientes no debate não são respeitados, então é evidente que não existe, ou deixou de existir, igualdade. A obsessão com a «eficácia» é - muitas vezes - uma forma de mascarar vontade de poder sobre os outros e sobre a sociedade. Os ditadores utilizam o argumento da eficácia para alargarem as medidas arbitrárias, para outorgarem mais poder a si próprios, etc. A eficácia é medida por aqueles que tomaram as decisões, fazendo pontualmente ou constantemente a avaliação do modo como estas são implementadas. Isto aplica-se em todas as esferas de atividades humanas coletivas e em todos os patamares de organização. Quem monitoriza a aplicação das decisões, detém uma parte importante do poder, senão mesmo todo o poder. Portanto, à decisão coletiva deve corresponder também a monitorização coletiva da sua aplicação. Num novo modo de organizar a política na sociedade, este aspeto deve ser tido em conta desde o princípio. Os processos de monitorização coletiva das decisões não devem ser estabelecidos a posteriori, mas concomitantemente à  tomada de decisão coletiva. O conceito-chave é de que a coletividade, seja a que nível for, tenha sempre o controlo do processo: tanto na etapa de discussão duma proposta ou resolução, como durante sua implementação, incluindo a sua monitorização e avaliação.  

- Guardar o realismo na avaliação das situações

No geral, as pessoas mais empenhadas são voluntariosas, tendem a tomar os seus desejos pela realidade. Isto é compreensível psicologicamente mas é prejudicial ao fim e ao cabo, em qualquer grupo ou coletivo, pois impede que aquilo que não está a correr bem, seja retificado. Sem crítica permanente, bem acolhida no debate, não relegada para as margens, o realismo não pode existir, na prática. Nas sociedades autoritárias, a ausência desse debate livre, a não aceitação do papel da crítica, vão conduzir - inexoravelmente - a decisões nefastas para a sociedade e até, por vezes, para o próprio poder instituído. Daí que as sociedades autoritárias sejam, ao contrário do que muitos pensam, menos estáveis do que as sociedades onde a crítica, a aceitação natural dos pontos de vista divergentes, sejam prática corrente.   

-Reconhecer que a atitude inteligente é sempre a de cooperação 

Nós - humanos - não teríamos qualquer hipótese de ter sobrevivido enquanto espécie, sem termos criado coletivamente um ambiente que se diferenciou progressivamente do ambiente natural. Este novo ambiente, humanizado, constituiu-se como um nicho dentro do ambiente natural, tornando possível a vida da sociedade humana. Nos processos fundamentais da evolução humana, a entreajuda tem um papel central. Não digo que não houvesse competição; reconheço que a competição - num certo grau- foi importante para a evolução tecnológica existir. Porém, é preciso desfazer de vez a crença numa versão deturpada e totalmente ideológica do darwinismo, imposta pela classe dominante. Com efeito, sua ideologia difusa, o «neoliberalismo», tem sido arauto de chavões como: Temos de aceitar que há sempre «vencedores e vencidos», no mundo natural e nas sociedades humanas; deve-se aceitar a «lei» de que são selecionados os mais aptos, os melhores, através da competição. Ao fim e ao cabo,  qualquer biólogo ambiental e mesmo, qualquer espírito esclarecido, pode aceitar a premissa de que a competição não só é positiva, como é essencial para a sobrevivência da sociedade. Mas, curiosamente, são os difusores desta ideologia neoliberal que - na prática - fazem tudo para eliminar os seus competidores, para erigir um sistema monopolista na economia e uma falsa competição na política. Em muitos países, os partidos concorrentes aos lugares de poder partem das mesmas premissas básicas, são difusores da mesma ideologia.

Nunca é demais sublinhar que as sociedades precisam da estabilidade. Que é a estabilidade que lhes permite inovar. As revoluções são, em regra geral, baseadas nalguma ideia de transformação profunda da sociedade, que seria absoluto dever levar-se a cabo. Esta ideia de revolução serve bem uma casta sequiosa de poder, seja qual for sua ideologia. Esta prepara-se cuidadosamente, muito tempo antes da revolução, antes das condições para tal revolução estarem maduras. O seu discurso oficial não revela suas intenções. Essencialmente, a casta quer dominar as massas, gerir a sociedade à sua maneira. O poder resultante da revolução é sempre, «por coincidência», o que favorece essa mesma casta, que a mantém no poder e a enriquece. Nalguns casos, consegue perpetuar os seus privilégios, até se tornarem hereditários, ou seja, uma classe à parte.

Pelos motivos acima, devemos difundir a pedagogia  de nos habituarmos a avaliar alguém, ou um partido, ou corrente, não pelo seu discurso, mas pela sua prática, por aquilo que fazem, não pelo que proclamam. Por exemplo, não basta que um grupo seja favorável à cooperação, em discurso. É preciso que a sua prática quotidiana, o seu modo de funcionamento interno, seu relacionamento com outros indivíduos ou grupos, sejam aplicações claras dos princípios de cooperação, de entreajuda, de troca igual, etc. Caso contrário, tal grupo, estará a construir um projeto de tomada de poder sobre a restante sociedade.

Não irei aqui fazer o elogio da cooperação, existem muitas obras que o fazem bem. Para mim parece-me algo evidente, que tem inúmeras vantagens sobre a competição egoísta, sobre a obsessão pela conquista do poder, etc. A minha intenção, neste curto texto de reflexão, foi de mostrar que as ideologias que exaltam o indivíduo acima e se necessário contra a sociedade, as que opõem bem-estar individual ao bem comum, como se estes fossem antagónicos, são - na realidade - o contrário do liberalismo genuíno, ou seja do liberalismo que surgiu no século XVIII, dos filósofos das luzes, e não do «liberalismo» que foi, depois disso, o estandarte ideológico da «política da canhoneira», levada a cabo pelo Império Britânico, ao qual sucedeu o Império Yankee.
No presente, de forma deliberada para falsear o debate, são excluídas, ou deturpadas até à caricatura, as formas de pensar as relações entre humanos, a política no sentido mais nobre da palavra: Nomeadamente, as correntes que preconizem a igualdade verdadeira (sem «igualitarismo»), a autonomia (que não significa «autarcia») e a cooperação (que não exclui, mas integra, a competição).
Se estas ideias tiverem uma significativa implantação nas sociedades contemporâneas ou, pelo menos, em segmentos destas, poderão demonstrar - pela prática - não apenas a sua viabilidade, como suas vantagens face ao modelo hierárquico, elitista, de exercer o poder.
É um problema difícil de resolver; não foi resolvido no passado, por muitos motivos, entre eles: A sabotagem de tais iniciativas, pelos poderes instituídos; a dificuldade dos próprios protagonistas das experiências de sociedade não-hierárquica, cooperativa e livre, em se desfazerem dos preconceitos ou erros conceptuais importados das sociedades das quais eram originários.

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Gostaria muito de receber as vossas críticas e opiniões sobre este texto. Ele tem apenas como função despoletar a discussão. Não tenho dúvidas de que qualquer dos pontos tratados foi apenas aflorado; que seria necessário desenvolver e argumentar muito mais as minhas teses.
Por outro lado, penso que só a reflexão coletiva e a discussão, podem proporcionar a maturação das ideias, a partir deste esboço. Esta atitude está em coerência com o espírito de cooperação, de entreajuda. Escrevam o que pensam na secção de comentários por debaixo deste texto ou enviem-me as vossas opiniões sob forma de e-mail, para: manuelbap2@gmail.com

Aguardo, com sincero interesse, as vossas reflexões!