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quarta-feira, 3 de maio de 2017

ESQUERDAS EUROPEIAS: NO PONTO DE VIRAGEM?

A esquerda francesa e europeia deixou-se encurralar. Isto passou-se ao longo de um processo de decénios, mas os seus resultados nunca foram tão visíveis como agora, na véspera da segunda volta das eleições presidenciais em França.
Na era da globalização capitalista, com o triunfo do «pensamento único», a esquerda tornou-se largamente neoliberal, na sua essência. 
A que não o fez, não soube, lamentavelmente, renovar a sua perspectiva do marxismo, de maneira a poder olhar de frente para os monstruosos erros do passado bolchevique e aprender com eles. 
A esquerda, neo-liberal ou autoriária, teve o poder de transformar a realidade em várias ocasiões, antes e depois do virar do milénio. Tristemente, em vez disso, ela virou a cara e assobiou... no melhor dos casos. 
Na política, substitui o critério de classe, como eixo central da avaliação de uma dada conjectura, pela ideologia dos direitos humanos, passando a ser uma esquerda das «causas fracturantes», uma «esquerda sentimental», mas certamente não a força exterior ao complexo do pensamento único, dos impérios mediáticos, etc. Deixou de ser a esquerda que assustaria o capital e seus representantes. Então, ainda bem que essa esquerda, a «esquerda do capital», se está a esfacelar e a desaparecer na irrelevância... pouco me importam os rótulos que ela a si própria se dá. 
O que me importa é a tarefa imediata e urgente, de classe, de barrar o caminho a dois monstros:
- o do neoliberalismo e da mundialização/globalização (cujo significado exacto e último é o governo mundial, ou seja, um fascismo mundializado) 
- o da direita retrógada, reaccionária, identitária, mas que apela a um número muito grande de pessoas (fartas de serem enganadas por políticas neoliberais de esquerda e de direita).

Face à enormidade das tarefas, parece não haver saída, de tão fortes e poderosas que são as forças opositoras às nossas.
A saída, porém, está presente, é real, nem é particularmente nova nos seus princípios: ela chama-se esquerda libertária ou socialismo libertário. 
Nas suas diversas formulações, pode encontrar-se o necessário para reconstruir uma esquerda de classe, com um projecto libertário e socialista, no sentido amplo destas expressões. 
Refiro um «projecto libertário e socialista» no sentido civilizacional, no de fazer sentir que o poder, o Estado, a autoridade, são palavras que recobrem uma grande dose de violência; que os meios da humanidade em suprir às suas necessidades e confortos, sem recorrer à exploração, existem e não são «utopias». 
Mas tal implica que as pessoas percam as vendas/ lentes deformantes, que elas colocaram a si próprias. Sei que, na medida em que elas verdadeiramente o desejem, o conseguirão: outras já o fizeram no passado e no presente. 
O problema central é dar expressão política a uma esquerda libertária, anti-capitalista, classista... e não interessa repetir os erros, imitar acriticamente a esquerda estalinista ou neoliberal; obviamente, isso seria suicidário. 

Mas é necessário inventar o caminho, pois os meios devem ser adequados aos fins... Não será com violência e intolerância que se fará a revolução anti-autoritária...

quarta-feira, 15 de março de 2017

ELEIÇÕES FRANCESAS: FICARÃO OS MUROS?

Depois das peripécias mais ou menos grotescas da candidatura de Fillon, acossado por uma parte da elite, que queria que ele cedesse o lugar ao candidato mais bem posicionado para perpetuar o sistema (Macron), criaram-se as condições para uma «tempestade perfeita», que irá colocar no poder Marine Le Pen. 

