https://www.youtube.com/watch?v=oHBul0bc55o
A maleabilidade e leveza de Valentina Lisitsa, resultam na interpretação perfeita de «Un Sospiro»
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A maleabilidade e leveza de Valentina Lisitsa, resultam na interpretação perfeita de «Un Sospiro»
Estas notas são um comentário após leitura do muito bem documentado ensaio de Brenton Sanderson:
Evil Genius - Constructing Wagner As Moral Pariah
Aprecia o belo, naquilo que ele tem de mais espiritual.
Despreza a pequenez, a necessidade dos medíocres em rebaixar o génio humano, de o transportar para a trivialidade de suas paixões «de cozinha».
Como sabemos, existem inúmeras obras-primas da escultura, arquitetura, ou doutras artes, das quais não sabemos - nem teremos jamais conhecimento - sobre quem as fez, muito menos que vida levou e quais os seus pensamentos. Mas, nós apreciámo-las sem nos preocupar com outra coisa senão com a estética.
Por que motivo, temos de apensar o cunho, o ferrete, de uma ideologia, às obras de autores que viveram em tempos não muito recuados?
Sabemos muitos detalhes biográficos sobre artistas que viveram há duzentos anos, ou há menos tempo. É natural que muito tenha permanecido, que os eruditos tenham conseguido desenterrar vários documentos sobre génios ou talentos celebrados.
Temos curiosidade em conhecer as biografias dos nossos compositores preferidos. Construímos uma imagem das personalidades que estiveram na origem das obras-primas que mais apreciamos. Não são imagens reais; são apenas imagens que satisfazem os estereótipos, que permitem reforçar o mito em torno de tal ou tal artista.
Através de tais biografias, os seus autores contemporâneos (ou não), dos artistas cuja vida eles descrevem, vão tentar moldar os acontecimentos para se coadunarem melhor com a imagem que eles próprios possuem dos tais ídolos.
Também surgem casos de personagens biografados, quase sempre, de um modo negativo. Um caso extremo, é o de Wagner e do seu (real) antissemitismo.
«Hitler foi o grande inspirador de Wagner» seria tentado a dizer ironicamente, para caracterizar as inúmeras biografias que enfatizam Wagner como um «precursor» do nazismo.
Nada mais idiota, não mostram uma mínima compreensão da ideologia antissemita, tão disseminada e tão evidente, em grande parte dos meios intelectuais e de elite no século XIX. É um anacronismo absurdo, um erro crasso, se nós quisermos acreditar na boa-fé dos autores.
Porém, tal não é possível, na verdade. Não podemos ingenuamente «perdoar» os tais críticos. Pois, realmente, para estes, trata-se de afirmar o «politicamente correto» de uma forma bem pouco arriscada, indo ao encontro do preconceito, reforçando-o.
Por exemplo, que a música de Wagner era «adorada» pelos nazis, é falso, totalmente. E depois, mesmo que tal fosse o caso, que culpa teria Wagner disso, tendo ele vivido no século XIX e morrido em 1883?
Aquilo que me cansa é a constante etiquetagem que outros fazem e as pessoas aceitam como sendo «cultura», quando afinal não é mais do que transposição de preconceitos, ódios e amores, frustrações e desejos, pessoais do próprio crítico, para o campo da crítica de arte.
As opiniões de certos críticos sobre tal ou tal artista do passado ou presente, são muito reveladoras, mas da personalidade de quem emite estes juízos críticos!
Eu adoro Wagner, em particular, as canções a Wesendonck , a abertura da ópera de «Die fliegende Hollaender/ The Flying Dutchman» e o prelúdio a «Tristão e Isolda».
Isso faz de mim, um nazi? Só totalitários, afinal (quaisquer que sejam as ideologias que afixem) podem pensar tal coisa!
0:07 Beginning - Lento assai (Very slowly)
Valentina Lisitsa - Sonata nº17 Op. 31 No.2 «A Tempestade» [*]
A 250 anos do nascimento de Beethoven, estou um bocado triste. Porque me parece que a cultura europeia, da qual ele é um expoente, está em franca involução, para não dizer que se tornou um pálido e fantasmagórico reflexo da civilização centrada no continente europeu.
Se isto significasse que a mesma civilização está a definhar, mas que outras civilizações se ergueram entretanto e tomaram a dianteira, óptimo! Não sou eurocêntrico, nem na cultura, nem no resto.