Digo isto, sem qualquer dúvida, pois, mesmo que ela não consiga derrotar o seu opositor na segunda volta das presidenciais, terá o regime completamente debaixo do seu polegar.
Com efeito, depois das presidenciais há as legislativas e as municipais. 
Não é normal que uma força política - neste caso, o FN - tenha um quarto ou um terço do eleitorado e depois, ao nível dos órgãos de representação, não se observem quaisquer representantes ou tenham assento numa proporção muito menor. 
Assim, o regime fica refém desta força política, pois Marine e o FN estarão sempre em condições de posar como excluídos, como vítimas, como discriminados. 
Podem portanto (continuar a) chantagear as restantes forças políticas, as quais se apressam a ceder às sucessivas chantagens, aplicando o programa do FN, mas em nome do «espírito da República».
É nesta fantochada que anda o regime francês, há pelo menos dez anos. Qualquer pessoa com bom senso hesitaria a designar isso como regime democrático. 
Com efeito, tem sido o hábil manobrismo de pessoas que partilham o poder há décadas e o seu absoluto desprezo pelos humildes que tem empurrado os destituídos, os «sem-voz», para os braços da extrema-direita. 
Os operários, os trabalhadores modestos, deixaram de se reconhecer nos tradicionais partidos operários, socialista e comunista. 
O mesmo fenómeno - com as necessárias adaptações - se verificou na eleição de Donald Trump. 
Uma fatia importante do eleitorado escolhe o candidato percebido como vindo de fora do sistema (que, de facto, não será), mais por raiva contra os senhores no poder, do que por adesão real ao programa e ideário desse candidato(a). 

A democracia em França foi sendo socavada em sucessivos momentos, após a vaga de fundo imediatamente a seguir à libertação, após a II Guerra Mundial. 
Nessa altura, tratava-se de a burguesia ceder, em quase tudo, a uma classe operária aguerrida e triunfante, para conservar o essencial. 
Agora, trata-se de salvaguardar os privilégios de uma nova feudalidade que se instalou no poder durante os longos anos da Vª República, através de um «delfim do regime» (Macron).


A alternativa, para a grande burguesia, será de recompor as alianças num quadro de retração nacionalista, xenófobo e intolerante, no caso de um triunfo imediato de Marine Le Pen obrigar a isso. 

Penso que a salvaguarda do status quo é o «plano A» da oligarquia e que a opção Le Pen será o «plano B». 
Mas, em qualquer dos casos, serão eles a gerir o resultado, será sempre a oligarquia a triunfar, não tenhamos dúvidas. 

Está quase completo o trabalho de esvaziar de conteúdo democrático a República, no «país dos direitos humanos»... ficarão os muros?
- Os muros ficarão, obviamente, para dar a ilusão de que a democracia continua... 

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2017

SE HÁ CASO EM QUE DETESTO TER RAZÃO...

Então, o caso é este:

A figura de Marine le Pen surge -por muito triste que isto seja - como uma tábua de salvação a muitos eleitores franceses, face à enorme podridão moral que infesta toda a casta política gaulesa. 

Como cidadão francês, causa-me especial nojo pensar que os socialistas abrigaram Cahuzac, o ministro das finanças, encarregue de perseguir pessoas culpadas de evasão ao fisco, sendo ele próprio um «belo» exemplo dessa mesma evasão! Ou agora, o candidato da direita, dita «civilizada» (supostamente republicana e gaullista), Fillon,  que dá o exemplo de «combate ao desemprego» recrutando sua esposa e filhos em empregos fictícios, pela bagatela dum milhão de euros  subtraídos ao erário público! 

Lamento dizê-lo, mas não existe possibilidade de outro desfecho senão a eleição de Marine le Pen. Não há hipótese de um sobressalto popular, pois o povo miúdo sente-se traído por um partido de «esquerda» que esqueceu completamente as suas raízes operárias e embarcou numa deriva de subserviência canina ao grande capital, ao imperialismo. 
Agora, parece-me inevitável que, em França, seja eleita como presidente alguém da extrema-direita. 
Este processo é «exemplar do que se não deve fazer». Os partidos tradicionais de esquerda e direita, com o seu comportamento deram a aparência de legitimidade à extrema-direita. 

Esta aparência de legitimidade foi potenciada pela política-espetáculo (= endoutrinamento massivo dos eleitores pela mass-media e sistema estatal), a qual foi habilmente utilizada pela extrema-direita, o que não surpreende, pois os seus inspiradores (Mussolini, Hitler, entre outros...) eram mestres em propaganda.

O resultado está aqui: 


Daqui a uns dias, o score para a faixa etária dos 18-35 anos será ainda mais negativo para os políticos «convencionais» e melhor para a candidata de extrema-direita. 
Remeto para o meu artigo de 18 de Janeiro deste ano. 

Escrevo isto com imenso pesar, porém sem aligeirar as responsabilidades das pessoas, organizações e dirigentes «de esquerda»!