Mas, para grande pena minha, verifico que existe uma preocupação maior em cultivar a música europeia, dita clássica ou erudita, nos países do extremo-oriente asiático, do que -propriamente - em países ditos «ocidentais». Estes incluem EUA, Canadá, Austrália, Brasil... ex-colónias britânicas, espanholas, francesas e portuguesas.
O movimento de destruição dos vestígios do passado, a que se tem assistido nos EUA, impulsionado por forças obscuras, em franca contradição com supostas filiações ideológicas (**), não nos deixa agoirar nada de bom para o futuro deste país e doutros. Muitos têm estado sob influência e tentam imitar tudo o que vem dos EUA.
Durante mais de meio século, nos EUA e na Europa Ocidental, foi-se propagando, porque convinha aos poderes, uma cultura de irresponsabilidade, de promoção/sedução da juventude, com intensa propaganda comercial de toda a ordem, da música mais abastardada, aos adereços de moda, erigidos em padrão identitário geracional. Com isso, os senhores do poder, não apenas reservavam lucros fáceis, como alimentavam a ilusão dos jovens estarem a manifestar irreverência, revolta, e não a consumir determinados produtos.
A promoção dessa «cultura jovem» pelos mesmos que eles odiavam e desprezavam, enquanto burgueses exploradores... deveria tê-los feito sobressaltar. Mas, estas formas inócuas de manifestar suas diferenças, estavam radicadas somente num sentimento de frustração, sem uma análise das causas profundas das disfunções sociais, na sua base.
O triunfo, além Atlântico, da visão anti-classista, anti-progressista, que consiste em arrumar as pessoas em categorias estanques, faz o jogo dos poderosos. Além de dividir o povo em inúmeras categorias identitárias (falsas), impede-os de ver a realidade em frente: muito poucos se interrogam «em que consiste realmente a opressão e que origem tem essa mesma opressão?»
Os que dominam o discurso da media, querem que as pessoas, incluindo as mais esclarecidas, fiquem confusas. Impõem o discurso deles, a narrativa deles, excluindo ou distorcendo - até à caricatura - qualquer outra visão e análise que entre em contradição com a sua propaganda.
Estamos já num universo totalitário. O totalitarismo dito «soft» da nossa época, consiste em deixar os dissidentes discursar no quase vazio, na ausência de meios para difundir sua mensagem: bem podem falar no «Speakers Corner» de Hyde Park, ou algo equivalente, no universo da Internet, mas... o grande público nunca os ouvirá, pois está colado/condicionado ao que consideram «bonito» (cool), ou na moda (trendy). Estão condicionados pelos que controlam as «redes sociais» (social networks) e grandes empresas de comunicação (media mainstream). Ambas são propriedade de um número muito pequeno de multi bilionários.
Estar «fora de moda», gostar realmente de Beethoven e de outros, é - hoje - uma forma real de dissidência. Porque, para se apreciar música clássica, deve-se ter aperfeiçoado a sua instrução musical e continuar a fazê-lo. Além disso, é preciso cultivar o conhecimento, não apenas dos sons, como do contexto civilizacional que os produziu. Ter este comportamento durante a vida inteira, não é um capricho de seguir uma moda.
As pessoas ignorantes do passado, em todos os sentidos, são as mais manipuláveis, pois os poderes podem facilmente iludi-las. O aligeirar da história, da filosofia e mesmo da língua, enquanto expressão rigorosa e subtil dos pensamentos e sentimentos, tem-se verificado nos programas do ensino básico e secundário. Isto é demonstrativo de que a cultura, a verdadeira, a viva ... é correctamente percebida como um perigo pelos poderosos.
Se eu fosse compositor, escreveria uma sinfonia: Uma sinfonia que começasse com um instrumento solo, por exemplo uma flauta, para se irem juntando outros instrumentos, variando e transformando, até ao infinito, o tema do início.
Faria empréstimos a grandes compositores do passado: não disfarçaria a utilização dos seus temas, evocando-os enquanto homenagem aos mestres do passado e às épocas em que viveram.
Num tempo destes, é revolucionário preservar o passado, sob todas as formas, em todas as artes!
Manuel Baptista
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[*] Para mim, é impossível escolher uma peça de Beethoven, sem sentir que estou a fazer injustiça a várias outras, que são, no meu gosto subjectivo, tão notáveis e tão preciosas como a que escolhi.
(**) Nem Martin Luther King, nem Malcom X, nem Franz Fanon, nem Marx, nem Bakunin, nem Malatesta, nem Gramsci...etc. nada têm a ver com isso!